sexta-feira, 17 de agosto de 2012

O novo Código Florestal e a emergência ecológica


  17 DE AGOSTO DE 2012

Onde estão as árvores? (Piatã-BA daqui)

Bancada ruralista mostra as garras e, mesmo após veto presidencial, procura aprofundar retrocessos ambientais. Só mobilização social urgente poderá evitar desastre 
Por Elvino Bohn Gass, em Carta Maior
A intransigência da bancada ruralista na Comissão Mista que analisa a Medida Provisória 571 (do Código Florestal), impõe que se faça um alerta à sociedade brasileira: mantido este comportamento, não haverá outro caminho, senão a defesa de um novo veto presidencial. Contudo, uma nova Medida Provisória só poderá ser editada no ano que vem. Assim, neste interregno, teremos um vazio jurídico. É o pior dos mundos. Mas é nele que apostam os ruralistas. Uma legislação débil, cheia de brechas levaria o confronto para o âmbito dos tribunais onde os ruralistas têm sobradas razões para acreditar que prevalecerá a força do poder econômico e dos seus advogados caríssimos. Mas e os milhões de agricultores familiares que a MP de Dilma protege, mas que poderão ficar sem regras justas e claras para recomporem suas áreas de preservação permanente e reservas legais? E que poderão ficar alijados dos avanços estruturais que a nova lei poderá propiciar?…
Sim, o momento requer urgente mobilização social. Só isto será capaz de brecar a insaciabilidade do ruralismo brasileiro.
Na sessão do último dia 8 de agosto, a Comissão Mista iniciou o processo de votação dos destaques dos deputados e senadores ao texto da MP.
Depois de muito diálogo, conseguimos reduzir de 343 para 38 o número de destaques. Nesta primeira sessão, votamos apenas cinco e, destes, pelo menos dois aprovaram conteúdos extremamente danosos ao meio ambiente.
O primeiro, desobriga a manutenção das proteções vegetais dos rios e cursos d’agua naturais que são intermitentes, ou seja, aqueles que não tem água corrente o ano todo. Ora, boa parte dos rios do Nordeste e dos igarapés da Amazônia são intermitentes, daí que aprovou-se uma autorização para a retirada das matas ciliares o que promove mais desmatamento e afeta a proteção das águas. No cerrado brasileiro, onde nascem os rios que formarão as bacias do Araguaia e do Tocantins e outros que ajudam na formação dos principais rios nordestinos, como o São Francisco, estão inúmeros rios intermitentes. O que foi aprovado nos autoriza afirmar: a seca, tragédia que marca a história de milhares de brasileiros, especialmente no Nordeste, ceifará ainda mais vidas. Pobre “velho Chico”…
O segundo destaque, de novo proposto e aprovado pela bancada ruralista, autoriza a supressão do conceito de área abandonada, subutilizada ou utilizada de forma inadequada. Uma propriedade, para cumprir com sua função social, precisa, além de atender aos índices de produtividade, que as terras sejam exploradas de forma racional e adequada. O artigo 28 da lei 12.651 impede novos desmatamentos para propriedades que contenham áreas abandonadas. Acabar com o conceito é garantir que se poderá desmatar tranquilamente novas áreas, mesmo que na propriedade, se utilize outras de forma inadequada e irracional !
Assim, a suspensão da reunião da Comissão Mista, decisão que tomei após quase dez horas de debates, apenas estancou um rito de votações que têm pela frente outras propostas dos ruralistas e que, igualmente, agridem o meio ambiente, afetam a proteção dos mananciais e promovem a anistia das multas já aplicadas. Tome-se, por exemplo, o destaque que propõe alterar o conceito de veredas, que são mananciais de água e de ocorrência de vegetação própria. Nas veredas estão resguardadas parte da produção de água que irão alimentar os rios. Mas não é só isso; outro destaque propõe a instalação de reservatórios para irrigação e aquicultura nas áreas de preservação permanente, promovendo mais desmatamento. E ainda mais: há destaque para anistia de multas já aplicadas aos desmatadores e que tornam inválidos os termos de ajustamento de conduta firmados com os órgãos ambientais, sob a mediação do Ministério Público. Por fim, querem suprimir os mecanismos de controle e fiscalização da origem dos produtos florestais, como a madeira e o carvão.
Sinto que devo alertar a sociedade brasileira na tentativa de conter o “liberou geral” que os ruralistas desejam, afrontando a lei, colocando-se contrários às medidas promovidas pela presidenta Dilma e avançando sobre o meio ambiente com voracidade. Temos pouco tempo. No dia 28 de agosto retomaremos as votações.

(*) Deputado Federal PT/RS, Secretário Nacional Agrário e vice-líder da bancada do PT na Câmara.
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