quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Pesquisa sonda papel da ditadura brasileira nos golpes latino-americanos



Emílio Garrastazu Médici e o presidente dos EUA, Richard Nixon
Historiador sugere, com base em documentos secretos, que governos militares podem ter sido espécie de braço de Washington contra governos democráticos da região
O Brasil pode ter tido um papel mais importante que os EUA nas ditaduras latino-americanas, embora a articulação estreita entre Brasília e Washington para perseguir militantes de esquerda nos anos 60 e 70 seja ainda quase desconhecida para a história oficial.
A missão de desvendar os meandros dessa cooperação e o verdadeiro papel que militares e civis brasileiros desempenharam em ditaduras como as do Chile, Argentina, Paraguai, Uruguai e Bolívia caberá à recém-instaurada Comissão da Verdade, diz o pesquisador norte-americano Peter Kornbluh em entrevista ao Opera Mundi.
Segundo Kornbluh – que esteve em maio em Brasília para reunir-se com membros da Comissão –, existem papéis ultrassecretos que provam que o Brasil exportou técnicas de tortura para os países vizinhos, além de fornecer respaldo político, ajuda financeira e suporte material para ditadores militares da região.
“Nós sabemos, por exemplo, que o presidente (brasileiro Emílio Garrastazu) Médici e o presidente (dos EUA Richard) Nixon mantiveram um canal de comunicação ultrassecreto sobre a intervenção brasileira no Chile e, possivelmente, em outros países do Cone Sul no início dos anos 70”, diz Kornbluh, que é diretor dos Arquivos da Segurança Nacional. A organização de Washington, fundada em 1985, é especializada no requerimento, interpretação e publicação de documentos secretos norte-americanos liberados para consulta pública sobre os golpes na América Latina.
Documentos secretos obtidos pela organização de Kornbluh em agosto de 2009 revelam a cooperação estreita entre Nixon e Médici. Num dos memorandos revelados, o presidente norte-americano diz a seu colega brasileiro: “espero que possamos ter uma colaboração estreita, uma vez que há muitas coisas que o Brasil pode fazer, como país sul-americano, e nós, dos EUA, não podemos. A relação entre ambos era tão importante, diz a análise feita na época pela National Secutiry Archives, que ambos estabeleceram um canal privilegiado de contato, “como forma de manter a comunicação direta sem usar os canais diplomáticos formais”.
Médici tinha como canal seu assessor direto, o chanceler Gibson Barbosa, mas “para assuntos extremamente privados e delicados”, indicou o coronel Manso Netto. Do lado norte-americano, o contato era Henry Kissinger, conselheiro e confidente de Nixon. Toda a comunicação estabelecida por meio desse canal secreto permanece desconhecida.
Kornbluh começou a lidar com arquivos secretos na década de 60, quando investigou papéis do governo norte-americano sobre a crise dos mísseis em Cuba. Na época, a então União Soviética transportou para a ilha mísseis capazes de alcançar o território dos EUA em plena Guerra Fria. Kornbluh também mergulhou em arquivos do episódio que ficou conhecido como Irã Contras quando, em 1986, durante o mandato do então presidente Ronal Regan, figurões da CIA foram flagrados traficando armas para o Teerã, mesmo com o regime sob embargo. Ele publicou dois livros sobre o tema, além de um terceiro, mais tarde, sobre a ditadura no Chile, que recebeu do jornal americano Los Angeles Times a classificação de “livro do ano” de 1998.
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