terça-feira, 21 de agosto de 2012

Sem-teto: ocupação no Rio cobra confirmação de contrato pela CEF


Representantes da ocupação Manoel Congo, localizada no centro do Rio de Janeiro, e do Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM) iniciaram, em Brasília, uma peregrinação entre a Caixa Econômica Federal e o Ministério das Cidades para a confirmação do projeto que transforma o prédio vizinho à Câmara dos Vereadores, na Cinelândia, em moradia legal e cidadã, com direito a espaço coletivo de cultura e renda, restaurante e casa de espetáculos.

Rio de Janeiro - Representantes da ocupação Manoel Congo, localizada no Centro do Rio de Janeiro, e do Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM) iniciaram na terça-feira (21), em Brasília, uma peregrinação entre a Caixa Econômica Federal (CEF) e o ministério das Cidades para a confirmação do projeto já em andamento que transforma o prédio vizinho à Câmara dos Vereadores, na Cinelândia, em moradia legal e cidadã, com direito a espaço coletivo de cultura e renda, restaurante e casa de espetáculos.

“Estamos nos propondo a ficar em Brasília até quinta-feira à noite. Vamos debater a questão com o ministério das Cidades e a presidência da CEF”, diz a coordenadora da ocupação, Lourdinha Lopes. A sirene de alerta soou na reunião do Conselho Nacional das Cidades, do qual Lourdinha faz parte, quando, após perguntar sobre o projeto, recebeu a informação extraoficial de um representante do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (FNHIS) de que o contrato tinha terminado no dia 30 de junho e a CEF não renovaria.

“A Caixa aprontou uma conosco. Estamos desde 2008 lutando pela execução de um contrato do FNHIS para compra e reforma desse imóvel. É um contrato entre governo do Estado e ministério das Cidades, o agente operador é a CEF. Todas as etapas que apareceram no contrato nós cumprimos”, diz Lourdinha.

“Quando soubemos dessa informação de que o contrato estava extinto, fomos atrás da Companhia Estadual de Habitação (Cehab) para ela nos informar se ela tinha enviado as exigências que a CEF tinha pedido. A Cehab nos informou que havia enviado, nos mandou cópia, nós entregamos ao ministério e continuamos cobrando dele uma posição. Aí o ministério nos avisou que a CEF poderia ter prorrogado o contrato de ofício, que não precisaria de autorização do ministério. A CEF alega que a Cehab só mandou as exigências em julho”, completa ela.

Rosângela Sampaio, gerente de negócios da CEF, diz que a Cehab entregou as exigências em 31 de julho. “Em março comunicamos que estávamos prorrogando o contrato em caráter excepcional até 30 de junho e que nova prorrogação só seria atendida com a entrega das pendências. Em 30 de junho a data vigente expirou. Essa documentação nem foi analisada por nós. Eles entregaram o Plano de Trabalho e a Declaração de Contrapartida, que era o que a gente estava pedindo, mas a área técnica não analisou ainda essa documentação porque o contrato está extinto”, afirma ela.

Segundo a representante da CEF, “depois de um contrato com o prazo de vigência expirado não se pode fazer mais nada. Temos outras opções. Temos o Minha Casa, Minha Vida, temos nova seleção para fazer um mesmo contrato”. 

Maratona
A alternativa “outras opções” é tudo o que as 125 pessoas das 42 famílias distribuídas nos 10 andares do edifício da rua Alcindo Guanabara não querem. Assemelha-se ao corredor que a poucos metros de cruzar a faixa de chegada é informado que deve repetir as provas classificatórias.

“Toda vez que o contrato tem alguma dificuldade ele é prorrogado, como vários contratos da CEF”, diz Lourdinha, que não se cansa de lembrar todo o caminho percorrido até aqui. “É um contrato de repasse de recursos para a execução da política nacional de habitação. No nosso caso nós já havíamos ocupado o imóvel e apresentamos uma demanda ao governo do Estado, que apresentou ao Conselho Nacional de Habitação uma demanda de recursos para ressarcir o INSS pelo valor do imóvel e para reformá-lo. Esse recurso chega com uma contrapartida de 20% do estado”, explica.

Feito o contrato, a ocupação, representada pelo Estado através da Cehab, foi enquadrada no programa PAC-FNHIS. “Esses recursos eram do exercício de 2008. Só que tantas as burocracias, tantas exigências de projetos, que não são as mesmas que eles fazem para as empreiteiras, fizeram os anos irem passando. Conseguimos a compra do imóvel pelo governo estadual e temos tudo pronto: projeto executivo, orçamento, detalhamento, declaração de Contrapartida do estado, tudo pronto”, diz, antes de relatar a “ducha de água fria” da CEF.

“E aí a CEF dizer que o projeto não pode ser executado porque tem vinte dias que o contrato está expirado nós não podemos aceitar! E o governo do Estado, em 30 de maio, mandou um ofício para a CEF pedindo que se prorrogasse o contrato porque eles estavam concluindo as exigências. A CEF não respondeu o ofício. E a Cehab mandou as pendências em julho, acreditando que o ofício tinha sido atendido”.

A coordenadora da ocupação acrescenta que “a CEF não oficializou o Estado, nem a nós, nem a ninguém que o contrato estava sendo extinto. Hoje (segunda-feira), com a nossa ida à CEF, é que ela fez o ofício com a data de hoje (segunda-feira) para a Cehab dizendo que o contrato está extinto”.

Segundo Lourdinha, “a CEF ‘extinguiu de boca’ um contrato e bancou isso. É porque a pressão da especulação imobiliária sobre esses setores do poder público é forte, e eles se submetem. Nós moramos no Centro. Essa ocupação é central, ela questiona a destinação de todos os imóveis públicos abandonados nesse país. Então eles não querem se submeter a esse tipo de questionamento, eles querem anular isso e sempre procuraram todas ‘deixas’ para isso”.

Condomínio
Caso o contrato realmente seja extinto o imóvel volta a ser um sinal de interrogação na revitalização do Centro da cidade. E uma rápida visita ao local mostra que o mais lógico é o seguimento do contrato que tinha as obras de revitalização previstas para começarem em outubro e serem entregues em 11 meses. A construção do espaço coletivo e da casa de shows está sob patrocínio de R$ 980 mil da Petrobras após seleção pública. O projeto arquitetônico dos novos apartamentos foi feito pelo Núcleo de Pesquisa e Planejamento Urbano, ONG contratada em licitação do Instituto de Previdência do Estado do Rio de Janeiro (Iperj) com recursos do ministério das Cidades.

Apesar da fachada do edifício estar desgastada, o interior é limpo e organizado. Os dois primeiros andares são portaria, administração, sala de reuniões e de reforço escolar para as 17 crianças da ocupação. O morador mais velho tem 74 anos, e a maioria dos habitantes é composta de jovens mães chefes de família, que dividiram as antigas salas comerciais dos oito andares restantes em dormitórios familiares privativos.

Nesses cinco anos readaptaram as dependências abandonadas do prédio em uma estrutura com um banheiro com chuveiro, uma pia de lavar louça e uma lavanderia por andar. Aliado à proteção de sol e chuva, o principal ganho de cidadania da ocupação está da porta da rua para fora, já que com o contrato em andamento seus moradores puderam comprovar endereço residencial e concorrer a empregos formais. Hoje muitos dos residentes têm carteira de trabalho assinada como diaristas, manicures e cozinheiras.


Fotos: Rodrigo Otávio 

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