quinta-feira, 6 de setembro de 2012

7 de setembro: cada governo faz o seu


Em setembro de 2002, nos estertores do governo do PSDB, o risco-Brasil atingia 2.443 pontos. 

Medida de vulnerabilidade de uma economia --do ponto de vista dos credores-- cada 100 pontos de risco equivale a 1% de taxa adicional de juro. A chance de um calote brasileiro então era tida como muito alta. 

Para quebrar as resistências ao passar o chapéu o governo FHC via-se obrigado a pagar uma sobretaxa de quase 24,5% acima do juro vigente nos EUA. Numa operação externa feita esta semana pelo governo Dilma, esse plus registrou um recorde histórico de baixa: foi de apenas 1,1%. 

O oposto vivido no governo do PSDB reduz a margem de soberania de um país a zero. A independência política é ornamental. Canta-se o Hino, hasteia-se a bandeira. Entrega-se tudo o mais que dá sustento à palavra Nação.

Sem o manejo endógeno das contas externas é impensável fazer política de desenvolvimento ou articular a defesa da industrialização. Menos ainda avançar na defesa da principal fronteira da soberania no século XXI: a justiça social.

Delega-se a sorte e o azar aos banqueiros. Em setembro de 2002, depois de 8 anos nas mãos do PSDB, o Brasil era isso: um pangaré faminto tratado a sabugo e chicote de marmelo pelos mercados.


FHC cumpria exigências velhas, fazia concessões novas, arrastava a empáfia num tanque de areia movediça; a cada passo afundava mais a perna. 

Em setembro de 2002 a lama já oscilava no estreito intervalo entre o lábio e o nariz.

Dez anos depois, neste setembro de 2012, o risco país é de 110 pontos. Sim, a 'herança pesada' de Lula, na douta avaliação do sociólogo encabrestado pelos banqueiros em 2002, permitiu que o Tesouro Nacional colocasse nesta 4ª feira US$ 1,3 bilhão em títulos de 10 anos no mercado internacional, pagando apenas 1,1% acima do juro norte-americano. 

O menor piso da história teve uma das maiores procuras do mercado. Diferente do calvário vivido em setembro de 2002, a demanda pelos papéis brasileiros foi quatro vezes superior à oferta. 

O risco-país em si não define o destino de uma nação. 

A Argentina tem um risco elevado porque impôs um desconto de 70% da dívida aos seus credores em 2001. Usou a folga para melhorar substancialmente as condições de vida de seu povo e de seu crescimento. 

Não foi essa a lógica que depositou a soberania brasileira nas mãos dos mercados em 2002 . 

Ao contrário. A taxa de juro havida disparado e beirava os 25% (hoje o Brasil tem uma taxa de juro real inferior a 2%) ; a inflação passava de 12%, com o desemprego igualmente rompendo esse patamar. 

A dívida interna decolara. Mais de um terço dela estava dolarizada, o que restringia a margem de manobra para fomentar a exportação sem quebrar as contas fiscais.

O Brasil escorria na ampulheta da história. 

As reservas disponíveis de US$ 36 bi (hoje são dez vezes maiores) cobriam apenas 1/6 do endividamento interno em dólares. O país fora esmurrado por equívocos estratégicos, socado pela ganância dos interesses unilaterais: estava quebrado por dentro e por fora.

O governo do PSDB já havia apelado ao guichê do FMI em 1999 para tomar US$ 40 bi em regime de urgência. Boa parte do patrimônio nacional fora privatizado. 

Em dezembro de 2002 o estoque total da dívida externa líquida (pública e privada, menos reservas) era de US$ 189,5 bilhões. 

O país devia quase 38% do PIB. Precisava de mais de três anos de exportações (então de US$ 60,4 bi contra US$ 256 bi em 2011) para pagar sua dívida. 

Hoje o estoque líquido da dívida externa é de US$ 50,4 bi e as exportações de US$ 256 bi. Ao contrário, no final do ciclo tucano o país não tinha mais nada a oferecer e nenhuma credibilidade a desfrutar. 

O então candidato da coalizão demotucana à presidência, José Serra, tirou da gaveta o que lhe restava, ademais de ser a sua especialidade: o terrorismo para amedrontar os eleitores. 

À falta de melhor argumento ele alarmava a classe média: a vitória de Lula levaria a 'argentinização' do país. 

Uma década se passou. Vive-se uma crise mundial mais grave, mais abrangente e corrosiva que a de 2002. A contabilidade do país no entanto nunca foi melhor. Embora a desigualdade resista e cobre arrojo para ser enfrentada, os índices de pobreza, fome, desemprego, informalidade, apartheid universitário e de crédito, entre outros, repousam em níveis inéditos. 40 milhões de brasileiros deixaram a pobreza; outros 30 milhões ascenderam na pirâmide de renda. Brasil é hoje o país menos desigual de sua história. Altivez e soberania deixaram de ser adorno retórico da política internacional do Estado brasileiro. 

Como farsa, porém, sobrevivências do passado batem na porta do presente com aspirações de influenciar o futuro. Foi essa a pretensão de FHC com a patética tentativa de depositar uma 'herança pesada' de Lula no colo de Dilma.

A falta de pejo foi prontamente desmontada pela Presidenta que reavivou aos distraídos a realidade constrangedora daquele final de governo, quando o 7 de Setembro era uma contradição em termos espetada no calendário nacional. 

"Não recebi um país sob intervenção do FMI ou sob ameaça de apagão”, disse a nota da Presidência da República nesta 2ª feira, antecipando em quatro dias os festejos, mas sobretudo o sentido da palavra 'independência' no Brasil de sete de setembro de 2012. 
Postado por Saul Leblon às 19:14

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