domingo, 14 de outubro de 2012

Cerca de 70% dos alemães dizem que o país está indo por água abaixo


Apesar da crise do euro, a Alemanha floresceu bastante nos últimos anos. Então, por que os alemães estão sempre reclamando? Um estudo recente mostra que eles são atormentados pela insegurança e pelo medo de perder seu patamar de prosperidade. Afinal de contas, é possível que o estereótipo da torturada alma alemã não seja apenas imaginação.

Der Spiegel
Manifestante usa máscara durante um protesto anti-capitalismo, no centro de Frankfurt (Alemanha)
Manifestante usa máscara durante um protesto anti-capitalismo, no centro de Frankfurt (Alemanha)
Tradicionalmente, os alemães sempre foram percebidos como confiáveise fãs do trabalho duro, mas é possível que eles tenham superado essa reputação. Hoje em dia, parece que o lado negro dos alemães está vindo à tona, como um revendedor de pneus sentiu na própria pele quando a agência de empregos local lhe enviou um postulante a uma vaga de mecânico.

À medida que a entrevista se desenrolava, ficou cada vez mais aparente que o candidato não queria realmente o emprego. Ele até trouxe uma listinha com os motivos pelos quais ele não era o candidato adequado para a vaga. Por fim, ele admitiu que seus benefícios sociais não eram sua única fonte de renda - ele também gerenciava um serviço ilegal de conserto de pneus. "A gente tem que se virar", foi a desculpa dada por ele.

Mas essa desculpa não comoveu o revendedor. Indignado, o comerciante não perdeu tempo e ligou para a agência de emprego - departamento do governo cuja função é recolocar os desempregados no mercado de trabalho - para denunciar o candidato. Mas os funcionários da agência não quiseram saber da denúncia e, em vez disso, sugeriram que o comerciante ficasse quieto. Os funcionários disserem que, se começassem a ir atrás de todos os que tentam burlar o seguro-desemprego, eles não fariam mais nada.
Derrubando um mito
O revendedor de pneus foi um dos 200 participantes de um estudo intitulado "A Vida Dupla dos Alemães", conduzido pelo Rheingold Institute for Qualitative Market and Media Research (Instituto Rheingold de Pesquisa Qualitativa de Mercado e Mídia) e divulgado nas últimas semanas. Outras 1.060 pessoas foram entrevistadas para determinar se as respostas obtidas inicialmente eram representativas para o estudo, que foi encomendado por uma cervejaria alemã. Questionados sobre sua visão em relação à Alemanha e seu povo, as respostas dos entrevistados sugeriram que a famosa dureza alemã é apenas superficial.

"Casos como o do revendedor de pneus têm se tornado cada vez mais parte de nosso dia a dia - mais do que gostaríamos de reconhecer", disse Jens Lönneker, coordenador do estudo.

O estudo revelou que o pessimismo é generalizado, uma vez que 70% dos participantes concordaram com a afirmação de que a Alemanha está, de certa forma, indo por água abaixo. A maior parte dos participantes do estudo disse saber o porquê - 88% culparam a burocracia e a estagnação da economia.

"Os alemães não são tão honestos, pontuais e escrupulosos quanto as pessoas pensam", admitiram 73% dos respondentes da pesquisa. "Há vários trapaceiros entre os alemães também".
Dois pesos e duas medidas
Será que, apesar de todas as queixas dos alemães em relação à falta de uma ética de trabalho nos países mediterrâneos, os próprios alemães são preguiçosos? Não necessariamente, mas, segundo Lönnecker, os alemães levam uma vida dupla - eles valorizam muito a segurança financeira durante sua vida profissional e sua aposentadoria e se orgulham das muitas liberdades individuais de que desfrutam. "Eles vivem de acordo com seu próprio conjunto de valores, mas têm pouco sentimento de responsabilidade social", explicou Lönneker. Igualmente sintomático desse isolamento da vida pública é o fato de apenas 30% dos entrevistados considerarem importante ser politicamente ativo.

Ironicamente, no entanto, 62% também reclamaram sobre o suposto egoísmo e a suposta perda de valores. Sessenta e sete por cento dos entrevistados disseram que gostariam que fossem implementadas medidas para combater essa tendência - e apenas 9% se mostraram confiantes de que os políticos são capazes de conduzir o país na direção correta.

Considerando-se que a maioria dos participantes do estudo acredita que o país não está evoluindo apesar de sua relativa estabilidade econômica, acrescentou Lönneker, "nós precisamos investir mais tempo para pensar sobre que tipo de país queremos que a Alemanha seja".

Mas, em vez de arregaçar as mangas e fazer alguma coisa para sanar as supostas mazelas da sociedade, os alemães dão as costas para os problemas - ou passam a responsabilidade para alguma ONG, que eles próprios se convencem de que é íntegra, alertou o estudo.
Impopular
Será que a crise do euro vai revelar a verdadeira identidade da Alemanha? O olhar do mundo se voltou para o país nos últimos meses e, apesar de a eficiência dessa nação ser amplamente admirada, o modo professoral por meio do qual os alemães tentam dar o exemplo sobre como conduzir a economia começou a irritar seus parceiros.

"Muitos acusam a Alemanha de ter enriquecido após adotar a atitude de modelo a ser seguido", explicou Lönneker. "Mas os alemães ficam irritados por serem criticados por qualidades consideradas tipicamente alemãs".

Cada vez mais, o ponto de vista mundial sobre o país é que, embora os alemães ajam de modo totalmente confiante na arena internacional, por dentro eles parecem muito neuróticos. E, em um período em que os parceiros europeus da Alemanha estão exigindo que o país demonstre sua liderança e solidariedade durante a crise do euro, os cidadãos alemães estão, em vez disso, preocupados com sua própria prosperidade.
Ao mesmo tempo, 72% dos participantes do estudo estão convencidos de que o passado nazista do país impede que a liderança política da Alemanha adote medidas decisivas para resolver os problemas. Os alemães não querem causar uma má impressão. Mas, para Lönneker, os alemães têm vontade de mudar - só está demorando um pouco demais para que façam isso.
Tradutor: Cláudia Gonçalves

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