sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Caixa registradora X Caixinha de surpresas


DEBATE ABERTO

Caixa registradora X Caixinha de surpresas

O futebol é o mais imprevisível dos esportes, mas não é tão imprevisível assim. No fim das contas, quem tem mais dinheiro tem mais chance de ter os melhores jogadores, os melhores técnicos e as melhores condições de treinamento. É por isso que Corinthians e o Chelsea vão se enfrentar neste domingo no Japão.

Estou cá em Nagoya acompanhando a Copa do Mundo de Clubes. Se o nobre leitor não acabou de sair de um coma (ou se não lê apenas o Japan Times, que não dá notícias sobre o assunto), sabe que o Corinthians está na final e vai enfrentar o Chelsea no próximo domingo. 

Agora eu vos pergunto: Por que estes dois times estão nas finais? 
E eu vos respondo: Não é porque Brasil e Inglaterra são times tradicionais no futebol. É por conta do dinheiro.

O Chelsea tem um orçamento muito maior que o do mexicano Monterrey, seu adversário na semifinal. E os salários de uns poucos jogadores do Corinthians cobrem toda a folha de pagamento do egípcio Al Ahly. 

O futebol é o mais imprevisível dos esportes, mas não é tão imprevisível assim. No fim das contas, quem tem mais dinheiro tem mais chance de ter os melhores jogadores, os melhores técnicos e as melhores condições de treinamento. 

Os ingleses não venceram os mexicanos por 3 a 1 porque são os inventores do futebol. E os brasileiros não superaram o campeão africano por serem da pátria do drible e da ginga. As vitórias aconteceram porque estes times são mais ricos que seus adversários. 

Com dinheiro o Corinthians conseguiu importar jogadores como o peruano Guerrero, que fez o gol da vitória, e manter Paulinho, que recebeu propostas do exterior. 

Com dinheiro o Chelsea trouxe uma legião de estrangeiros, entre eles os espanhóis Juan Mata e Fernando Torres, que marcaram os gols na semifinal, e os brasileiros Ramires, Oscar e David Luiz, da seleção brasileira. 

Para o confronto decisivo, o Chelsea é o favorito. E justamente por ter mais dinheiro que o Corinthians.

Mas o Brasil melhorou razoavelmente nos últimos anos. O dinheiro da tevê e alguma modernização na gestão de alguns clubes (discreta, mas inegável), entre eles, o Corinthians, fez com que os clubes ficassem mais fortes financeiramente. E assim eles conseguiram segurar alguns bons jogadores. 

A situação poderia ser ainda melhor se:

- a CBF não fosse tão antiquada e corrupta (como prova a fuga de Ricardo Teixeira), 

- se a CBF trabalhasse para os clubes brasileiros, em vez de apenas se aproveitar deles,

- se as confederações estaduais fossem organismos mais profissionais, e não somente uma máquina de sustentação da CBF,

- e se os clubes não fossem geridos como negócios de família.

Contornando estes quatro “ses” impediríamos de vez o êxodo dos jogadores brasileiros e ainda importaríamos mais talentos. 

Ou seja, para melhorar o que vemos em campo é necessário uma reforma nos bastidores do futebol. Jogos e campeonatos não são vencidos apenas entre as quatro linhas. Nem só nos vestiários. Eles começam a ser vencidos nos gabinetes, nas largas cadeiras que sustentam as bundas que dirigem este esporte. 

É claro que neste domingo o Corinthians pode ganhar. Mas, se isso acontecer, será graças à ilógica do futebol, que permite, ainda, que a bola ganhe do bolo de dinheiro.

Quereis exemplos? Dou-vos.

Nos últimos anos, o Internacional venceu o Barcelona e o São Paulo ganhou do Liverpool. Mas foram vitórias em que o time que jogou pior venceu. Em verdade, em verdade vos digo que até aqui, na história da Copa do Mundo de Clubes (que começou em 2005), o time que teve mais dinheiro sempre jogou melhor. 

Os corintianos que vi pelas ruas de Nagoya sabem que futebol não é só uma caixa registradora, é também uma caixinha de surpresas. E hoje nenhum time brasileiro tem mais condição de causar surpresas do que o Corinthians.

José Roberto Torero é formado em Letras e Jornalismo pela USP, publicou 24 livros, entre eles O Chalaça (Prêmio Jabuti e Livro do ano em 1995), Pequenos Amores (Prêmio Jabuti 2004) e, mais recentemente, O Evangelho de Barrabás. É colunista de futebol na Folha de S.Paulo desde 1998. Escreveu também para o Jornal da Tarde e para a revista Placar. Dirigiu alguns curtas-metragens e o longa Como fazer um filme de amor. É roteirista de cinema e tevê, onde por oito anos escreveu o Retrato Falado.

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