segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Energia compartilhada


Estudo mostra que integração energética na América do Sul seria benéfica

LUIZ SUGIMOTO
A integração energética na América do Sul traria ganhos expressivos como a complementaridade dos recursos energéticos aproveitando, por exemplo, a diversidade hidrológica entre os países; a possibilidade de aplicação de tarifas mais competitivas; e a diversificação da matriz energética de seus membros, atendendo não só aos interesses geopolíticos, como também à busca pela segurança energética. Diversos acordos bilaterais foram firmados ao longo dos anos, mas este processo de integração evolui de forma lenta, visto que envolve questões estratégicas, políticas e econômicas.
É com estas considerações que Luis Germán Barrientos Mujica nos introduz à sua dissertação de mestrado, em que avalia os benefícios associados à operação coordenada do Sistema Interligado Nacional (SIN) por parte do Brasil, juntamente com as usinas binacionais (Paraguai-Argentina) de Corpus e Yacyretá. Ele defendeu a dissertação junto à Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC) da Unicamp, sob a orientação do professor Secundino Soares Filho. “Em minha graduação na Universidade del Este, tive um orientador que trabalhava em Itaipu. Veio dele a sugestão para que eu fizesse o mestrado na Unicamp e também do tema para a pesquisa.”
Luis Barrientos explica que das duas usinas binacionais, Yacyretá está em operação, ao passo que a Corpus Christi ainda é um projeto cuja construção vem avançando. “A avaliação foi feita a partir de dois estudos de caso, com dados oficiais do Programa Mensal da Operação (PMO) de setembro de 2011, considerando o planejamento da expansão do parque gerador até dezembro de 2015. Os estudos de caso foram simulados em 64 cenários hidrológicos, levando em conta as séries históricas de vazões de 1931 a 1998. O primeiro cenário vai de setembro de 1931 até dezembro de 35, o segundo de setembro de 32 até dezembro de 36, e assim por diante, sempre dentro de um planejamento para 52 meses.”
O pesquisador utilizou para seus estudos o modelo ODIN (Otimização do Despacho Interligado Nacional), desenvolvido na FEEC, que é uma abordagem baseada na otimização determinística e não linear com vazões previstas e atualizadas a cada intervalo de tempo, numa abordagem denominada Modelo de Controle Preditivo (MCP). “Dessa forma é possível uma representação detalhada e individualizada das usinas hidrelétricas do sistema, viabilizando a análise que se pretende.”
Segundo Barrientos, no primeiro caso foi simulada a operação do Sistema Interligado Nacional como ocorre atualmente (de maneira desacoplada das usinas binacionais), com 147 hidrelétricas totalizando uma potência instalada de 95,6 mil megawatts (MW). A simulação considerou futuras usinas hidrelétricas como Baixo Iguaçu, com construção prevista dentro do período de planejamento abordado no estudo. A usina de Itaipu, embora seja também binacional, foi incluída como um subsistema do SIN devido à enorme dimensão e à existência de linhas de transmissão dedicadas ao escoamento de energia para pontos distintos.
Para a simulação, acrescenta Luis Barrientos, criou-se um subsistema adicional composto pelas usinas binacionais, que estão conectadas hidraulicamente aos subsistemas Sudeste/Centro-Oeste e Sul do SIN. “Tomei, por exemplo, os dados sobre as defluências das usinas de Itaipu (no rio Paraná) e de Salto Caxias (no rio Iguaçu), que são as últimas no Brasil a despejar água antes de se chegar às binacionais. Mais abaixo do rio Paraná, essas defluências passam a ser afluências de Corpus e Yacyretá: é quando simulo a operação das duas binacionais para ver quanto geram com tais vazões.”
O pesquisador observa que os subsistemas do SIN e o subsistema das binacionais são acoplados hidraulicamente, mas não eletricamente. Entretanto, no segundo caso foi considerada a operação coordenada das usinas, como se as binacionais participassem do sistema brasileiro. “A partir desta otimização conjunta, calculei novamente quanto gerariam cada usina, comparando os resultados da operação coordenada com a não coordenada, com base nos valores médios de vazão, geração e turbinagem. Na prática, para promover a interligação elétrica, são necessárias linhas de transmissão, o que implica custos – mas isso não fez parte da minha pesquisa.”
Em relação aos resultados, Luis Barrientos afirma que existem cenários em que a operação coordenada concentra benefícios nas usinas brasileiras e cenários que contemplam as binacionais. “Porém, considerando a geração hidrelétrica média total, houve um aumento de 13,28 megawatts, ou 116 mil megawatts por ano. Isso significa que operando de maneira coordenada haverá um ganho de mais de R$ 11 milhões por ano, levando em conta o valor médio de 100 reais por megawatt/hora.”
Potencial
Na dissertação de mestrado, Barrientos aponta alguns benefícios da integração energética entre os países do Mercosul, como o maior aproveitamento do potencial hidráulico, a otimização do custo de geração e o aproveitamento da energia excedente, entre outros. Ele ressalta que a América do Sul é autossuficiente em insumos energéticos, detendo importantes reservas de petróleo, gás natural e recursos hídricos. “A integração energética tem assim um grande potencial, em função de um fator concreto e objetivo: há complementaridade de insumos energéticos entre os países da região, o que já possibilitou a construção de linhas de transmissão, usinas hidroelétricas e gasodutos.”
O pesquisador lembra que o processo de integração já apresentou marcos como a construção de hidrelétricas binacionais (especialmente no Cone Sul) e, ainda nos anos 90, a interconexão dos mercados elétricos nas sub-regiões do Mercosul, Comunidade Andina e países da América Central. “A complementaridade de insumos energéticos pode garantir uma segurança ímpar e estratégica, capaz de viabilizar ciclos de crescimento mais acelerados e dar maior competitividade econômica aos países da região. A base deste processo é a instalação adequada de sistemas integrados de transmissão de energia elétrica e de operação.”
Confiabilidade
Informações colhidas por Luis Barrientos dão conta de que o Sistema Interligado Nacional (SIN) foi criado com o objetivo de ampliar a confiabilidade, aperfeiçoar os recursos energéticos e homogeneizar mercados, já que o Brasil possuía vários sistemas elétricos desconectados. Isso impossibilitava uma operação eficiente das bacias hidrográficas regionais e da transmissão de energia elétrica entre as principais usinas geradoras.
O Setor Elétrico Brasileiro (SEB) possui outros sistemas, denominados Sistemas Isolados, que se concentram principalmente na Amazônia. Os estados do Amapá, Roraima, Rondônia, Acre, Pará e Amazonas não estão interligados ao SIN, devido à floresta densa e heterogênea, além de rios caudalosos e extensos, que dificultaram a construção de linhas de transmissão de grande extensão que permitissem a conexão. O Sistema Isolado compreende 45% do território nacional, mas responde por apenas 3,4% da energia elétrica produzida no país.
O SIN abrange as regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste, Nordeste e parte da região Norte, atendendo mais de 96% do consumo de energia no Brasil. Em dezembro de 2010 a capacidade instalada do SIN era de 107.990 MW. Esta capacidade vem de usinas hidrelétricas distribuídas por doze bacias hidrográficas nas diferentes regiões. As usinas térmicas, muitas vezes localizadas nas proximidades dos centros de carga, desempenham papel de complementação à energia hidráulica gerada e contribuem para a segurança energética do SIN.
Sobre as usinas binacionais localizadas no rio Paraná, o autor descreve que Itaipu, construída a partir de acordo entre Paraguai e Brasil, possui 20 unidades geradoras e 14.000 MW de potência instalada, fornecendo 16,99% da energia consumida no Brasil e abastecendo 72,91% do consumo paraguaio. A usina Yacyretá, construída no trecho que separa a Argentina do Paraguai, tem capacidade instalada de 3.200 MW, abastecendo 16% da demanda Argentina e complementando em 11% a do Paraguai. O projeto Corpus Christi, criado em 1971, prevê uma potência instalada de 2.800 MW, tendo Pindoí como local mais apropriado para a usina, devido ao menor impacto ambiental.

Nenhum comentário:

Postar um comentário