domingo, 10 de fevereiro de 2013

A banalização, epidemia da modernidade



 
La Jornada
Diário mexicano
Adital
Tradução: ADITAL
Por Xabier F. Coronado
03/02/2013

Por Xabier F. Coronado
03/02/2013
A diferença entre a inteligência e a estupidez reside no manejo do adjetivo,
cuyo uso não diversificado constitui a banalidade.
E. M. Cioran, Breviario de podredumbre
Vivemos tempos em que tudo se difunde de maneira global. Nesta época, qualquer evento é divulgado em todo o planeta em questão de segundos e praticamente todas as pessoas podemos chegar a tomar conhecimento dele. Isso acontece graças à rede digital que nos envolve e na qual, de alguma forma, estamos aprisionados. Tudo se compartilha de modo superficial em uma onda contínua de titulares ambíguos ou tendenciosos. Os que se interessam em ir além da manchete, percebe que o conteúdo apenas aprofunda e, muitas vezes, é incoerente ou falaz.
Grande parte da informação se apresenta com um enfoque banal, manipulador e viciado desde a origem. A banalidade se impõe tanto em assuntos de entretenimento como em temas considerados mais transcendentes: política, educação, arte e outras manifestações da cultura. O efeito final é que a banalização se estende como uma epidemia que contamina a todos, queiramos ou não, temos que sobreviver nesse miasma de trivialidade que se respira.
O banal, vão e venal
Não há nada mais terrível, insultante e deprimente do que a banalidade.
A. P. Chéjov
Não há referencia nos dicionários etimológicos a que "banal” tenha raízes em "vão” (do latim vanus), apesar de que em seus significados poderiam equiparar-se: o vão não tem substância ou identidade; e o banal é um adjetivo de origem francesa (banal, que procede de ban, bando público), definido como trivial, comum e insubstancial. "Banalidade” é o que tem qualidade de banal, e "banalização” é a ação e o efeito de banalizar; ou seja, o resultado de tratar algo de maneira trivial.
Em momentos determinados, a banalidade pode cumprir uma função de entretenimento saudável, para distrair-nos ou relaxar-nos. Algo diferente acontece quando o banal invade outros espaços de forma indiscriminada. Cioran vê uma faceta positiva no banal quando afirma que "em geral é de uma banalidade, e não de um paradoxo, que surge uma revelação” (Del incoveniente de haber nascido, 1973); porém, é difícil descobri-la quando os sintomas da banalização se manifestam em muitas expressões da vida pública e privada.
Atualmente, a banalização domina nosso entorno e convivemos na paisagem banal da aparência; o mundo cultural, político, econômico e social está sujeito a um mesmo cânon doloso que permite justificar qualquer coisa. Na era da banalização tudo é venal, em sua dupla acepção de vendável e subornável. A banalidade se vende como marca de moda nos meios de comunicação massivos que, ao mesmo tempo, impõem uma pseudocultura a base de insistência e publicidade. Somente há competência entre os que aceitam suas regras; elimina-se ou nega-se qualquer voz dissonante. A banalização fomenta o consumo e o liga descaradamente à felicidade. "Tanto ganhas / tanto compras / tanto tens /tanto vales”, é o estribilho da canção do êxito; o coro da banalidade está dirigido pela todopoderosa economia neoliberal, que mercantilizou a cultura para convertê-la em indústria do entretenimento.
Como exemplo, temos o que acontece no México: nesse país, parecera que só existe o que está programado pelo duopólio televisivo, única via de informação e entretenimento para a maioria da população, e modelo de vida para a sociedade. Assim é como se manipulam consciências e preferências.
Banalização da cultura
Não quero ser apocalíptico, porém, o espetáculo tomou o lugar da cultura.
O mundo está convertido em um enorme cenário, em um enorme show.

José Saramago, Otros cuadernos de Saramago
No último ano, o tema da banalização da cultura tem dado muito o que falar, sobretudo a partir da publicação do livro de Vargas Llosa, La civilización del espectáculo (2012). Basicamente, o escritor peruano desenvolve o artigo do mesmo nome que havia publicado anteriormente (El País, 6/IX/2008), onde nos comunicava sua preocupação com as consequências, na esfera cultural, de uma serie de tendências sociais e econômicas. Um debate que filósofos e sociólogos já haviam estabelecido durante o século passado.
A sociedade tem se banalizado de maneira global e vários pensadores apontaram essa tendência. Em 1947, M. Horkheimer e TH.W. Adorno, ao acunhar o termo "indústria cultural” para designar os produtos e processos da cultura de massas, assinalaram que a tecnologia e a ideologia do capitalismo monopólico transformavam a cultura em um produto mercantil com tendência a homogeneizar-se. Também o polifacético Guy Debord publicou, em 1967, um interessante livro, La sociedad del espectáculo, de título quase homônimo ao que acaba de escrever Vargas Llosa. Em seu texto, Debord aponta com grande lucidez que "o espetáculo se mostra como a própria sociedade, como uma parte da sociedade e como instrumento de unificação. O espetáculo não é um conjunto de imagens, mas uma relação social entre pessoas mediatizada por imagens”.
Em sua proposta, Vargas Llosa não se detém a aprofundar sobre a influência do sistema econômico e educativo em todo esse processo de banalização; mas manifesta que a "democratização da cultura” produziu um efeito de "trivialização e vulgarização da vida cultural onde certo facilismo formal e superficialidade nos conteúdos culturais se justificavam em razão do propósito cívico de chegar ao maior número de usuários”. Também a torna responsável pelo desaparecimento da "alta cultura”. Em sua exposição, o reconhecido novelista não distingue com clareza a cultura popular da cultura de massas, as mescla em um mesmo conceito e deixa à parte a alta cultura.
Atualmente, "cultura popular” é um conceito usado de forma confusa e contraditória. Eduardo Galeano a define como um complexo sistema de símbolos de identidade que o povo preserva e recria; enquanto que para o sociólogo Mario Margulis, a cultura popular é uma cultura solidária: produtores e consumidores a criam e a cultivam ("A cultura popular”, 1986). Ao contrário, a cultura de massas, desenhada e difundida por gestores que atendem a interesses principalmente econômicos, somente se consome.
A contribuição de Vargas Llosa a esse debate é criticada por outros autores, entre eles Jorge Volpi ("El último mohicano”, em El País, 27/IV/2012), que o tilda de elitista por defender a alta cultura. Vargas Llosa conclui que essa tendência à banalização é irreversível e crê que a cultura, como ele teve o privilégio de conhecê-la, vai desaparecer; ao que Volpi comenta: "acerta ao dignosticar o fim de uma era: a dos intelectuais como ele”.
Por outro lado, a banalização venal também atinge a vida política. Para Galeano (El libro de los abrazos, 1989), "a cultura e a política converteram-se em artigos de consumo. Os presidentes são eleitos pela televisão, como os sabonetes; e os poetas cumprem uma função decorativa”. Em palavras de Fidel Castro (Selección de discursos), "a política deixou de ser a ilusão de arte nobre e útil com o que sempre sonhou justificar-se, para converter-se em entretenimento banal e desprestigiado”.
A cibercultura tampouco se salva da banalização. No início, tratou-se de uma cultura minoritária; porém, com a popularização da Internet, transformou-se em cultura de massas. Claro que existe uma maneira equilibrada de usar a rede digital; porém, o contágio do banal é evidente. Além de converter-se em imprescindível ferramenta de trabalho, a Internet ganhou espaço frente a outros meios que repartiam entre si a atenção dedicada ao tempo livre; agora ócio e negócio se condensam em um mesmo dispositivo. Para muitos, estar sem conexão é inconcebível e ter acesso à internet já é considerado um direito universal, apesar dos muito questionáveis conteúdos e níveis de utilização.
As denominadas "redes sociais” crescem em um ritmo exponencial; chegam a qualquer lugar do planeta e já ninguém duvida do potencial que possuem. Não há limite de idade para engrossar suas listas: crianças, jovens e adultos se comunicam através delas. O intercâmbio de imagens ou mensagens banais é habitual e a circulação de notícias, vídeos e demais ocorrências, obsessiva. É quase heroico resistir ao Twitter ou ao Facebook; só existes se estás registrado, pois aí podes acessar os conteúdos, opinar e ser reconhecido. O autêntico desafio está em utilizar essas redes cibernéticas sociais de forma consciente e equilibrada.
Definitivamente, a banalização é uma realidade alarmante que apenas deixa espaço para a criatividade e para a autêntica cultura; tudo o desvirtua, faz perder os pontos de referência e resulta difícil distinguir o genuíno do adulterado.
[Em breve, a tradução completa para o português].
La banalidad del mal
… la terrible banalidad del mal, ante la que las palabras y el pensamiento se sienten impotentes.
Hannah Arendt, Eichmann en Jerusalén: un informe sobre la banalidad del mal
A comienzos de la década de los años sesenta se celebró en Israel el juicio a Adolf Eichmann, un mando medio encargado de organizar el transporte de personas a los campos de concentración nazis. La politóloga y filósofa Hannah Arendt cubrió el evento para la revista The New Yorker y el resultado de esa experiencia dio lugar al libro Eichmann en Jerusalén: un informe sobre la banalidad del mal (1963). De este trabajo surge el controvertido término, "banalidad del mal”, que Arendt registra por primera vez para explicar la falta de reflexión, sobre las consecuencias de sus actos, de quien comete crímenes al acatar órdenes; circunstancias que, según Arendt, no lo liberan de culpa sino que lo hacen motivo de otra forma de juicio.
Actualmente, este concepto se utiliza para describir el mal como algo que no nace del individuo sino del sistema al que obedece. En consecuencia, la banalidad del mal, como sumisión total a la autoridad, ha sido y es utilizada para cometer delitos contra la humanidad. El poder se escuda en la barbarie, la banalización de la violencia y de las actitudes discriminatorias que justifican la intolerancia.
Preguntas y respuestas
Los períodos reaccionarios se convierten de un modo lógico en tiempos de evolucionismo banal.
León Trotski, La revolución permanente
Para terminar, las preguntas clave: ¿de dónde nos viene la banalización? ¿Trae la vida, en sí misma, la banalidad? ¿Somos los humanos seres banales? Para buscar respuestas, consultamos algunos pensadores que no padecieron esta enfermedad. El controvertido Cioran escribe: "Te encuentras en el seno de la vida siempre que dices, con toda tu alma, una banalidad.” (El ocaso del pensamiento, 1940). Otros autores también escribieron que la banalidad puede ser inherente a la condición humana, como Gorki cuando narra: "Todo era banal y corriente en su existencia, pero esta sencillez y banalidad eran el fardo de una innumerable cantidad de seres sobre la tierra” (La madre, 1907); o Pessoa en su obra póstuma, El libro del desasosiego (1982), este homem banal representa a banalidade da Vida. Ele é tudo para mim, por fora, porque a Vida é tudo para mim por fora. Para Charles Baudelaire, esa tendencia a lo banal está en nuestra esencia. En Las flores del mal (1857) nos dejó estos versos: "Si la violación, el veneno, el puñal, el incendio,/ todavía no han bordado con sus placenteros dibujos/ la urdimbre banal de nuestros tristes destinos,/ es porque nuestra alma, ¡fatalmente! no es bastante audaz.” En cambio, para Guy Debord (1967) la culpa es del sistema que nos globaliza: "La producción capitalista ha unificado el espacio, que ya no está limitado por sociedades exteriores. Esta unificación es, al mismo tiempo, un proceso extensivo e intensivo de banalización.”
La epidemia de la banalización se extiende y parece contagiar a gran cantidad de individuos en el planeta. Lo banal es como una bacteria que está latente y en épocas propicias se reproduce y se manifiesta en la banalización. ¿Será posible vacunarse? Quizás sí, con un tratamiento a base de atención y voluntad para ejercer control sobre el consumo, ser selectivos, exigirse y exigir.
Como colofón, unas palabras del escritor Miguel Delibes que pueden ayudar a ubicarnos: "Al palpar la cercanía de la muerte, vuelves los ojos a tu interior y no encuentras más que banalidad, porque los vivos, comparados con los muertos, resultamos insoportablemente banales”.

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