Banco JP Morgan, presságio de novo Apocalipse
A economia mundial enfrenta o risco de uma nova queda. A crise atual poderá ser apenas o preâmbulo de novo Apocalipse. O exemplo mais recente é o das perdas de mais de 2 bilhões de dólares do JP Morgan em maio, por ter cometido erros flagrantes, segundo as palavras do seu arrogante chefe Jamie Dimon. O poderia do mercado financeiro segue impedindo a adoção de regras para conter a especulação. O artigo é de Alejandro Nadal.
Alejandro Nadal - La Jornada
Há cinco anos na pior crise das últimas oito décadas e o mundo financeiro continua sem mudanças significativas. Aqui localizou-se o epicentro do terremoto e as reformas ao seu sistema de regulação deviam impedir um novo desastre. Mas o poderio do setor financeiro e bancário impediu que aplicassem restrições à sua atividade especulativa. A economia mundial enfrenta o risco de uma nova queda. A crise atual poderá ser apenas o preâmbulo do novo Apocalipse.
Primeiro os números. O tamanho do mercado mundial de derivados é estimado em 1,2 trilhões de dólares. A maioria das transações nesse gigantesco mercado, desde swaps [um contrato de compra ou venda à prazo] de dívida e de taxas de juro até exóticos veículos sintéticos de investimento, escapam a qualquer sistema de regulação. Este mercado não cumpre qualquer função social ou económica. A sua razão de ser é a pura especulação.
A volatilidade, o comportamento de rebanho e as expectativas não realizadas são traços característicos deste casino. A instabilidade é a palavra chave neste terreno de apostas perigosas. Nem sequer os agentes que participam nesse mercado entendem o seu funcionamento. Os seus modelos de valorização de risco são enganadores porque reduzem a incerteza a um cálculo de probabilidades. O exemplo mais recente é o das perdas de mais de 2 bilhões de dólares do JP Morgan em maio, por ter cometido erros flagrantes, segundo as palavras do seu arrogante chefe Jamie Dimon.
Esta terminologia esconde o fato de o banco ter feito apostas absurdas que correram mal. Este episódio chama a atenção porque pode ser um presságio sinistro. Os principais bancos do mundo têm níveis de exposição muito fortes neste mercado, onde tudo pode acontecer, com graves consequências para a economia real.
No entanto, até agora não se estabeleceu um novo regime de regulação para mudar este estado de coisas. Em 2010, Obama promulgou a lei Dodd-Frank. É um documento de 2.300 páginas com regras que já se aplicam aos riscos que os bancos podem assumir e às atribuições das entidades reguladoras. Porém, os seus dois componentes mais importantes não entraram em vigor. Trata-se das restrições ao mercado de derivados e a chamada regra Volcker.
O título VII da lei estabelece que as operações sobre derivados deverão levar-se a cabo em mercados públicos, para que os preços sejam conhecidos e se garanta o cumprimento dos contratos. Mas muitas regras nesse título estão a ser atenuadas pelo lobby dos bancos e pelos seus servis amigos na Securities Exchange Commission e na Commodities and Futures Trading Commission. Em especial, as definições sobre os contratos de swaps constituem terreno fértil para abrir janelas através das quais se possa contornar a regulamentação.
O outro componente chave é a chamada Regra Volcker, que proíbe os bancos de realizarem operações para seu próprio benefício com recursos dos seus clientes. Esta peça de regulação é do senso comum, mas para os bancos é uma grave ameaça: afeta uma das fontes mais importantes dos seus lucros especulativos. Todavia, não entra em vigor porque a sua regulamentação está sendo fortemente debatida: o poderoso lobby dos bancos já fez crescer o capítulo sobre a regra Volcker de dez para 300 páginas, devido à infinidade de exceções e advertências que permitirão aos bancos contornar esta proibição.
Teria sido melhor reativar uma lei equivalente à lei Glass-Steagall, que separava claramente as atividades especulativas e de alto risco das operações tradicionais dos bancos. Mas o restabelecimento dessa lei (revogada no tempo de Bill Clinton) é algo que o sistema financeiro combaterá com muito mais tenacidade e ninguém em Washington está disposto a arriscar a pele politicamente.
Segundo a Bloomberg, só no primeiro trimestre deste ano os nove principais bancos de investimento do mundo obtiveram lucros de 55 bilhões de dólares. É evidente que para estes bancos o mercado de derivados é um espaço vital ao qual não estão dispostos a renunciar. Um novo descalabro no mercado de derivados afetaria todos os mercados financeiros na Europa, começando pelo dos títulos soberanos. Por isso, é urgente livrarmo-nos da ditadura do capital financeiro.
Enquanto na Europa e nos Estados Unidos a economia real se afunda numa profunda recessão, os bancos subverteram a vontade popular através do lobby. Os seus cúmplices são os partidos políticos: nos Estados Unidos, o Comitê de Serviços Financeiros da Câmara de Representantes é o que mais membros tem, porque se converteu num instrumento para recolher fundos do complexo financeiro-bancário e financiar campanhas eleitorais. Os governos em quase todo o mundo inclinam-se perante os seus senhores financeiros. A esquerda é a única que pode questionar este estado de coisas. Expropriar os expropriadores é a tarefa.
(*) Artigo de Alejandro Nadal, publicado a 1 de agosto de 2012 no jornal mexicano La Jornada. Tradução de Carlos Santos para Esquerda.net
Primeiro os números. O tamanho do mercado mundial de derivados é estimado em 1,2 trilhões de dólares. A maioria das transações nesse gigantesco mercado, desde swaps [um contrato de compra ou venda à prazo] de dívida e de taxas de juro até exóticos veículos sintéticos de investimento, escapam a qualquer sistema de regulação. Este mercado não cumpre qualquer função social ou económica. A sua razão de ser é a pura especulação.
A volatilidade, o comportamento de rebanho e as expectativas não realizadas são traços característicos deste casino. A instabilidade é a palavra chave neste terreno de apostas perigosas. Nem sequer os agentes que participam nesse mercado entendem o seu funcionamento. Os seus modelos de valorização de risco são enganadores porque reduzem a incerteza a um cálculo de probabilidades. O exemplo mais recente é o das perdas de mais de 2 bilhões de dólares do JP Morgan em maio, por ter cometido erros flagrantes, segundo as palavras do seu arrogante chefe Jamie Dimon.
Esta terminologia esconde o fato de o banco ter feito apostas absurdas que correram mal. Este episódio chama a atenção porque pode ser um presságio sinistro. Os principais bancos do mundo têm níveis de exposição muito fortes neste mercado, onde tudo pode acontecer, com graves consequências para a economia real.
No entanto, até agora não se estabeleceu um novo regime de regulação para mudar este estado de coisas. Em 2010, Obama promulgou a lei Dodd-Frank. É um documento de 2.300 páginas com regras que já se aplicam aos riscos que os bancos podem assumir e às atribuições das entidades reguladoras. Porém, os seus dois componentes mais importantes não entraram em vigor. Trata-se das restrições ao mercado de derivados e a chamada regra Volcker.
O título VII da lei estabelece que as operações sobre derivados deverão levar-se a cabo em mercados públicos, para que os preços sejam conhecidos e se garanta o cumprimento dos contratos. Mas muitas regras nesse título estão a ser atenuadas pelo lobby dos bancos e pelos seus servis amigos na Securities Exchange Commission e na Commodities and Futures Trading Commission. Em especial, as definições sobre os contratos de swaps constituem terreno fértil para abrir janelas através das quais se possa contornar a regulamentação.
O outro componente chave é a chamada Regra Volcker, que proíbe os bancos de realizarem operações para seu próprio benefício com recursos dos seus clientes. Esta peça de regulação é do senso comum, mas para os bancos é uma grave ameaça: afeta uma das fontes mais importantes dos seus lucros especulativos. Todavia, não entra em vigor porque a sua regulamentação está sendo fortemente debatida: o poderoso lobby dos bancos já fez crescer o capítulo sobre a regra Volcker de dez para 300 páginas, devido à infinidade de exceções e advertências que permitirão aos bancos contornar esta proibição.
Teria sido melhor reativar uma lei equivalente à lei Glass-Steagall, que separava claramente as atividades especulativas e de alto risco das operações tradicionais dos bancos. Mas o restabelecimento dessa lei (revogada no tempo de Bill Clinton) é algo que o sistema financeiro combaterá com muito mais tenacidade e ninguém em Washington está disposto a arriscar a pele politicamente.
Segundo a Bloomberg, só no primeiro trimestre deste ano os nove principais bancos de investimento do mundo obtiveram lucros de 55 bilhões de dólares. É evidente que para estes bancos o mercado de derivados é um espaço vital ao qual não estão dispostos a renunciar. Um novo descalabro no mercado de derivados afetaria todos os mercados financeiros na Europa, começando pelo dos títulos soberanos. Por isso, é urgente livrarmo-nos da ditadura do capital financeiro.
Enquanto na Europa e nos Estados Unidos a economia real se afunda numa profunda recessão, os bancos subverteram a vontade popular através do lobby. Os seus cúmplices são os partidos políticos: nos Estados Unidos, o Comitê de Serviços Financeiros da Câmara de Representantes é o que mais membros tem, porque se converteu num instrumento para recolher fundos do complexo financeiro-bancário e financiar campanhas eleitorais. Os governos em quase todo o mundo inclinam-se perante os seus senhores financeiros. A esquerda é a única que pode questionar este estado de coisas. Expropriar os expropriadores é a tarefa.
(*) Artigo de Alejandro Nadal, publicado a 1 de agosto de 2012 no jornal mexicano La Jornada. Tradução de Carlos Santos para Esquerda.net
Fotos: Ação contra os despejos e os bancos JP Morgan e Chase, Los Angeles, 8 de julho de 2010 – Foto de SEIU International/Flickr
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