quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

"A corporatocracia está no poder"



Entrevista com John Perkins na ocasião do lançamento de seu livro "Confissões de um assassino econômico" em 1996.

MARCELO NINIO
O livro de John Perkins, "Confissões de um assassino econômico" (Editora Cultrix), é um prato cheio para os teóricos da conspiração. Em tom confessional, como indica o título, Perkins conta a experiência que viveu na pele de um "assassino econômico", profissional que manipula números e chantageia governos ao redor do mundo a serviço do que chama de "corporatocracia" -conluio entre a Casa Branca e grandes empresas, com a ajuda do Banco Mundial e do FMI, para assegurar o poderio do império norte-americano. A seguir, trechos da entrevista de Perkins à Folha, concedida por telefone, da Flórida (EUA).
Folha - O que é a corporatocracia?
John Perkins - 
Desde a Segunda Guerra Mundial, os assassinos econômicos construíram o primeiro império verdadeiramente global. Isso foi feito principalmente por meios econômicos, não militares. No lugar de um rei, esse império é controlado pelo que chamo de corporatocracia, um grupo de homens que administra grandes empresas. Através dessas empresas controlam o governo dos EUA e muitos outros no mundo. Não importa se o presidente [dos EUA] é republicano ou democrata: é a corporatocracia que está no poder.
Folha - Como esse poder é exercido?
Perkins - 
As pessoas que ocupam o topo do governo dos EUA são egressas de corporações, até o presidente. Os assassinos econômicos oferecem enormes empréstimos do Banco Mundial e de outras organizações a governos estrangeiros, que em seguida são pagos a nossas próprias empresas, como a Halliburton, para construir projetos de infra-estrutura. Depois, os assassinos econômicos voltam aos países e dizem que, já que não têm dinheiro para pagar suas dívidas, esses governos terão que nos vender petróleo barato, votar conosco na ONU ou enviar tropas para alguma missão dos EUA no mundo.
Folha - Como o sr. entrou nisso?
Perkins - 
Fui recrutado quando ainda estava na faculdade pela Agência de Segurança Nacional, que me submeteu a uma série de testes e concluiu que eu daria um ótimo assassino econômico. Fui treinado por essa mulher notável que descrevo em detalhes no livro, Claudine, que conhecia minhas fraquezas e era muito inteligente e sedutora. Ela me disse que era um negócio sujo e que no momento em que eu entrasse eu não poderia sair. Mas era jovem e pensei que poderia ser a exceção. Senti culpa nos dez anos em que fui assassino econômico. Foi a culpa que me fez deixar o trabalho.
Folha - Por que o sr. demorou 30 anos para contar essa história?
Perkins - 
Comecei algumas vezes a escrever este livro e toda vez vinham me ameaçar e me subornar. Numa das vezes recebi US$ 500 mil. Comecei a trabalhar com populações nativas na Amazônia e nos Andes e muito do dinheiro que recebi como suborno foi usado para ajudar essas pessoas. Até que aconteceu o 11 de Setembro, e percebi que tinha que escrever o livro. Os americanos não entendem porque tanta gente no mundo tem medo de nós e nos odeia. Eu tinha que explicar. É importante tentar entender os sentimentos das pessoas no resto do mundo. Isso não quer dizer que eu tenha a pretensão de saber o que se passa nas cabeças dos assassinos ou que eu esteja tentando justificar assassinato em massa.
Folha - Em seu livro a Amazônia ocupa lugar de destaque, como alvo da cobiça dos EUA.
Perkins - 
Não há dúvida de que os EUA estão em processo de roubar a Amazônia. No Equador e na Colômbia, países que conheço bem, nossas empresas petrolíferas entram e trabalham com grupos missionários para mover populações nativas, instalar equipamentos de prospecção e construir estradas e negociar com gente corrupta do governo para destruir áreas enormes da Amazônia.
Folha - Porque esse sistema não funcionou no Iraque?
Perkins - 
Tentamos convencer Saddam Hussein a aceitar o mesmo acordo que conseguimos com a Arábia Saudita nos anos 70 [para ter controle sobre seu petróleo]. Ele não aceitou. Mandamos chacais para assassiná-lo, mas eles não conseguiram, porque Saddam tinha uma segurança muito boa e muitos sósias. Como os assassinos econômicos e os chacais fracassaram, tivemos que mandar o Exército [em 1991 e 2003]. Se Saddam tivesse aceitado o mesmo tipo de acordo que fizemos com os sauditas, ele ainda estaria no poder.

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