Kathryn Bigelow fez o mais competente filme sobre a mais incompetente caçada humana de todas as histórias. A hora mais escura conta as trapalhadas da CIA, caçando Osama Bin Laden, durante 10 anos, até a execução do maior inimigo personalizado do Império Americano.
Flávio Braga
Flávio Braga
A agência custa bilhões de dólares ao contribuinte americano e quando se viu pressionada a sair na embromação da Guerra Fria, pelos ataques de 11 de setembro, veio á luz sua incompetência. Foi preciso apelar para o velho método da delegacia da esquina, a tortura. Até para exercer as velhas práticas da Inquisição, a CIA se mostrou imprestável. A obsessão de uma funcionária acaba triunfando após longos e terríveis anos.
O filme é brilhante, entra imediatamente para a lista dos melhores filmes de guerra de todos os tempos. Documenta a radical evolução que a arte da guerra tomou com o 11 de setembro. Desde a Antiguidade, quando o Império romano dominou o mundo conhecido com o uso apropriado de lanças e escudos e a formação quadrangular, as formas de combate se sucedem. As grandes batalhas, com hora marcada e milhares de homens avançando para o confronto, frente a frente, foram substituídas por atiradores deitados e esses pelos bombardeios aéreos. Hoje, afora algum absurdo histórico, é improvável que dois países poderosos partam para um confronto direto. A idéia que dominou a passagem no milênio era a de que a estabilidade militar do Ocidente era inatacável. Mas quando os americanos financiaram os Talibãs contra os russos, nos anos 80, deram um tiro no pé. O 11/09 apenas deixou claro que a sociedade contemporânea estava tão fragmentada que os inimigos podiam explodir a casa dos patrões. Foi como se os bárbaros botassem fogo no Coliseu.
Tudo isso está no filme, nos diálogos entre os funcionários da CIA, num assessor de Obama, dizendo para um chefe de operações que queria invadir a casa suspeita no Paquistão: “A última vez que fomos na conversa de vocês, não encontramos armas de destruição em massa…” Referia-se à desastrada invasão do Iraque.
Li comentários do Slavoj Zizek sobre o filme defender a normalização da tortura, mas não vejo a questão assim. Enquanto houver serviço secreto e Impérios haverá tortura, e no filme os torturadores são mostrados não como malvados, mas estúpidos, porque sua ação não resulta em nada imediato. Entendo até o protesto do ponto de vista institucional, mas não é real.
Sai do cinema pensando em que companhia colocar Kathryn Bigelow e lembrei de Gillo Pontecorvo e de Francesco Rossi. Ela não é movida por paixão da mesma grandeza, mas seu resultado é excepcional.
Flávio Braga é escritor
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