As escolas de educação básica, sejam públicas ou privadas, enfrentam desde sempre uma série de problemas para garantir sua efetividade, e mais do que isso, sua própria existência. Uma das dificuldades mais recentes, e de difícil solução, tem sido o problema do adoecimento e da deserção dos professores da escola pública brasileira. Para o historiador Danilo Alexandre Ferreira de Camargo, tal fenômeno acontece em função do cotidiano escolar ser insuportável para a maioria dos profissionais da educação.
Igor Truz
Igor Truz
Estudo apresenta reflexão alternativa sobre relação dos professores com a escola
Em sua dissertação de mestrado, O abolicionismo escolar: reflexões a partir do adoecimento e da deserção dos professores, desenvolvida na Faculdade de Educação, e orientada pelo professor Julio Roberto Groppa Aquino, o historiador procura fugir do lugar comum, e apresenta uma reflexão alternativa sobre a problemática relação dos professores com a escola: o abolicionismo escolar.
Partindo do conceito de governamentalidade, produzido pelo filósofo francês Michel Foucault (1926–1984), o pesquisador acredita que o adoecimento dos professores e sua posterior deserção profissional ocorrem devido a forma particular de “condução das condutas” no interior da instituição escolar. Isso naturaliza a burocratização da infância e produz formas de vida prontas para serem geridas pelos comandos políticos do Estado, de modo a potencializar as forças produtivas da população. Dessa forma, os problemas da realidade escolar deveriam ser entendidos como resistência política à ordem estatal e não apenas como patologias ou desvios morais dos educandos e dos professores.
Abolicionismo Escolar: um tema inimaginável
Baseado na pesquisa, Camargo propõe a reflexão sobre o que ele chama de “abolicionismo escolar”: o questionamento da existência da escola enquanto instituição insubstituível.“Nossa sociedade percebe o ensino escolarizado como algo absolutamente natural e indispensável, apesar do mesmo existir da forma que conhecemos hoje somente a partir do século XIX. Deveríamos aprender a questionar não os problemas da escola, mas a própria existência dela como um grave problema político.”
Segundo o estudo, existe em nossas sociedades escolarizadas uma barreira discursiva que silencia qualquer contestação da estrutura escolar como hoje conhecemos. Isso porque estamos presos a este conceito de educação como única maneira de conseguirmos viver em sociedade.
O historiador garante que nenhuma plataforma política, de qualquer orientação ideológica, consegue recusar, nem sequer discutir a instituição, e, menos ainda, cogitar a possibilidade do abolicionismo escolar como possível solução para muitos dos nossos impasses sociais.
“A pesquisa não pretende com esta reflexão propor uma nova plataforma educacional, mas constatar o triunfo do método escolar de institucionalização da vida nas sociedades ocidentais contemporâneas, assim como os limites políticos do nosso discurso”, diz. “A questão central, portanto, não é o que colocar no lugar da escola, mas nossa própria incapacidade de sequer conseguir imaginar um modelo educacional que substitua esta instituição”, completa.
Camargo conta que, durante a pesquisa, fez uma experiência: digitou nos principais sites de busca da internet as palavras-chave ‘abolicionismo escolar’. “Não obtive nenhum resultado sequer. Isso dá uma ideia sobre a resistência da sociedade quanto ao tema.”
“A solução para os problemas da escola sempre segue no sentido de aperfeiçoamento e ampliação da instituição, e a sociedade não consegue visualizar, de fato, o grau de insuportabilidade de sua estrutura. Não existe nenhum tipo de crise. As tentativas de reparos significam um triunfar-se perpétuo da instituição escolar. Talvez seja a hora de começarmos a duvidar da naturalidade da escola e de sua correspondente ordem social”, conclui Camargo.
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