Itália segue em busca de um governo
Pier Luigi Bersani, líder do Partido Democrático (centro-esquerda), reconheceu que o país “enfrenta uma situação dramática”. O Partido Democrático ganhou as eleições com um número superior de votos na Câmara de Deputados, mas no Senado, os números não fecham. A diferença com a direita é demasiado estreita para garantir um governo com estabilidade. “Conseguimos mais votos, mas não ganhamos”, admitiu Bersani. O artigo é de Eduardo Febbro, direto de Roma.
Eduardo Febbro - Direto de Roma
Roma - A Itália segue buscando nas trevas deixadas pelas urnas uma arquitetura política para formar um governo. A ingovernabilidade da Itália é uma ampulheta que começou a escoar o tempo assim que se conheceram os primeiros resultados. Pier Luigi Bersani, líder do Partido Democrático (centro-esquerda), reconheceu que o país “enfrenta uma situação dramática”. O Partido Democrático ganhou as eleições com um número superior de votos na Câmara de Deputados, mas no Senado, os números não fecham. A diferença com a direita é demasiado estreita para garantir um governo com estabilidade.
“Conseguimos mais votos, mas não ganhamos”, admitiu Bersani. “Todos olham hoje para os ‘grillini’”, ou seja, os 162 parlamentares eleitos na lista do movimento anti-sistema Cinco Estrelas, do comediante genovês Beppe Grillo – 109 deputados e 54 senadores. No entanto, o líder deste grupo político esclareceu que o “M5S não daria um voto de confiança ao PD nem a nenhum outro partido”. Beppe Grillo, por sua vez, disse que Cinco Estrelas “votará as leis que estão de acordo com seu programa, seja quem forem seus proponentes”.
Estas declarações deixaram no ar um clima de grande incerteza quanto à possibilidade de que a centro-esquerda possa formar um governo. Nada parece agora como mais distante e muitos apostam em uma solução “à grega”. Do mesmo modo que o ano passado, quando os gregos tiveram que votar duas vezes seguidas devido à ausência de uma maioria clara, a Itália pode seguir o mesmo caminho.
O Partido Democrático está cercado por um esquema muito nocivo. A direita do partido Povo da Liberdade, de Silvio Berlusconi, espera poder tirar proveito desse impasse. Nunca como nestas eleições legislativas italianas a mentira e a instrumentalização do engano através dos meios de comunicação ficaram tão descaradamente explícitas. A socialdemocracia do Partido Democrático busca seus aliados para formar um governo enquanto Berlusconi esfrega as mãos. O velho lobo astuto ficou a apenas 0,35% da centro-esquerda, ou seja, a 130 mil votos.
A Itália voltou a depositar sua confiança em um personagem perseguida por meia dúzia de tribunais que o acusam de uma gama escandalosa de delitos que vão desde a corrupção até a prostituição de menores. As urnas, porém, voltaram a içá-lo ao patamar da credibilidade em um país com profunda cultura política e sindical. Mas a mentira é pior que a fé: durante a campanha, Berlusconi prometeu o que é decentemente impossível de prometer: em primeiro lugar o não pagamento de impostos e a devolução “em dinheiro ou cheque” das taxas fiscais estabelecidas pelo atual presidente do Conselho, o economista Mario Monti.
O mais curioso do caso Berlusconi está em que o “Cavalieri” se instala na vida política do país logo depois do deserto que se seguiu à operação Mãos Limpas levada a cabo pela justiça nos anos 90. Mãos Limpas decapitou o sistema político enviando à prisão um grande número de políticos e parlamentares implicados em práticas corruptas. Desde então, Berlusconi se apoderou da direita e não há revelação, julgamento, condenação ou escândalo que o baixe de seu pedestal. Não deve haver na Europa um charlatão e um farsante mais sublime que Berlusconi. É capaz de dizer qualquer coisa para conquistar um voto. Essa capacidade, a timidez da socialdemocracia italiana e o terremoto provocado pelos “grillini” de Beppe Grillo explicam que a centro-esquerda tenha que fazer malabarismos para formar um gabinete. Os “grillini” detém a solução do problema, ou seja, um governo sólido ou novas eleições.
Marta Grande, uma jovem e bela deputada recém eleita nas listas de Cinco Estrelas, disse à Carta Maior: “Não temos nenhum problema em votar a favor de ideias justas como, por exemplo, baixar o custo da ação política, a diminuição do salário dos parlamentares ou, mais ainda, por fim à corrida armamentista”. Os “grillini” são um caso muito particular. Seu líder, Beppe Grillo, não pode ir ao Parlamento. Condenado por homicídio em função de seu envolvimento em um acidente automobilístico que custou a vida de três pessoas, Beppe Grillo não pode representar nenhum partido nas instituições.
Os partidos eleitos em suas listas contam com uma liberdade quase total. Jovens, surgidos em sua maioria da sociedade civil, os “grillini” são uma incógnita. Os líderes da centro-esquerda contam com o apoio destes parlamentares recém-eleitos.A ideia é que haja na Itália um governo com maioria na Câmara e minoria no Senado, onde se beneficiaria com o apoio dos “grillini”.
Outra opção seria a sonhada pelo centro de Mario Monti: “uma grande coalizão” baseada em uma aliança entre o Partido Democrático, o Povo da Liberdade de Berlusconi e o centro de Monti. Beppe Grillo qualificou essa hipótese como um grande “conchavo entre politiqueiros”. Talvez esses três partidos se coloquem em acordo segundo a filosofia do próprio Berlusconi: “A Itália precisa ser governada”. Se isso ocorrer, os “grillini” estarão provando diante da sociedade que a única alternativa que resta ao país é algo similar ao que se dizia na Argentina na crise dos anos 2.000: “que se vayan todos”.
Tradução: Katarina Peixoto
“Conseguimos mais votos, mas não ganhamos”, admitiu Bersani. “Todos olham hoje para os ‘grillini’”, ou seja, os 162 parlamentares eleitos na lista do movimento anti-sistema Cinco Estrelas, do comediante genovês Beppe Grillo – 109 deputados e 54 senadores. No entanto, o líder deste grupo político esclareceu que o “M5S não daria um voto de confiança ao PD nem a nenhum outro partido”. Beppe Grillo, por sua vez, disse que Cinco Estrelas “votará as leis que estão de acordo com seu programa, seja quem forem seus proponentes”.
Estas declarações deixaram no ar um clima de grande incerteza quanto à possibilidade de que a centro-esquerda possa formar um governo. Nada parece agora como mais distante e muitos apostam em uma solução “à grega”. Do mesmo modo que o ano passado, quando os gregos tiveram que votar duas vezes seguidas devido à ausência de uma maioria clara, a Itália pode seguir o mesmo caminho.
O Partido Democrático está cercado por um esquema muito nocivo. A direita do partido Povo da Liberdade, de Silvio Berlusconi, espera poder tirar proveito desse impasse. Nunca como nestas eleições legislativas italianas a mentira e a instrumentalização do engano através dos meios de comunicação ficaram tão descaradamente explícitas. A socialdemocracia do Partido Democrático busca seus aliados para formar um governo enquanto Berlusconi esfrega as mãos. O velho lobo astuto ficou a apenas 0,35% da centro-esquerda, ou seja, a 130 mil votos.
A Itália voltou a depositar sua confiança em um personagem perseguida por meia dúzia de tribunais que o acusam de uma gama escandalosa de delitos que vão desde a corrupção até a prostituição de menores. As urnas, porém, voltaram a içá-lo ao patamar da credibilidade em um país com profunda cultura política e sindical. Mas a mentira é pior que a fé: durante a campanha, Berlusconi prometeu o que é decentemente impossível de prometer: em primeiro lugar o não pagamento de impostos e a devolução “em dinheiro ou cheque” das taxas fiscais estabelecidas pelo atual presidente do Conselho, o economista Mario Monti.
O mais curioso do caso Berlusconi está em que o “Cavalieri” se instala na vida política do país logo depois do deserto que se seguiu à operação Mãos Limpas levada a cabo pela justiça nos anos 90. Mãos Limpas decapitou o sistema político enviando à prisão um grande número de políticos e parlamentares implicados em práticas corruptas. Desde então, Berlusconi se apoderou da direita e não há revelação, julgamento, condenação ou escândalo que o baixe de seu pedestal. Não deve haver na Europa um charlatão e um farsante mais sublime que Berlusconi. É capaz de dizer qualquer coisa para conquistar um voto. Essa capacidade, a timidez da socialdemocracia italiana e o terremoto provocado pelos “grillini” de Beppe Grillo explicam que a centro-esquerda tenha que fazer malabarismos para formar um gabinete. Os “grillini” detém a solução do problema, ou seja, um governo sólido ou novas eleições.
Marta Grande, uma jovem e bela deputada recém eleita nas listas de Cinco Estrelas, disse à Carta Maior: “Não temos nenhum problema em votar a favor de ideias justas como, por exemplo, baixar o custo da ação política, a diminuição do salário dos parlamentares ou, mais ainda, por fim à corrida armamentista”. Os “grillini” são um caso muito particular. Seu líder, Beppe Grillo, não pode ir ao Parlamento. Condenado por homicídio em função de seu envolvimento em um acidente automobilístico que custou a vida de três pessoas, Beppe Grillo não pode representar nenhum partido nas instituições.
Os partidos eleitos em suas listas contam com uma liberdade quase total. Jovens, surgidos em sua maioria da sociedade civil, os “grillini” são uma incógnita. Os líderes da centro-esquerda contam com o apoio destes parlamentares recém-eleitos.A ideia é que haja na Itália um governo com maioria na Câmara e minoria no Senado, onde se beneficiaria com o apoio dos “grillini”.
Outra opção seria a sonhada pelo centro de Mario Monti: “uma grande coalizão” baseada em uma aliança entre o Partido Democrático, o Povo da Liberdade de Berlusconi e o centro de Monti. Beppe Grillo qualificou essa hipótese como um grande “conchavo entre politiqueiros”. Talvez esses três partidos se coloquem em acordo segundo a filosofia do próprio Berlusconi: “A Itália precisa ser governada”. Se isso ocorrer, os “grillini” estarão provando diante da sociedade que a única alternativa que resta ao país é algo similar ao que se dizia na Argentina na crise dos anos 2.000: “que se vayan todos”.
Tradução: Katarina Peixoto
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