sábado, 20 de abril de 2013

Economia mundial ainda enfrenta campo minado


Economia mundial ainda enfrenta campo minado

À 'Carta Maior", diretor de Risco País da Unidade de Inteligência da 'The Economist', John Bowler, fala sobre o novo panorama mundial e as estratégias em jogo para sair da atual crise. Segundo Bowler, o mundo busca retornar a um crescimento sustentável em meio a um campo minado por uma estrutura financeira que pode voltar a explodir em caso de um passo em falso.

Londres - A economia mundial segue sem sair do marasmo que produziu o estouro financeiro de 2008. Se em 2010-2011 houve uma recuperação global visível ainda que desparelha, em 2012 e este ano, os sinais são mais débeis e contraditórios. Pior ainda, o mundo busca retornar a um crescimento sustentável em meio a um campo minado por uma estrutura financeira que pode voltar a explodir em caso de um passo em falso. A Carta Maiorconversou com o diretor de Risco País da Unidade de Inteligência do semanário britânico 'The Economist', John Bowler, sobre o novo panorama mundial e as estratégias diversas em jogo para sair da atual crise. 

Carta Maior - Os Estados Unidos, a União Europeia, o Japão e a China, que seguem formando a maior parte do PIB global, seguiram diferentes estratégias na atual crise. Como podem ser comparados os resultados obtidos por cada um? 
John Bowler - Os Estados Unidos e o Japão adotaram medidas similares, sobretudo com o novo governo japonês de Abe. Esta estratégia de estímulo deu resultado nos Estados Unidos em nível industrial e no mercado habitacional. No caso do Japão, é um pouco prematuro para dizer se terá êxito uma estratégia que busca terminar com o fantasma da deflação que afetou a economia japonesa por tanto tempo. No caso da zona do euro, baixamos nossa estimativa de crescimento para este ano: calculamos uma contração de 0,7%. Já na China, há uma mudança na composição do crescimento econômico, mais baseado no consumo e menos no investimento. Acreditamos que o crescimento será superior a 8%, mas está claro que a China não terá os níveis de crescimento de dois dígitos de outras épocas. 

CM - Está claro que as estratégias de maior estímulo estão dando resultado em comparação com o Plano de Austeridade praticado na zona do euro. 
JB - A economia mundial está sofrendo um problema de demanda, portanto as estratégias de estímulo têm um efeito positivo em nível global. Os Estados Unidos têm uma clara vantagem para aplicar essa estratégia porque possuem uma moeda de reserva em nível mundial, o que permite ter uma política monetária e fiscal muito mais relaxada desde o estouro de 2008 com grandes déficits fiscais que não afetam seu financiamento nos mercados. No Japão, o forte relaxamento da política monetária com a ideia de duplicar a base monetária para 2015, a rápida desvalorização do Yen com o conseguinte estímulo das exportações e a expansão fiscal apesar da alta dívida do país tem uma resposta positiva no momento, mas a pergunta e se essa estratégia será bem sucedida no longo prazo. 

CM - Se ao Japão e aos Estados Unidos somarmos a China, que cresce mais com base em seu consumo, temos um polo de demanda global. O problema é que a zona do euro está atuando como um freio a esse problema de demanda global que você mencionou. 
JB - Creio que há um reconhecimento por parte do centro da zona do euro de que é preciso uma mudança, mas a Alemanha insiste em que primeiro a periferia tem que colocar suas contas em ordem. A Alemanha é muito reticente em definir essa estratégia (de colocar as contas em dia) como um objetivo de longo prazo e que, no curto prazo, seria preciso uma estratégia diferente porque a austeridade fiscal está provocando mais problemas do que soluções. Mas há um problema político muito difícil porque a Alemanha tem que prestar contas ao seu eleitorado e há muita oposição a este financiamento da periferia. 

CM - Isso pode mudar com as eleições de setembro na Alemanha? 
JB - É possível. Tudo depende do resultado. Antes disso não vai acontecer nada.

CM - Também pode depender de como seja afetada a economia alemã. No último trimestre de 2012, ela se contraiu, mas agora parece se recuperar. Se a Alemanha acabar afetada pela crise, isso poderia motivar uma mudança. 
JB - A Alemanha é uma economia muito dependente de suas exportações e da demanda externa, portanto poderia haver uma mudança no caso desta via ser afetada negativamente. Em nível monetário não pode fazer muito mais porque as taxas de juro estão em um mínimo histórico, mas poderia ter uma política fiscal mais expansiva. Estão a ponto de ter um equilíbrio fiscal, de modo que teriam espaço para isso, mas também há muita preocupação com a exposição que tem por sua contribuição aos distintos pacotes de resgate. 

CM - A crise de Chipre poderia apontar para um tipo diferente de resolução na qual os credores teriam que aceitar fortes cortes. Há um novo modelo para os resgates de países, onde os contribuintes não sejam os únicos a pagar pelo estrago? 
JB - Chipre é um caso especial pelo tamanho de seu setor bancário em relação ao resto da economia. Mas é uma economia muito pequena. Se a mesma coisa ocorresse na Espanha ou na Itália e as pessoas temessem cortes drásticos em seus depósitos haveria um estouro que poderia marcar o fim do euro. E se é certo que a Alemanha simpatiza com a ideia de que os credores devem assumir parte do problema, há muito medo de voltar à situação de meados do ano passado quando a possibilidade de uma desintegração do euro estava no ar. Os países centrais são relutantes em construir uma União Bancária com um sistema de regulação compartilhado e um sistema de seguro para os depósitos. Preferem pensar nesse tema uma vez que as economias tenham se recuperado. No momento, haverá uma política muito cautelosa, passo a passo, na qual se busca que a confiança no caminho adotado se traduza em crescimento. O medo é adotar mudanças que fujam do controle e que tudo escape entre as mãos. 

CM - Em meio a todo esse maremoto financeiro, está a proposta do BRICS para um banco de desenvolvimento. Vê alguma possibilidade concreta disso ocorrer? 
JB - Não sei se é viável. Entendo as razões pelas quais os países emergentes estão desiludidos com o FMI, pois estão muito pouco representados ali e hoje, ao contrário do passado, os resgates em debate são dos países desenvolvidos. Mas hoje em dia o próprio conceito do BRICS é menos sólido do que quando a ideia foi lançada há alguns anos, antes da crise financeira, e se esperava um crescimento sustentável de todos os seus membros. Com a Rússia isso não ocorreu; o país não se recuperou da crise de 2008. No Brasil está ocorrendo o mesmo, ainda que a gestão econômica seja melhor que a da Rússia. 

CM - Como avalia a situação da América Latina em geral? 
JB - O grande problema da América Latina é a dependência em relação às commodities. E com os “booms” esta dependência se aprofunda. As mudanças na China podem afetar este “boom” nos preços das commodities. A China seguirá sendo um ator muito importante neste mercado, mas é possível que os preços se estabilizem ou caiam um pouco. Mas a região em conjunto é um lugar de muito menos risco do que há 15 anos. A dívida externa não é tão alta, a balança de pagamento está sob controle e há um nível recorde de reservas. 

Tradução: Marco Aurélio Weissheimer

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