As 100 empresas mais importantes do Reino Unido tem mais de 8 mil subsidiárias em paraísos fiscais. Os bancos são os usuários mais prolíficos destes circuitos da evasão fiscal global, mas ao seu lado operam também multinacionais manufatureiras, telefônicas, energéticas, de turismo, supermercados e bebidas. Segundo o informe da ONG ActionAid, essas empresas tem umas 311 subsidiárias no Brasil e uma forte presença em todo o mundo em desenvolvimento
Marcelo Justo
Marcelo Justo
“Este modelo de intercâmbio automático se baseia em um mecanismo adota pelos Estados Unidos e o problema é que ainda não se sabe bem a sua abrangência. A mecânica dos paraísos fiscais é tão complexa que pode haver buracos negros pelos quais escorrem a maioria dos grandes sonegadores, incluindo as multinacionais e os bancos”, disse Jordan à Carta Maior.
As contradições britânicas
As 100 empresas do FTSE tem umas 1685 subsidiárias em territórios dependentes da coroa britânica e conhecidos paraísos fiscais como Jersey, Ilhas Virgens britânicas, Ilhas Caiman, Bermuda e Gibraltar. Nas Bahamas, há 115 mil empresas para os 307 mil habitantes das ilhas. Nas Ilhas Jersey, a proporção é igualmente exorbitante: 33 mil empresas para 91 mil habitantes. O próprio presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, exemplificou o problema em mais de uma ocasião com a Ugland House, um edifício situado em outra dependência britânica, as Ilhas Caiman, que abriga mais de 18 mil companhias.
A mecânica da evasão e sonegação fiscal varia de acordo com o sujeito – indivíduo, banco, multinacional – mas o objetivo é o mesmo. No caso das corporações, as subsidiárias em paraísos fiscais servem para distorcer a estrutura de preços internos das empresas, um mecanismo de longo alcance já que, segundo a OCDE, 60% do comércio internacional ocorre entre multinacionais. “Suponhamos que uma empresa multinacional opera em um país X com um imposto corporativo de 30%. A empresa pagará menos impostos quanto menos lucros tiver. De maneira que contratará a preços inflacionados serviços legais ou financeiros ou de promoção de suas próprias subsidiárias instaladas em distintos paraísos fiscais onde pagam muito menos impostos”, explicou à Carta Maior John Christensen, diretor de Tax Justice International.
Este mecanismo tem um forte impacto nos países em desenvolvimento. As FTSE 100 tem 311 subsidiárias no Brasil que vão do campo da mineração e do petróleo ao de alimentos, artigos para o lar e seguros. “Isso não prova que necessariamente haja evasão fiscal. Mas sim que estas empresas têm uma estrutura internacional tal que podem com toda facilidade mover seus lucros por meio dos paraísos fiscais praticando uma dupla evasão de impostos, tanto no Reino Unido como no Brasil”, explica Jordan.
O realismo mágico dos paraísos
Empresas internacionais de serviços como Google ou Starbucks se viram obrigadas a reconhecer que praticamente não pagavam impostos no Reino unido. O especialista em economia comparada da Universidade de Cambridge, o chileno José Gabriel Palma, explicou à Carta Maior o mecanismo usado.
“Starbucks não paga impostos sobre seus rendimentos porque, segundo dizem, “não tem lucros contábeis”. E não tem porque suas empresas locais, de propriedade e administração de Starbucks, pagam uma empresa de Starbucks fora do país uma quantidade sideral pelo direito de usar o nome Starbucks. Ou seja, Starbucks paga a Starbucks pelo uso do nome Starbucks. E na legislação tributária neoliberal desse país, isso é perfeitamente legal. É realismo mágico contábil. A meu juízo, Gabriel Garcia Márquez deveria ter sido consultor de empresas de contabilidade”, indicou Palma.
No passado, a opacidade financeira era complementar à opacidade midiática: ninguém falava do tema. A crise econômica colocou o foco sobre a estrutura fiscal dos países. Na cúpula de 22 de maio da União Europeia, a evasão de impostos será um dos eixos da agenda. Algo similar ocorrerá com a cúpula do G8 em junho e com a do G20 em setembro.
Assim como a Tax Justice International, a Action Aid assinala que mudar as coisas não é complicado, mas requer vontade política. “Tudo o que se necessita é de transparência. Deve haver um registro público dos paraísos fiscais para saber quem são os donos reais das empresas registradas. As multinacionais também deveriam publicar suas contas em cada lugar onde operam porque isso permitiria detectar facilmente a evasão fiscal”, indicou Jordan à Carta Maior.
Tradução: Marco Aurélio Weissheimer
Nenhum comentário:
Postar um comentário