O governo argentino com um olho no Brasil
O kirchnerismo quase não fala em público sobre as manifestações populares no Brasil, mas privadamente assessores tomam a questão seriamente. “Não queremos que se instale nenhum tipo de instabilidade regional”, disse um deles. “Os conservadores argentinos que elogiavam Lula e Dilma para criticar Néstor e Cristina faziam este jogo para nos castigar, mas já deixaram de fazê-lo, porque sua opção não é nem Lula nem Dilma, nem Néstor nem Cristina, mas as opções que estão à direita”, resumiu outro. Por Martín Granovsky, do Página 12
Por Martín Granovsky
Buenos Aires – Em seu discurso no estádio do ‘Argentinos Juniors’, na periferia de Buenos Aires, no sábado (29), a presidenta argentina Cristina Fernández de Kirchner ensaiou uma linha argumental que lhe foi útil em 2011. Em tom de campanha presidencial, disse que não é conveniente mudar o rumo em meio a um mundo instável. Soou como um chamado a redobrar o apoio a sua gestão quando ainda restam dois anos de mandato. Quando falou dos problemas, não apenas se referiu à crise dos países desenvolvidos. Também introduziu uma palavra associada a esses problemas: “regionais”. Não disse “Brasil”, mas para bom entendedor, poucas palavras bastam.
Rebotes
O kirchnerismo quase não fala em público sobre o que acontece no Brasil. O deputado do Frente para la Victoria, Eric Calcagno, elogiou o governo brasileiro por sua decisão de escutar as demandas sociais, dar uma resposta política e canalizá-las institucionalmente. Privadamente, assessores e dirigentes tomaram a questão do Brasil seriamente. Não caíram em uma visão futebolística no estilo de “chegou a vez deles” ou “tão bons não eram”. Ao contrário. Já começaram tentando reunir dados e relevar tendências de comportamento. “Não queremos que se instale nenhum tipo de instabilidade regional”, disse um assessor que pediu sigilo de seu nome. “Os conservadores argentinos que elogiavam Lula e Dilma para criticar Néstor e Cristina faziam este jogo para nos castigar, mas já deixaram de fazê-lo, porque sua opção não é nem Lula nem Dilma, nem Néstor nem Cristina, mas as opções que estão à direita”, resumiu outro.
Marco
Diana Tussie, diretora da área internacional da Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais, pôs um marco de análise que parece útil. Disse que as turbulências no Brasil mostram “a crise do Estado oligárquico e o questionamento ao apartheid social”para cuja liquidação ainda falta muito, mesmo com os avanços desde que Lula assumiu, no dia 1ª de janeiro de 2003.
Carapintada
Uma das análises mais interessantes sobre o Brasil, partiu do próprio Partido dos Trabalhadores, feita por Lindbergh Farias, senador pelo Rio de Janeiro e pré-candidato a governador para 2014. Farias, de 43 anos, tem uma história pessoal relacionada com os movimentos de protesto na rua. Foi presidente da União Nacional de Estudantes em 1992 e se transformou em um dos líderes dos chamados “cara-pintadas”. Diferente dos argentinos, não eram integralistas militares que se rebelavam, camuflados, contra a ordem constitucional, mas grupos de jovens que foram protagonistas nas manifestações a favor do juízo político ao então presidente Fernando Collor de Mello. Esse momento marcou, também, um dos grandes saltos massivos do PT, cabeça daquela campanha. Em uma longa entrevista concedida à web da Folha, Farias disse que o tema do transporte não é qualquer tema. “No Rio ou São Paulo as pessoas passam três ou quatro horas por dia presas em um transporte público que já é caro”, disse. O paradoxo descrito por Farias é que, nos últimos dez anos, houve grandes avanços, como 40 milhões de pessoas que ascenderam socialmente e muitos filhos de trabalhadores que, inclusive, chegaram à universidade, mas que “a vida nas grandes metrópoles é um inferno”. Os que protestam são jovens irritados, parcela da periferia da chamada classe média. E se concentram em parte na Copa do Mundo porque a veem distanciada das necessidades cotidianas.
Agenda
O prognóstico de Farias é que os movimentos de massas não enfraquecerão daqui até a Copa de 2014, mas o contrário. E como pouco depois da Copa chegarão as eleições presidenciais de outubro, onde até agora o PT projeta a reeleição de Dilma Rousseff, “as respostas dos governos deveriam apontar a uma agenda que discuta transporte, segurança pública, saúde e educação”. A vantagem, segundo o senador do PT, é que os movimentos não estão dirigidos especialmente contra Dilma e que as reivindicações questionavam mais os governos estaduais que o federal. A desvantagem é que, em parte, os movimentos são “contra tudo”. Segundo Farias, “se ficarmos com a agenda dos últimos dez anos, vamos ser superados”. A agenda dos dez anos é a grande mudança do Brasil. Para a agenda nova há um exemplo: “Entre as obras para a Copa estará o ônibus de trânsito rápido do Aeroporto de Galeão à Barra da Tijuca. Mas é para os turistas. Ou seja: há defasagem com as necessidades das pessoas comuns”. E para o ex-dirigente estudantil, o próprio PT ficou defasado.
Cifras
O leitor Henrique Júdice Magalhães, consultor do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, compartilhou por e-mail uma análise na qual sugere pesar melhor alguns dados. Andar em transporte coletivo no Brasil “sai em média três reais, aproximadamente oito pesos no câmbio oficial da Argentina”. Complementa: “Me lembro de que quando Macri quis fixar a passagem de metrô a 3,50 pesos, muita gente pôs o grito no céu, e com razão. É disparatado que os brasileiros saiam às ruas para não pagar oito pesos por serviços que são, talvez com exceção do Rio de Janeiro, bastante piores que o de Buenos Aires em termos de conforto, horários, etc.? Parece-me que não, sobretudo considerando outro dado: a renda dos trabalhadores. No Brasil, o salário mínimo é de 678 reais (1800 pesos). Como existe uma lei que permite aos estados fixar salários mínimos para as categorias que não os tenham estabelecido em convênio coletivo (o salário de convênio, entretanto, pode ser inferior aos fixados pelos Estados, ainda que não ao salário mínimo nacional), pode-se considerar que é um pouquinho maior em São Paulo (755 reais), Rio Grande do Sul (770) e Santa Catarina (765), algo maior no Rio de Janeiro (802) e bastante maior no Paraná (915 reais), que são os Estados que exercem esta prerrogativa. Assim temos que, se o salário mínimo do Brasil mal supera, com exceção do Paraná, a metade do argentino, e se a passagem de ônibus aqui custa 4,5 vezes mais que na Argentina, (estou considerando a tarifa de Buenos Aires como 1,60, que é o que se paga com o cartão SUBE), cada viagem de ônibus sai 8 ou 9 vezes mais cara para um brasileiro que receba o salário mínimo do que para um argentino em igual situação. Levando em conta que no Brasil os subsídios familiares são muito menores que na Argentina e muito menos gente os recebe, em nível de orçamento familiar a situação no Brasil se torna ainda pior”. Outro ponto que o leitor propõe discutir é que “no Brasil as linhas oficiais de pobreza e indigência não estão vinculadas com a cesta básica, como na Argentina: são fixadas pelo governo por decreto, de modo totalmente arbitrário, e são muito baixas: 140 reais (372 pesos) por pessoa para pobreza, 70 reais (186 pesos) para indigência. Nem o Indec (Instituo Nacional de Estatística e Censo. N. do T.) sob intervenção chegou a tal ponto, mas aqui muito pouca gente questiona isso. Quando o governo brasileiro diz que tiraram da indigência 40 milhões de pessoas, está dizendo, na verdade, que fez (com o Bolsa-família) que o ingresso destas pessoas alcançasse essa linha de indigência baixíssima”.
Pesquisas
Uma pesquisa da Datafolha difundida sábado mostra que 30% dos brasileiros consideram boa ou ótima a gestão de Dilma. Na primeira semana de junho, a cifra total era de 57%. E Dilma havia alcançado antes, 65%. A queda, pois, é um grande buraco de ar e, segundo a empresa, se as eleições fossem hoje a presidenta não teria assegurado um triunfo no primeiro turno frente ao candidato de Fernando Henrique Cardoso, Aécio Neves, a verde Marina Silva ou, eventualmente, o governador de Pernambuco Eduardo Campos. Uma parte da pesquisa introduz um matiz que sempre é crucial para a análise política: a contagem daqueles que optam por uma opinião regular que, em termos eleitorais, por exemplo, muitas vezes se soma à opinião favorável. Ao perguntar sobre o desempenho presidencial frente aos protestos, 32% disse que foi ótimo ou bom, 38% o considerou regular e só 26% opinou que havia sido mal ou péssimo. Em compensação é muito alta a opinião positiva sobre o anúncio presidencial de chamar um plebiscito para a reforma política: 68% a favor. Em outra ordem, ainda que acompanhando os dados anteriores, 65% está de acordo com a realização da Copa do Mundo no Brasil.
Voto em Lista
Quando o PT fala de reforma política se refere, entre outras coisas, a eliminar o financiamento privado das campanhas e a terminar com a possibilidade de eleger candidatos com margem autônoma em relação às listas de partidos. Na Argentina, a questão das listas fechadas foi muito discutida durante anos. O debate partia, talvez, de um preconceito: que os desconhecidos haviam sido os responsáveis pelos maiores desastres. Era um preconceito porque sempre os responsáveis pelas melhores façanhas ou os piores resultados são os mais conhecidos. Não por uma questão de fama, mas porque essa fama deriva habitualmente de sua cota de poder relativamente mais importante que a de outros. No Brasil, o PT sempre opinou que a personalização das candidaturas levou à transfiguração, à debilidade das instituições e à necessidade de tecer alianças já não partidárias, mas pessoais no Parlamento e nos Estados. Por isso, uma das repostas do PT e de Dilma aos protestos foi tratar de instalar a necessidade de uma reforma política. Por essa razão, também, um dos movimentos de Dilma foi falar diante dos governadores dos Estados e dos prefeitos das capitais estaduais. Quis comprometê-los.
Constituição
O advogado Pedro Estevam Serrano costuma ser consultado pelo semanário Carta Capital sobre temas jurídicos. Perguntaram-lhe se convém uma Constituinte originária reformadora ou não. Opinou que não. Disse que “é possível realizar a reforma política submetendo suas principais questões ao voto popular direto, o que mitigaria a presença de possíveis desvios na deliberação parlamentar”. A discussão hoje, no Brasil, opõe os partidários do plebiscito aos simpatizantes do referendo, encabeçada pelo líder opositor Aécio Neves, do Partido da Socialdemocracia Brasileira (PSDB, neoliberal). A diferença elementar é que o plebiscito precede a discussão parlamentar. O referendo, ao contrário, viria depois. O plebiscito poria um marco político ao debate legislativo. O referendo só daria sua aprovação posterior ou marcaria o desacordo popular com o que houvesse sido legislado antes. “Ainda que a decisão final seja do parlamento, este não teria a ousadia de contrariar a vontade direta expressa pelo povo”, disse Serrano. Sua defensa da posição de não abrir a Constituição é que a Carta Magna vigente, de 1988, surgiu de “um grande pacto nacional que deu sustentação a nossa democracia”. Romper com a Constituição de 1988 poderia abrir a porta para que, “no futuro, maiorias arbitrárias e ocasionais passem por cima de valores e direitos fundamentais para a existência livre e civilizada”.
Reação
O governador do Rio Grande do Sul, o petista Tarso Genro, já anunciou que implementará o passe livre em Porto Alegre e nas cidades mais importantes do Estado. Também convocou o debate para discutir a reforma política não só pelos canais tradicionais, mas através das redes de Internet.
Tradução: Liborio Júnior
Rebotes
O kirchnerismo quase não fala em público sobre o que acontece no Brasil. O deputado do Frente para la Victoria, Eric Calcagno, elogiou o governo brasileiro por sua decisão de escutar as demandas sociais, dar uma resposta política e canalizá-las institucionalmente. Privadamente, assessores e dirigentes tomaram a questão do Brasil seriamente. Não caíram em uma visão futebolística no estilo de “chegou a vez deles” ou “tão bons não eram”. Ao contrário. Já começaram tentando reunir dados e relevar tendências de comportamento. “Não queremos que se instale nenhum tipo de instabilidade regional”, disse um assessor que pediu sigilo de seu nome. “Os conservadores argentinos que elogiavam Lula e Dilma para criticar Néstor e Cristina faziam este jogo para nos castigar, mas já deixaram de fazê-lo, porque sua opção não é nem Lula nem Dilma, nem Néstor nem Cristina, mas as opções que estão à direita”, resumiu outro.
Marco
Diana Tussie, diretora da área internacional da Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais, pôs um marco de análise que parece útil. Disse que as turbulências no Brasil mostram “a crise do Estado oligárquico e o questionamento ao apartheid social”para cuja liquidação ainda falta muito, mesmo com os avanços desde que Lula assumiu, no dia 1ª de janeiro de 2003.
Carapintada
Uma das análises mais interessantes sobre o Brasil, partiu do próprio Partido dos Trabalhadores, feita por Lindbergh Farias, senador pelo Rio de Janeiro e pré-candidato a governador para 2014. Farias, de 43 anos, tem uma história pessoal relacionada com os movimentos de protesto na rua. Foi presidente da União Nacional de Estudantes em 1992 e se transformou em um dos líderes dos chamados “cara-pintadas”. Diferente dos argentinos, não eram integralistas militares que se rebelavam, camuflados, contra a ordem constitucional, mas grupos de jovens que foram protagonistas nas manifestações a favor do juízo político ao então presidente Fernando Collor de Mello. Esse momento marcou, também, um dos grandes saltos massivos do PT, cabeça daquela campanha. Em uma longa entrevista concedida à web da Folha, Farias disse que o tema do transporte não é qualquer tema. “No Rio ou São Paulo as pessoas passam três ou quatro horas por dia presas em um transporte público que já é caro”, disse. O paradoxo descrito por Farias é que, nos últimos dez anos, houve grandes avanços, como 40 milhões de pessoas que ascenderam socialmente e muitos filhos de trabalhadores que, inclusive, chegaram à universidade, mas que “a vida nas grandes metrópoles é um inferno”. Os que protestam são jovens irritados, parcela da periferia da chamada classe média. E se concentram em parte na Copa do Mundo porque a veem distanciada das necessidades cotidianas.
Agenda
O prognóstico de Farias é que os movimentos de massas não enfraquecerão daqui até a Copa de 2014, mas o contrário. E como pouco depois da Copa chegarão as eleições presidenciais de outubro, onde até agora o PT projeta a reeleição de Dilma Rousseff, “as respostas dos governos deveriam apontar a uma agenda que discuta transporte, segurança pública, saúde e educação”. A vantagem, segundo o senador do PT, é que os movimentos não estão dirigidos especialmente contra Dilma e que as reivindicações questionavam mais os governos estaduais que o federal. A desvantagem é que, em parte, os movimentos são “contra tudo”. Segundo Farias, “se ficarmos com a agenda dos últimos dez anos, vamos ser superados”. A agenda dos dez anos é a grande mudança do Brasil. Para a agenda nova há um exemplo: “Entre as obras para a Copa estará o ônibus de trânsito rápido do Aeroporto de Galeão à Barra da Tijuca. Mas é para os turistas. Ou seja: há defasagem com as necessidades das pessoas comuns”. E para o ex-dirigente estudantil, o próprio PT ficou defasado.
Cifras
O leitor Henrique Júdice Magalhães, consultor do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, compartilhou por e-mail uma análise na qual sugere pesar melhor alguns dados. Andar em transporte coletivo no Brasil “sai em média três reais, aproximadamente oito pesos no câmbio oficial da Argentina”. Complementa: “Me lembro de que quando Macri quis fixar a passagem de metrô a 3,50 pesos, muita gente pôs o grito no céu, e com razão. É disparatado que os brasileiros saiam às ruas para não pagar oito pesos por serviços que são, talvez com exceção do Rio de Janeiro, bastante piores que o de Buenos Aires em termos de conforto, horários, etc.? Parece-me que não, sobretudo considerando outro dado: a renda dos trabalhadores. No Brasil, o salário mínimo é de 678 reais (1800 pesos). Como existe uma lei que permite aos estados fixar salários mínimos para as categorias que não os tenham estabelecido em convênio coletivo (o salário de convênio, entretanto, pode ser inferior aos fixados pelos Estados, ainda que não ao salário mínimo nacional), pode-se considerar que é um pouquinho maior em São Paulo (755 reais), Rio Grande do Sul (770) e Santa Catarina (765), algo maior no Rio de Janeiro (802) e bastante maior no Paraná (915 reais), que são os Estados que exercem esta prerrogativa. Assim temos que, se o salário mínimo do Brasil mal supera, com exceção do Paraná, a metade do argentino, e se a passagem de ônibus aqui custa 4,5 vezes mais que na Argentina, (estou considerando a tarifa de Buenos Aires como 1,60, que é o que se paga com o cartão SUBE), cada viagem de ônibus sai 8 ou 9 vezes mais cara para um brasileiro que receba o salário mínimo do que para um argentino em igual situação. Levando em conta que no Brasil os subsídios familiares são muito menores que na Argentina e muito menos gente os recebe, em nível de orçamento familiar a situação no Brasil se torna ainda pior”. Outro ponto que o leitor propõe discutir é que “no Brasil as linhas oficiais de pobreza e indigência não estão vinculadas com a cesta básica, como na Argentina: são fixadas pelo governo por decreto, de modo totalmente arbitrário, e são muito baixas: 140 reais (372 pesos) por pessoa para pobreza, 70 reais (186 pesos) para indigência. Nem o Indec (Instituo Nacional de Estatística e Censo. N. do T.) sob intervenção chegou a tal ponto, mas aqui muito pouca gente questiona isso. Quando o governo brasileiro diz que tiraram da indigência 40 milhões de pessoas, está dizendo, na verdade, que fez (com o Bolsa-família) que o ingresso destas pessoas alcançasse essa linha de indigência baixíssima”.
Pesquisas
Uma pesquisa da Datafolha difundida sábado mostra que 30% dos brasileiros consideram boa ou ótima a gestão de Dilma. Na primeira semana de junho, a cifra total era de 57%. E Dilma havia alcançado antes, 65%. A queda, pois, é um grande buraco de ar e, segundo a empresa, se as eleições fossem hoje a presidenta não teria assegurado um triunfo no primeiro turno frente ao candidato de Fernando Henrique Cardoso, Aécio Neves, a verde Marina Silva ou, eventualmente, o governador de Pernambuco Eduardo Campos. Uma parte da pesquisa introduz um matiz que sempre é crucial para a análise política: a contagem daqueles que optam por uma opinião regular que, em termos eleitorais, por exemplo, muitas vezes se soma à opinião favorável. Ao perguntar sobre o desempenho presidencial frente aos protestos, 32% disse que foi ótimo ou bom, 38% o considerou regular e só 26% opinou que havia sido mal ou péssimo. Em compensação é muito alta a opinião positiva sobre o anúncio presidencial de chamar um plebiscito para a reforma política: 68% a favor. Em outra ordem, ainda que acompanhando os dados anteriores, 65% está de acordo com a realização da Copa do Mundo no Brasil.
Voto em Lista
Quando o PT fala de reforma política se refere, entre outras coisas, a eliminar o financiamento privado das campanhas e a terminar com a possibilidade de eleger candidatos com margem autônoma em relação às listas de partidos. Na Argentina, a questão das listas fechadas foi muito discutida durante anos. O debate partia, talvez, de um preconceito: que os desconhecidos haviam sido os responsáveis pelos maiores desastres. Era um preconceito porque sempre os responsáveis pelas melhores façanhas ou os piores resultados são os mais conhecidos. Não por uma questão de fama, mas porque essa fama deriva habitualmente de sua cota de poder relativamente mais importante que a de outros. No Brasil, o PT sempre opinou que a personalização das candidaturas levou à transfiguração, à debilidade das instituições e à necessidade de tecer alianças já não partidárias, mas pessoais no Parlamento e nos Estados. Por isso, uma das repostas do PT e de Dilma aos protestos foi tratar de instalar a necessidade de uma reforma política. Por essa razão, também, um dos movimentos de Dilma foi falar diante dos governadores dos Estados e dos prefeitos das capitais estaduais. Quis comprometê-los.
Constituição
O advogado Pedro Estevam Serrano costuma ser consultado pelo semanário Carta Capital sobre temas jurídicos. Perguntaram-lhe se convém uma Constituinte originária reformadora ou não. Opinou que não. Disse que “é possível realizar a reforma política submetendo suas principais questões ao voto popular direto, o que mitigaria a presença de possíveis desvios na deliberação parlamentar”. A discussão hoje, no Brasil, opõe os partidários do plebiscito aos simpatizantes do referendo, encabeçada pelo líder opositor Aécio Neves, do Partido da Socialdemocracia Brasileira (PSDB, neoliberal). A diferença elementar é que o plebiscito precede a discussão parlamentar. O referendo, ao contrário, viria depois. O plebiscito poria um marco político ao debate legislativo. O referendo só daria sua aprovação posterior ou marcaria o desacordo popular com o que houvesse sido legislado antes. “Ainda que a decisão final seja do parlamento, este não teria a ousadia de contrariar a vontade direta expressa pelo povo”, disse Serrano. Sua defensa da posição de não abrir a Constituição é que a Carta Magna vigente, de 1988, surgiu de “um grande pacto nacional que deu sustentação a nossa democracia”. Romper com a Constituição de 1988 poderia abrir a porta para que, “no futuro, maiorias arbitrárias e ocasionais passem por cima de valores e direitos fundamentais para a existência livre e civilizada”.
Reação
O governador do Rio Grande do Sul, o petista Tarso Genro, já anunciou que implementará o passe livre em Porto Alegre e nas cidades mais importantes do Estado. Também convocou o debate para discutir a reforma política não só pelos canais tradicionais, mas através das redes de Internet.
Tradução: Liborio Júnior
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