Enriquecida pelo petróleo, a ditadura fundamentalista se transformou no maior aliado do Ocidente
LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA
LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA
Desde o fim da Segunda Guerra Mundial a história do Oriente Médio é uma história de tragédias, que geralmente tiveram como atores principais um islamismo em busca de um mítico califado e as três potências imperiais: a Grã-Bretanha e a França, que então foram obrigadas a conceder independência aos países sob seu domínio, e os Estados Unidos, a nova potência imperial.
Seu imperialismo deixou de ser formal, mas continuou presente. E o mundo, desde então, foi dividido entre o bem e o mal --entre os povos submissos e os que insistem em manter sua autonomia e por isso são "ameaças à democracia".
Os três países são ricos, já realizaram há muito sua revolução industrial e capitalista. Declaram-se, então, guardiões da democracia, e acusam os países insubmissos de serem autoritários. O que geralmente é verdade, porque são países relativamente pouco desenvolvidos, onde não há condições para uma democracia consolidada.
Seu imperialismo é particularmente violento no Oriente Médio, onde Irã e Síria são os representantes do mal, enquanto países muito mais autoritários, como as monarquias do Golfo Pérsico, são amigos, aliados, fazem parte do lado do bem.
A novidade é o papel ativo que vem assumindo a Arábia Saudita. Enriquecida pelo petróleo, essa ditadura fundamentalista, na qual o desrespeito pelos direitos humanos é incomparavelmente maior do que no Irã ou na Síria, se transformou no principal aliado do Ocidente.
Antes mesmo de as três potências decidirem intervir na Líbia, a Arábia Saudita estava financiando a revolução. Hoje, o país, onde há mais de 30 mil presos políticos, é o principal financiador da rebelião na Síria. Não fossem os sauditas, o governo ditatorial mas secularista da Síria já teria terminado uma guerra civil que já matou mais de 100 mil pessoas. Guerra civil em nome de quê? Da democracia, nos dizem os rebeldes. Mas se o fosse, a Arábia Saudita não os apoiaria.
Hoje o Egito vive uma tragédia. Seu povo realizou uma revolução democrática, mas o governo eleito não conseguiu enfrentar as crises em que o país está imerso, e foi relativamente autoritário, o que levou o povo de volta às ruas.
Desta vez equivocadamente, porque o resultado foi um golpe militar, e o assassinato de mais de mil membros da Irmandade Muçulmana que protestam contra o golpe.
Como no caso da Síria, o golpe militar no Egito conta com o apoio envergonhado das três potências e o apoio decidido da Arábia Saudita. Quando há um ano uma rebelião explodiu no Bahrein contra o regime ditatorial ali existente, quem impediu que a rebelião vencesse foi a Arábia Saudita.
No Brasil, e, mais amplamente, nos países democráticos, sentimos dificuldade em criticar as três potências, enquanto seus inimigos geralmente são regimes autoritários.
Mas o papel desempenhado pela Arábia Saudita resolve essa dúvida. Lá o Ocidente não luta pela democracia; luta apenas pelo seu poder e pela submissão dos que entendem que precisam de autonomia nacional para realizarem sua revolução industrial e capitalista e um dia poderem ser democráticos.
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