A crise real não pode ser abordada a menos que os empregos sejam trazidos de volta para o país e acabem as guerras
Paul Craig Roberts
Paul Craig Roberts
É surpreendente a incapacidade da mídia e dos políticos de se concentrarem nas questões reais.
Se os estrangeiros perderem a confiança no dólar, uma queda no valor de troca do dólar implicaria numa alta inflação e a perda de controle pelo Federal Reserve sobre as taxas de juros. É possível que a queda no valor de troca do dólar venha a iniciar uma hiperinflação nos EUA. Ou também os proprietários estrangeiros de dólares podem vir aos Estados Unidos, investirem nas empresas e desnacionalizarem o controle da economia.
A crise real é de falta de inteligência entre os economistas e legisladores que vêm nos dizendo há 20 anos para não nos preocuparmos sobre a debandada de empregos dos EUA, porque nós íriamos ter uma “Nova Economia” com empregos melhores.
Como eu relato todos os meses, nenhum desses empregos da “Nova Economia” apareceu na estatística da folha de pagamento ou no departamento de projeções trabalhistas sobre futuros empregos. Os economistas e legisladores simplesmente entregaram uma boa parte da economia dos EUA para poder elevar os lucros corporativos. O resultado foi a criação nos EUA da pior distribuição de renda de todos os países desenvolvidos e de muitos países não desenvolvidos também.
Na verdade, os lucros aumentados são uma solução de curto prazo, porque ao deter o crescimento da renda do consumidor, a debandada de empregos para o estrangeiro destruiu o mercado consumidor dos EUA. Como observei num artigo recente, em 19 de setembro o New York Times noticiou o que eu venho dizendo há anos: a renda média famíliar nos EUA não cresceu em 25 anos. A falta de crescimento da renda do consumidor é o motivo pelo qual 5 anos de estímulo monetário e físico não foram capazes de trazer nenhuma recuperação econômica.
A crise real não pode ser abordada a menos que os empregos sejam trazidos de volta para o país e acabem as guerras. Como interesses organizados poderosos se opõem a tais medidas, o Congresso vai aprovar um novo teto da dívida e a crise real irá continuar.
Você ouviu qualquer menção sobre a crise real na mídia? Hoje (30/09) eu estava num programa de televisão internacional por 25 minutos com o editor-financeiro-chefe de um dos principais jornais da Inglaterra. Não há dúvida que ele era uma pessoa bem intencionada e inteligente, mas ele não conseguia pensar fora da “caixa”. Ele não conseguiu entender a minha explicação, e acabou por recorrer a regurgitações da ignorância ou subserviência da mídia à propaganda de Washington.
Dentre as suas regurgitações estava a “solução” de cortar a Previdência Social. O editor-financeiro-chefe de um dos principais jornais da Inglaterra não sabia que nos últimos 25 anos as entradas da Previdência Social ultrapassaram os pagamentos da Previdência Social, e que o Tesouro gastou o excedente para financiar os gastos operativos anuais do governo, e emitiu “reconhecimentos da dívida” não comercializáveis para os Fundos Fiduciários da Previdência Social.
O editor-financeiro-chefe também não entendeu que cortando os pagamentos da Previdência Social esta também cortando os gastos do consumidor ou a demanda agregada, o que afunda ainda mais a economia, ampliando, assim, o problema deficit/dívida.
Devido ao sério declínio na economia dos EUA causado pela debandada de empregos para o estrangeiro e a desregulamentação financeira, a Previdência Social já não agrega ao seu excedente. Os pagamentos da Previdência Social necessitam do suplemento da receita da folha de pagamento anual dos reembolsos pelo Tesouro dos fundos emprestados.
As únicas razões pelas quais a Previdência Social está tendo problemas é que a debandada dos empregos para o estrangeiro e as guerras limitaram a capacidade do Tesouro dos EUA de fazer progressos com a dívida, exceto através da impressão de dinheiro pelo Federal Reserve. Cada emprego que é mandado para fora do país deixa de contribuir com os impostos da folha de pagamento para a Previdência Social e o Medicare.
Os despreocupados economistas estadunidenses dizem que a manufatura é uma fonte ultrapassada de emprego, mas somente os empregos na manufatura chinesa são quase o equivalente a toda a força de trabalho em todas as ocupações nos EUA, inclusive garçonetes,garçons e enfermeiros hospitalares. A economia da China está crescendo a uma taxa de 7,5% em termos reais, enquanto as economias do Ocidente não conseguem ir para a frente e algumas estão regredindo.
Para acalmar Wall Street, a instituição mais corrupta da história humana, e para evitar aquisições de suas corporações financiadas por Wall Street, os executivos destruíram o mercado consumidor, debandando a renda estadunidense, substituindo a mão de obra dos EUA por mão de obra estrangeira, tudo para aumentar os lucros.
Na minha opinião, a economia dos EUA não pode mais ser salva na forma atual. A economia está esgotando os seus recursos hídricos. A oferta que ainda restou está sendo dizimada por Fracking [tecnologia para extração do xisto]. O solo está esgotado pelo uso do glifosato, essencial para a agricultura transgênica. Os custos externos de produção estão subindo (os custos que as corporações impõem sobre o meio ambiente e a terceiros) e, possivelmente, excedem o valor do aumento na produção corporativa. Os economistas são incapazes de um pensamento independente, e os seus representantes eleitos estão dependentes dos interesses privados que financiam as campanhas.
É difícil imaginar uma situação mais desanimadora.
No momento, o colapso parece ser a previsão mais provável.
Talvez, das ruínas, um novo começo mais inteligente possa ocorrer.
Se houver algum líder.
Paul Craig Roberts foi Secretário Assistente do Tesouro para Políticas Econômicas e editos associado do Wall Street Journal. Foi colunista para a revista Business Week, Scripps Howard News Service, e Creators Syndicate.
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