Em junho de 2013, multidões nas ruas provocaram um fenômeno poucas vezes visto no Brasil. Pouca gente esperava tamanha mobilização e, talvez por isso, não faltaram os que tentaram traçar cenários sobre o que ocorreria quando o asfalto voltasse a ser ocupado pelos automóveis (até mesmo este que vos escreve se arriscou!). Cerca de quatro meses depois, a dúvida é outra: por que a maioria dos manifestantes não voltou às ruas diante de questões como as controvérsias relacionadas ao julgamento do chamado Mensalão? Ou mesmo, por que parte da população não se mobilizou para defender o registro da Rede Sustentabilidade, partido cuja provável candidata possui considerável intenção de voto?
Pensando em possíveis respostas, lembrei-me de um texto publicado em 2010 na Folha de São Paulo. O artigo, assinado por Malcolm Gladwell, conta a história de um protesto ocorrido nos Estados Unidos nos anos 1960, quando ainda existiam políticas de segregação racial no sul do país. Quatro amigos negros tiveram uma ideia, simples, mas poderosa: após semanas discutindo no dormitório da universidade, decidiram ir a uma lanchonete, sentar-se no balcão e pedir um café. Tendo em vista as “regras do jogo” – que reservavam aos negros um limitado espaço nos estabelecimentos, em pé – tal empreitada poderia ser arriscada. Negado o pedido, decidiram voltar nos dias seguintes, atraindo atenção crescente, além de uma série de ameaças. O resultado é conhecido: nem mesmo a violência foi capaz de frear o movimento pelos direitos civis nos EUA
O que explica, então, o fato de os estudantes negros dos EUA terem insistido, enquanto a maioria dos protestantes no Brasil optou por voltar para casa? Gladwell argumenta, baseado em uma série de estudos, que o grau de amizade entre os protestantes fez toda a diferença. Em outras palavras, o que fez os quatro manifestantes resistirem diante da pressão foi o fato de compartilharem algo mais que a revolta com a discriminação; o que os unia ali era, antes de tudo, relações pessoais que haviam cultivado. Na sequência, o autor inicia uma interessante discussão sobre os limites das redes sociais, como o Facebook ou o Twitter, para promoverem mobilizações como o movimento norte-americano pelos direitos civis. Em resumo, tais ferramentas seriam incapazes de mobilizar as pessoas quando algum tipo de custo ou risco esteja envolvido.
É justamente aí que o papo começa a ficar interessante. Muito se falou sobre o papel das redes sociais durante os protestos no Brasil. De fato, é provável que a internet tenha contribuído para as mobilizações de junho. Ocorre que, devido a isso, os protestos foram o que foram: milhões de pessoas nas ruas, com seus cartazes, pagando um pequeno custo e assumindo um pequeno risco por uma causa abstrata. Postadas as fotos no Facebook, a maioria das pessoas voltou aos seus afazeres com a sensação de missão cumprida. A falta de uma identificação mais concreta entre os indignados, que foi a força do movimento em um primeiro momento – quem não se lembra das mensagens postadas com frases como “o gigante acordou” – acabou sendo a sua maior fraqueza.
Passemos agora a uma outra notícia recente, publicada no site Uol. Nela é apresentada uma rede social voltada a conectar indivíduos e empresas ligados ao agronegócio. Chamada Sojabook, a ideia é resultado do trabalho de um empreendedor argentino chamado Mariano Torrubiano. Como uma rede social, apresenta todas as vantagens e desvantagens de suas irmãs mais conhecidas. Em outras palavras, o Sojabook – e qualquer outra iniciativa inspirada no conceito de rede social – tem potencial para consolidar-se como um espaço para a troca de informações e o aproveitamento de algumas oportunidades econômicas. Entretanto, tal movimento deverá ocorrer apenas quando nenhum custo ou risco estiver envolvido.
O leitor entusiasta das redes sociais provavelmente achará essa opinião pessimista. De fato, para uma série de atividades a Internet é fantástica. Por exemplo, possibilita o enorme intercâmbio de experiências e opiniões entre indivíduos vivendo realidades distintas. Pensando no longo prazo, porém, vale a pena perguntar: alguém espera que, em cinco anos, abundem exemplos de parcerias estratégicas entre produtores rurais que se conheceram por meio de uma rede social? Na hora de fazer um investimento na lavoura, o que conta mais: a opinião de um amigo ou a discussão em um fórum da Internet? Vocês acreditam no poder de um manifesto apoiado por milhares de “assinaturas eletrônicas” pedindo alguma mudança na legislação, por exemplo?
Em resumo, redes sociais têm despertado gigantes em diversos segmentos, mas tais “monstros” têm características bem diferentes do que os mais otimistas supõem. Longe de provocar grandes revoluções, é possível que essas ferramentas apenas “lubrifiquem” determinadas relações baseadas nos chamados laços fracos. Embora tais ligações sejam fundamentais para a rotina econômica – muitos contatos podem fazer a diferença na hora de conseguir um emprego, por exemplo –, não é dali que sairá a próxima grande novidade em termos de gestão ou um projeto inovador de ação coletiva entre os agricultores. É bem provável que “grandes novidades” continuem a ser concebidas em velhos palcos: nada melhor que os churrascos de domingo ou o futebol com os amigos para facilitar determinados acordos.
Pensando em possíveis respostas, lembrei-me de um texto publicado em 2010 na Folha de São Paulo. O artigo, assinado por Malcolm Gladwell, conta a história de um protesto ocorrido nos Estados Unidos nos anos 1960, quando ainda existiam políticas de segregação racial no sul do país. Quatro amigos negros tiveram uma ideia, simples, mas poderosa: após semanas discutindo no dormitório da universidade, decidiram ir a uma lanchonete, sentar-se no balcão e pedir um café. Tendo em vista as “regras do jogo” – que reservavam aos negros um limitado espaço nos estabelecimentos, em pé – tal empreitada poderia ser arriscada. Negado o pedido, decidiram voltar nos dias seguintes, atraindo atenção crescente, além de uma série de ameaças. O resultado é conhecido: nem mesmo a violência foi capaz de frear o movimento pelos direitos civis nos EUA
O que explica, então, o fato de os estudantes negros dos EUA terem insistido, enquanto a maioria dos protestantes no Brasil optou por voltar para casa? Gladwell argumenta, baseado em uma série de estudos, que o grau de amizade entre os protestantes fez toda a diferença. Em outras palavras, o que fez os quatro manifestantes resistirem diante da pressão foi o fato de compartilharem algo mais que a revolta com a discriminação; o que os unia ali era, antes de tudo, relações pessoais que haviam cultivado. Na sequência, o autor inicia uma interessante discussão sobre os limites das redes sociais, como o Facebook ou o Twitter, para promoverem mobilizações como o movimento norte-americano pelos direitos civis. Em resumo, tais ferramentas seriam incapazes de mobilizar as pessoas quando algum tipo de custo ou risco esteja envolvido.
É justamente aí que o papo começa a ficar interessante. Muito se falou sobre o papel das redes sociais durante os protestos no Brasil. De fato, é provável que a internet tenha contribuído para as mobilizações de junho. Ocorre que, devido a isso, os protestos foram o que foram: milhões de pessoas nas ruas, com seus cartazes, pagando um pequeno custo e assumindo um pequeno risco por uma causa abstrata. Postadas as fotos no Facebook, a maioria das pessoas voltou aos seus afazeres com a sensação de missão cumprida. A falta de uma identificação mais concreta entre os indignados, que foi a força do movimento em um primeiro momento – quem não se lembra das mensagens postadas com frases como “o gigante acordou” – acabou sendo a sua maior fraqueza.
Passemos agora a uma outra notícia recente, publicada no site Uol. Nela é apresentada uma rede social voltada a conectar indivíduos e empresas ligados ao agronegócio. Chamada Sojabook, a ideia é resultado do trabalho de um empreendedor argentino chamado Mariano Torrubiano. Como uma rede social, apresenta todas as vantagens e desvantagens de suas irmãs mais conhecidas. Em outras palavras, o Sojabook – e qualquer outra iniciativa inspirada no conceito de rede social – tem potencial para consolidar-se como um espaço para a troca de informações e o aproveitamento de algumas oportunidades econômicas. Entretanto, tal movimento deverá ocorrer apenas quando nenhum custo ou risco estiver envolvido.
O leitor entusiasta das redes sociais provavelmente achará essa opinião pessimista. De fato, para uma série de atividades a Internet é fantástica. Por exemplo, possibilita o enorme intercâmbio de experiências e opiniões entre indivíduos vivendo realidades distintas. Pensando no longo prazo, porém, vale a pena perguntar: alguém espera que, em cinco anos, abundem exemplos de parcerias estratégicas entre produtores rurais que se conheceram por meio de uma rede social? Na hora de fazer um investimento na lavoura, o que conta mais: a opinião de um amigo ou a discussão em um fórum da Internet? Vocês acreditam no poder de um manifesto apoiado por milhares de “assinaturas eletrônicas” pedindo alguma mudança na legislação, por exemplo?
Em resumo, redes sociais têm despertado gigantes em diversos segmentos, mas tais “monstros” têm características bem diferentes do que os mais otimistas supõem. Longe de provocar grandes revoluções, é possível que essas ferramentas apenas “lubrifiquem” determinadas relações baseadas nos chamados laços fracos. Embora tais ligações sejam fundamentais para a rotina econômica – muitos contatos podem fazer a diferença na hora de conseguir um emprego, por exemplo –, não é dali que sairá a próxima grande novidade em termos de gestão ou um projeto inovador de ação coletiva entre os agricultores. É bem provável que “grandes novidades” continuem a ser concebidas em velhos palcos: nada melhor que os churrascos de domingo ou o futebol com os amigos para facilitar determinados acordos.
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