Wallerstein sustenta: crise do sistema-mundo capitalista produz divisão rara entre poderosos e gera enorme instabilidade. Será preciso definir projetos alternativos
Immanuel Wallerstein
Immanuel Wallerstein
Francisco Goya, Duelo com porretes (1823, detalhe)
E, é claro, temos as não-negociações maciças, em curso nos Estados Unidos. Nelas, os membros de ultra-direita do Congresso, em especial na Câmara dos Representantes, estão usando sua força para vetar qualquer comprimosso com as forças inimigas lideradas pelo presidente Obama e o Partido Democrata. Veem como “inimigo interno” todos os republicanos que buscam algum tipo de “compromisso”.
Não é difícil mostrar que todos estes Sansões estão botando a casa abaixo não apenas sobre seus inimigos mas também sobre si mesmos. Para eles, contudo, mesmo que isso seja verdadeiro, há um timing a considerar. Estão convencidos de que precisam agir agora, enquanto têm forças para fazê-lo. Do contrário, o inimigo vencerá e poderá institucionalizar – ou manter – o mal que estaria sendo cometido.
Este tipo de luta ideológia, impermeável ao chamado pragmatismo, não foi inventado nos últimos dez ou vinte anos. É tão velho quanto a socialização humana. Mas assumiu uma característica especial agora, precisamente porque estamos nos espamos de uma crise estrutural em nosso sistema-mundo capitalista. Numa crise estrutural, pode-se esperar dois grandes fenômenos: enorme confusão intelectual e, como consequência, mudanças selvagens de atitude, que conduzem, por sua vez, a guinadas ainda mais bruscas.
Como há cada vez mais grupos prontos para botar o templo abaixo, mesmo que sejam também esmagados, quem parece mais confuso e indeciso sobre o que fazer é o chamado Establishment. Foram-se os dias em que ele podia cinicamente manobrar e obter o que queria. Não é mais verdade que “plus ça change, plus c’est la même chose” – ou seja, que as mudanças são apenas aparentes.
O fato de o templo estar caindo é algo muito além de nossas forças para contê-lo – mesmo que o desejássemos. Mas não somos obrigados a permanecer sob a avalanche das rochas. Precisamos tentar escapar. Podemos estar certos de que os membros mais poderosos do Establishment também estão tentando.
Mas como escapar, e com que objetivos? Também nós precisamos ter senso detiming, e lembrar a diferença entre o curto prazo (três anos ou menos) e o médio prazo (os próximos vinte a quarenta anos).
No curto prazo, as pessoas (os 99%) estão sofrendo. Precisamos lutar para reduzir sua dor, uma luta que deve assumir múltiplas formas. Podem ser pressões por leis, ou decisões de órgãos do Estado, que ajudem de modo imediato os necessitados, ou evitem danos maiores ao ambiente, ou protejam direitos de populações como os indígenas ou as chamadas minorias sociais.
Mas no médio prazo, precisamos tentar esclarecer a natureza das estruturas que queremos construir, se formos bem-sucedidos na encruzilhada que nosso sistema-mundo atravessa. Precisamos tentar entender não apenas os objetivos de médio prazo da direita mundial, mas a natureza de suas profundas divisões internas. A chamada esquerda está profundamente dividida, também. Precisamos trabalhar para superar isto.
Nada é fácil, neste tempo de transição de um sistema-mundo para outro. Mas tudo é possível – ainda que inteiramente incerto.
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