ESCRITO POR D. DEMÉTRIO VALENTINI |
SEGUNDA, 12 DE MAIO DE 2014 |
Há momentos marcantes na assembleia da CNBB. Um deles é a missa para lembrar os bispos falecidos desde a última assembleia. Os respectivos substitutos fazem a procissão de entrada, cada um trazendo uma vela acesa, que é colocada diante do altar, enquanto se lê o nome de cada um dos bispos falecidos.
A média de idade se encarrega de garantir, cada ano, um bom número de falecimentos. Desta vez, a foice passou mais rasante, chegando a envolver a própria assembleia.
Poucos dias antes de ela se iniciar, faleceu repentinamente o bispo de Três Lagoas, no Mato Grosso do Sul, D. José Moreira. E em plena assembleia, justo no dia em que a liturgia colocava em destaque os bispos eméritos, chegava a notícia do falecimento de Dom Tomás Balduino.
Seu enterro se realizou enquanto no Santuário de Aparecida a liturgia lembrava os bispos falecidos.
Para a morte não existe hora nem dia marcado. Mas desta vez parecia de fato que a data fora escolhida de propósito. Pois parecia bem adequado que o bispo que mais valorizou as assembleias da CNBB morresse justo no dia em que a CNBB estava reunida em assembleia.
Com sua longa trajetória de bispo, desde os tempos do Concílio Vaticano II, passando pelo período da ditadura, Dom Tomás encarna, à perfeição, o legítimo perfil da CNBB. Nascido em Goiás, desde cedo, como frade dominicano, assumiu a clara postura de homem independente e corajoso, identificado profundamente com as causas sociais, sempre atento à defesa dos mais fracos e vulneráveis. De maneira muito concreta, assumiu a causa dos índios, a serviço dos quais se empenhou de tal maneira que chegou a aprender duas línguas indígenas para melhor se comunicar com eles.
Nomeado bispo de Goiás Velho, a mais antiga diocese do estado de Goiás, permaneceu no posto até sua aposentadoria. Mas mesmo depois de bispo emérito, não diminuiu o pique, nem esmoreceu na sua luta.
Por sua lúcida atuação nas assembleias, ele agora bem que mereceria uma pesquisa, para verificar as atas, e comprovar que sem dúvida foi um dos bispos mais atuantes nas assembleias, sempre com intervenções muito lúcidas, além de muito livres e autênticas. Bem que a Providência lhe reservou esta coincidência, de fazer sua última intervenção na assembleia, desta vez com o silêncio da morte, para que todos percebessem melhor a importância do seu testemunho de vida.
Mas, na missa em memória dos bispos falecidos, foi lembrado outro gigante do episcopado brasileiro, Dom Waldyr Calheiros, bispo de Volta Redonda, no estado do Rio de Janeiro.
A morte de ambos, no mesmo intervalo de assembleias, veio simbolizar a profunda sintonia que sempre existiu entre eles, D. Tomás e D. Waldyr. Ambos tiveram, de fato, uma trajetória episcopal muito parecida. Nomeados bispos no início da década de 60, puderam participar do Concílio Vaticano Segundo, tendo sido dos mais ardorosos artífices da profunda renovação pastoral que o Concílio inspirou naquelas décadas.
Lembrados na mesma celebração, ficou ressaltada sua amizade, a ponto de parecerem irmãos gêmeos, tal a identificação existente entre eles.
Eles fizeram parte de uma geração de bispos, quase todos já falecidos.
Deles convém guardar bem viva a memória, não só para lembrar suas pessoas, mas para não esquecermos o perfil da CNBB, que os atuais bispos sentem o desafio de conservar, mesmo que as circunstâncias históricas tenham mudado.
Tanto Dom Tomás como Dom Waldyr, junto com Dom Aloísio Lorscheider, Dom Ivo, Dom Luciano, e tantos outros, fazem parte da galeria dos bispos que nos legaram um impressionante testemunho de pastores corajosos e coerentes com sua missão.
É compromisso nosso guardar agora sua memória, para seguir seu exemplo.
D. Demetrio Valentini é bispo da diocese de Jales-SP.
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