SEG, 26/10/2015 - 20:28
ATUALIZADO EM 27/10/2015 - 10:52
Antes, operação focava em máfia criada para abater dívidas de grandes empresas - RBS (Rede Globo), Banco Safra, Santander, Camargo Corrêa - com a Receita. Agora, a reboque da mídia, apura uma suposta - e mal explicada - compra de Medida Provisória no governo Lula
Jornal GGN - Deflagrada em março deste ano, a Operação Zelotes já chegou a ser classificada como o oposto da Lava Jato: não tinha recursos para força-tarefa, nem juiz federal despachando na velocidade de Sergio Moro, ou o mesmo volume de delações premiadas e vazamentos seletivos, tampouco uma lista com mais de 50 políticos implicados publicamente em esquemas de desvio de dinheiro público. Consequentemente, não sentia o impacto da espetacularização dos fatos.
Mas há semanas alguns fatores mudaram, e o principal deles é que o foco da operação saiu do encalço de grandes grupos econômicos - como Rede Globo, bancos e empreiteiras - e de políticos já protegidos pelo foro privilegiado, e passou a perseguir a família do ex-presidente Lula (PT).
Foi o suficiente para transferir a Zelotes das tímidas páginas de jornais da mídia impressa para os espaços de destaque, aqueles destinados às denúncias bombásticas, mesmo que vazias.
Leia mais: Sobre denúncias vazias em manchetes cheias
Foi o que aconteceu na manhã desta segunda-feira (26), quando a Polícia Federal, a Receita Federal e o Ministério Público Federal deflagraram a terceira fase da Zelotes - que nada tem a ver com a origem da investigação, que começou desbaratando uma máfia instaurada no Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) para abater dívidas de grandes empresas com a Receita Federal, em troca de pagamento de propina a agentes públicos.
Após a publicação de uma reportagem do Estadão, denunciando uma suposta “compra” de Medida Provisória no governo Lula, a PF recebeu autorização para fazer busca e apreensão em duas empresas de Luís Cláudio Lula da Silva: a TouchDown Promoção de Eventos Esportivos e a LFT Marketing Esportivo. O pedido partiu do Ministério Público Federal, segundo informações da Folha.
O desvirtuamento da Zelotes foi apontada pela defesa do filho de Lula, em nota enviada à imprensa após a operação. Nela, o advogado Cristiano Zanin Martins sustenta que a busca e apreensão na TouchDown, para começar, foi “despropositada”, uma vez que a empresa que “organiza o campeonato brasileiro de futebol americano (...), uma atividade lícita" está fora do âmbito da operação. Além disso, segundo o informe, a associação da LFT Marketing à "compra" mal explicada de uma MP não se sustenta nem mesmo na reportagem publicada pelo Estadão.
Da denúncia contra o filho de Lula
No radar da PF e do MPF estão informações que constam em reportagem publicada em 1º de outubro, indicando que, em 2009, empresas do setor automobilístico contrataram escritórios de assessoria empresarial e jurídica para fazer lobby no Congresso e junto ao governo Lula, com vistas à aprovação da MP 471. A medida provisória prorrogaria, até dezembro de 2015, benefícios fiscais da ordem de R$ 1,3 bilhão por ano a montadoras, nas regiões Nordeste, Centro e Norte do País. O montante envolvido nesse suposto esquema era da ordem de R$ 36 milhões.
Estão "implicados" na história a MMC Automotores (representante da Mitsubishi) e o Grupo CAOA (Ford, Hyundai e Subaru), que contrataram o “consórcio” formado pelos escritórios SGR (do empresário José Ricardo da Silva) e Marcondes & Mautoni (Mauro Marcodes) para destravar a MP 471.
A reportagem do Estadão insinua que, a partir de 2014, cinco anos após a aprovação da MP, a LFT, criada pelo filho de Lula em 2011, recebeu R$ 2,4 milhões da Marcondes & Mautoni. O dinheiro seria, pelas suspeitas das autoridades da Zelotes, pagamento indevido pelo lobby. A defesa de Luís Cláudio explicou que os recursos estão ligados a contratos de prestação de serviço na área de marketing.
Na matéria do Estadão, há trechos de um e-mail que serviria de "prova" do pagamento de vantagens indevidas. “Mensagens trocadas entre os envolvidos mencionam a oferta de propina a agentes públicos para viabilizar o texto” da MP. Deputados, senadores e gente do “governo, PT” estariam “envolvidos” no esquema. Mas nenhum nome de político foi revelado. E mais: a MP foi aprovada por acordo de líderes, por unanimidade, deixando a seguinte questão não respondida: quem pagaria para aprovar uma MP que era bem vista inclusive entre lideranças do DEM e do PSDB?
A MMC e a CAOA admitiram que atuaram junto ao governo em causa própria (lobby) contratando os serviços da Marcondes, mas não para comprar medidas provisórias. A Marcondes e a SGR, por sua vez, admitiram que atuaram para emplacar a MP, mas não com uso de corrupção. Consta ainda na reportagem do Estadão que a MMC não participou do “acerto” para pagamento de propina, diferentemente da CAOA e da Marcondes, que teriam “recuado” e faltado com o “compromisso”. Ou seja: não há indícios de que houve, de fato, qualquer pagamento, nem de que todas as partes sabiam do suposto esquema.
Na reportagem, sequer ficou claro quais as intenções da PF e do MPF com a empresa SGR, de José Ricardo da Silva. Para criar algum vínculo com o governo Lula, o Estadão apenas escreveu que José Ricardo, ex-conselheiro do Carf, tem relações de “parceria com o lobista Alexandre Paes dos Santos (APS)”, “ligado à advogada Erenice Guerra, secretária executiva de Dilma [Rousseff] na Casa Civil quando a MP foi discutida.” O jornal também observou que a MP, antes de ir à sanção presidencial, passou pelas mãos de Dilma, então ministra.
Nesta terceira fase da Zelotes, foram presos “José Ricardo da Silva, em sua casa em Brasília, e o consultor Mauro Marcondes. Há também um mandado contra Cristina Marcondes, mulher de Mauro Marcondes. O dono da CAOA, Carlos Alberto Oliveira Andrade, foi alvo de mandado de condução coercitiva”, entre outros atores envolvidos no “lobby”, segundo informou o Estadão.
Da aprovação da MP
Além do súbito interesse da mídia na Zelotes, outra questão pouco explorada é a origem da MP 471. No mesmo dia em que o Estadão publicou a denúncia de “compra” de MP envolvendo a empresa do filho de Lula, o líder do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio, informou que pediria às autoridades competentes uma investigação sobre o caso. Sem citar, claro, uma única palavra sobre a participação dos tucanos na aprovação da proposta, em 2009.
Para começar, a MP prorroga um pacote de incentivos fiscais que foi criado no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), em 1999. Nos registros do Senado, consta como fruto de uma batalha de anos do então senador Antônio Carlos Magalhães. Foi com a isenção a montadoras que a indústria automobilística desembarcou na Bahia, Estado que ACM governou em três mandatos.
Em 2009, ACM Junior, à época no DEM, comemorou a prorrogação assinada por Lula, assim como Arthur Virgílio (PSDB). Para o tucano, a MP de Lula era um motivo para fazer o Brasil “feliz”, pois mantinha as portas abertas para que as riquezas do País não fossem produzidas apenas nas regiões Sul e Sudeste. José Agripino (DEM) e Tasso Jereissati (PSDB) também elogiaram a MP 471. Todos, caciques de oposição à gestão petista, mas favoráveis a uma MP que, para a Zelotes, teria recheado o bolso de governistas desconhecidos, apenas.
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