Desde agosto de 2012, os camponeses do Estado do Rio Grande do Norte, no Nordeste do Brasil, são ameaçados de expropriação, a fim de abrir espaço a um perímetro de irrigação para um projeto de fruticultura. Os esforços de organização, de conscientização e de autogestão de projetos individuais e coletivos em curso desde uma dúzia de anos, portanto, podem desaparecer em uma rajada de vento. Principalmente graças às mulheres e aos movimentos feministas, estes projetos tem tido um impacto positivo sobre as relações sociais integradas à ecologia do lugar. A agroindústria seria devastadora sobre tais avanços políticos e sociais.
Jacinthe Leblanc
Jacinthe Leblanc
O projeto do perímetro irrigado da Chapada do Apodi é liderado pelo Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS). Ele consiste em realocar em torno de 6.000 camponeses presentes nas trinta comunidades, informa o grupo “Não ao projeto do DNOCS”. A implantação da fruticultura prevê se estender sobre 13.855 hectares e é comandada por quatro grandes multinacionais do agronegócio cujos nomes não são, no momento, conhecidos do público. O decreto autorizando as companhias a começarem os trabalhos para o projeto do perímetro irrigado foi assinado pela governadora do Estado Rosalba Ciarlini em agosto passado.
Os significativos avanços sociais
A antropóloga Elsa Beulieu, que tem feito pesquisas de campo na região para sua tese de doutorado, destaca que as redes de solidariedade da região Oeste do Rio Grande do Norte se consolidaram desde o início dos anos 2000. Ela nota o desempenho das mulheres rurais que "começaram a participar em projetos produtivos para elas, mas também contribuíram a melhorar as condições de vida nas suas comunidades lutando para infraestruturas, cisternas, de água, uma linha de telefone para a comunidade, ás vezes até mesmo para uma estrada".
O machismo ambiente permanece, no entanto, muito presente e, ás vezes, freia diretamente os avanços sociais. Em 2003, o governo Lula instaurou um programa de crédito rural para as mulheres, o PRONAF Mulheres. Onde, os homens que possuíam os certificados de propriedade das terras rurais. "Foi necessário fazer grandes campanhas de documentação para que as mulheres tivessem os papéis delas, para que elas possam ter acesso a este programa e financiar seu projeto produtivo", conta Elsa Beaulieu.
A importância da Marcha mundial das mulheres
No início dos anos 2000, a chegada da Marcha mundial das mulheres (MMF) no Brasil parece ter sido um elemento engatilhador de uma mobilização e crescente solidariedade feminista. Em 2006, o Secretariado internacional da MMF elegeu domicílio em São Paulo e em 2010, a terceira campanha de ações mundiais da MMF foi realizada. A ação organizada pela coordenação nacional da MMF no Brasil foi espetacular: durante 10 dias, milhares de mulheres marcharam de Campinas a São Paulo, percorrendo as comunidades e oferecendo formações políticas.
Na opinião de Elsa Beaulieu, que é igualmente uma militante da MMF, essa última teve um efeito de um "movimento catalisador na organização de uma rede de comercialização solidária para os pequenos grupos produtivos de mulheres rurais do Rio Grande do Norte". Os militantes da MMF tem aliados de diferentes movimentos e organismos, como o Movimento dos Sem-Terras (MST), a Via Campesina e diferentes movimentos para a agroecologia.
A reapropriação das terras
Apesar das demandas dos camponeses e os diferentes movimentos sociais, a reforma agrária do Brasil permanece de amplitude muito fraca. Na região do Apodi, graças às diversas mobilizações dos camponeses são “oferecidos” pelo Estado terras inutilizadas por seus proprietários. Nas comunidades construídas sobre as terras redistribuídas, vários grupos de mulheres se formaram, em grande parte sob a bandeira da MMF. Estas mulheres colocaram em prática os princípios da agroecologia e se inspiraram nos princípios da economia solidária, tudo colaborando com os diferentes atores presentes como as ONGs de assistência técnica à reforma agrária e os sindicatos. Tudo isso juntos criam um clima onde "começa a fazer sentido na cabeça das pessoas que as práticas agroecológicas não se misturam com a violência contra as mulheres", insiste Elsa Beaulieu. A perspectiva sobre as relações sociais tornam-se assim parte integrante da ecologia do lugar.
Ameaça de expropriação e desmantelamento dos avanços sociais
Pondo diante da "criação de emprego" e o desenvolvimento econômico da região, a governadora do Estado do Rio Grande do Norte, Rosalba Ciarlini, deu em agosto passado a autorização para as primeiras obras do perímetro irrigado da Chapada do Apodi.
As companhias que estão envolvidas no projeto têm a autorização de expropriar os habitantes do território que deve ser irrigado, e tentam agora os convencer de sair, mediante uma compensação financeira. Para Elsa Beaulieu, a questão não é tanto de aceitar ou não o dinheiro, mas ela se situa antes ao nível do princípio de "ceder a terra enquanto há um projeto de revalorização da agricultura familiar e da agricultura camponesa a partir das lutas feministas", ela argumenta.
O último dia 22 de novembro, os agentes do DNOCS entraram nas terras dos camponeses sem a permissão deles e sem serem identificados. Eles e elas apresentaram denúncia à polícia local. Essa intrusão não ajuda à confiança mútua. Além disso, segundo o grupo Não ao projeto do DNOCS, tal projeto coloca fim à experiência agroecológica e agricultura familiar para favorecer a monocultura e a utilização de pesticidas sobre grandes superfícies, ambos nocivos à natureza e à vida humana. Os projetos alternativos da região se vêem então ameaçados, da mesma forma que a biodiversidade e a saúde da população.
Um projeto não viável, mas que chega ao ponto
Segundo o professor João Abner da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, o projeto não seria viável, mesmo seguindo a lógica econômica do governo e dos defensores. Os últimos previam utilizar a água da barragem Santa Cruz, mas a quantidade de água disponível para irrigar um projeto de fruticultura dessa amplitude lá é insuficiente. O professor argumenta que o transporte de água da barragem ao perímetro é irrealista, já que o perímetro está a uma altitude superior àquela da barragem. Por consequência, a bomba de água até o destino seria cara e intensiva de energia. O custo do transporte da água da barragem é assumido pelos fundos públicos, pois o governo fornece gratuitamente a energia às multinacionais. Isso significa, portanto, que a população vai pagar para o transporte de água.
O Rio Grande do Norte se depara com um período de seca, desde um ano e meio. As paisagens são cinza, rachaduras no chão e os animais emagrecem e morrem. Apesar dos esforços do governo de enviar caminhões de águas às comunidades, vários camponeses podem ser empurrados para migrar para outros lugares.
Nestas condições de seca, os camponeses estão particularmente vulneráveis às pressões para deixar suas terras. A conjuntura é, então, para o momento propício à implantação do perímetro irrigado, e torna muito difícil a mobilização e a luta ao projeto do DNOCS. Os perigos de recuo são grandes.
Crédito foto: Não ao projeto do DNOCS
Tradução exclusiva para o Controvérsia:
Tereza Sandra Loiola Vasconcelos (francês)
Contato: terezavasconcelos@hotmail.com
Tereza Sandra Loiola Vasconcelos (francês)
Contato: terezavasconcelos@hotmail.com
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