segunda-feira, 27 de maio de 2013

Enredos de um filho do Líbano

Samir Yazbek é um dramaturgo em ascendência. Filho de libaneses, ele nasceu em São Paulo, mas buscou na terra dos pais referências para muitas das suas peças de teatro. Agora, escreve texto sobre Gibran Khalil Gibran.



São Paulo – Ainda pequeno, Samir Yazbek ouvia atentamente as histórias que a mãe libanesa contava sobre sua terra de origem. As belas lembranças da mãe, depois o diário dado por ela ao filho um pouco antes de morrer ajudaram a alimentar a imaginação do dramaturgo, que nos primeiros textos que escreveu para o teatro mostrou que tinha entrado na vida artística para fazer par com os bons contadores de história, fama que levam os árabes mundo afora. Yazbek, premiado escritor brasileiro de peças teatrais, buscou referências no local de nascimento dos seus pais e redondezas para criar duas das suas peças, As Folhas do Cedro e A Terra Prometida. Agora, ele escreve outra peça sobre o pensador libanês Gibran Khalil Gibran.
Fernando Stankus/Divulgação
Em Fogo-Fátuo, Yazbek (esq.) atua
O texto a respeito do intelectual libanês vai ter como referência o período que Gibran viveu em Nova York, nos Estados Unidos. Yazbek quer mostrar as dificuldades de um homem viver a sua espiritualidade em uma cidade grande. “O choque diante da cidade foi muito grande. Houve um fascínio, mas ao mesmo tempo ele sabia que aquilo era um monstro que podia engolir as pessoas”, diz Yazbek sobre Gibran. Uma leitura dramática deste texto fará parte das comemorações dos 130 anos do nascimento do intelectual libanês e deverá ser apresentada no segundo semestre do ano no Sesi da Avenida Paulista, na cidade de São Paulo.

Em As Folhas do Cedro, Yazbek resgata um pouco da sua história familiar ao narrar as memórias de uma filha cujo pai, imigrante libanês desembarcado em São Paulo, partiu para a Amazônia para fazer fortuna. A criação tem como base a própria vida de Yazbek e seus quatro irmãos, que foram criados pela mãe, na capital paulista, enquanto o pai ganhava a vida no Norte do Brasil, processo que resultou na separação do casal. Já A Terra Prometida é a menos árabe das peças árabes do dramaturgo e trata do Oriente Médio quando conta a saída do povo judeu em busca da terra prometida. Por isso, também acaba abordando a questão palestina.
O árabe

Apesar dos traços faciais herdados dos árabes e da habilidade de contar histórias e fazer poesia com as palavras, Yazbek não se encaixa no estereótipo dos árabes que existe no Brasil, de homens negociadores e falantes. Nem ele fala árabe. Caçula, Yazbek conviveu com a mãe quando esta já tinha o domínio do português e por isso acabou se distanciando do idioma, o que não aconteceu com o irmão mais velho, Mustafa Yazbek, que também é escritor. O dramaturgo foi conhecer o Líbano há cerca de três anos e lá encontrou vários dos seus parentes e foi bem recebido. Foi a oportunidade, relata ele, de construir o seu próprio Líbano, já que aquele com o qual ele convivia na imaginação era herdado das lembranças da mãe.
Isaura Daniel/ANBA
Yazbek: criação, atuação e ensino
Tanto a mãe quanto o pai de Yazbek nasceram no Líbano. Os dois se casaram lá e vieram para o Brasil sem filhos, primeiramente para o Paraná, onde tinham parentes. Passaram um tempo na Colômbia e depois retornaram ao Brasil, então para São Paulo, onde o escritor de teatro nasceu. O pai acabou indo morar no Amazonas por oportunidades de trabalho e a mãe ficou com os filhos em São Paulo. De família cristã ortodoxa, Yazbek já na escola começou a fazer teatro. Além das narrativas da mãe, ele acredita que foi influenciado também a seguir o caminho da arte pelo irmão mais velho, escritor, e pela irmã, que o levava ao teatro.

Mas assim que se viu adulto, Yazbek não queria viver de escrever ou fazer teatro. Então começou a cursar Física na Universidade de São Paulo (USP). Começou também Filosofia. Mas descobriu o Centro de Pesquisa Teatral do Sesc, e ali o seu guru na carreira, Antunes Filho, e se rendeu. Fez então faculdade de Cinema na Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP). Yazbek ficou por oito anos acompanhando Antunes Filho no Sesc e ali começou a escrever os seus promissores textos. “Ele tinha paixão pela dramaturgia, pela palavra, me entusiasmava muito”, diz.
O sucesso

Yazbek rascunhou outros textos, mas O Fingidor foi o primeiro que despontou e fez sucesso. E bastante sucesso. Pela peça, que trata do poeta Fernando Pessoa, ele recebeu o Prêmio Shell de melhor autor em 1999. O texto foi selecionado em um programa do governo federal e distribuído para 475 mil alunos da rede pública brasileira de ensino e representou o Brasil em vários festivais internacionais. As peças teatrais que foram escritas na sequência também foram aclamadas, premiadas e bem recebidas pela crítica.
Fernando Stankus/Divulgação
As Folhas do Cedro: família libanesa
Atualmente está em cartaz o espetáculo de Yazbek O Fogo-Fátuo, inspirado no mito de Fausto, e ele já está escrevendo Frank-1, baseado no mito de Frankenstein. Só que o personagem criado pelo dramaturgo, em vez de feio de alma bonita, é um bonito sem alma.Fogo-Fátuo teve co-autoria do ator Helio Cicero, com o qual Yazbek mantém a companhia teatral Arnesto nos Convidou. Yazbek publicou várias das suas peças como livro, algumas no exterior, e também teve peças montadas lá fora. Ele também teve uma peça sua, O Ritual, estreada de forma inédita no National Theatre, de Londres, após passar por uma seleção internacional.

Yazbek também dá aulas em instituições de ensino como a Escola Superior de Artes Celia Helena e na escola profissionalizante com o mesmo nome, além de ter lecionado na FAAP por sete anos e ter sido assistente do curso de Artes Cênicas da USP. Olhando para trás e ciente de que há um caminho promissor pela frente, Yazbek diz: “Eu tenho privilégio de ter passado por tudo isso e alcançado reconhecimento, os apoios têm permitido que eu vá adiante”, afirma.

O dramaturgo agora se prepara para uma programação no Sesc que vai fazer um apanhado da sua obra, mostrando montagens como As Folhas do CedroFogo-Fátuo, entre outras. Recentemente ele voltou a trabalhar também como ator e diretor nas suas próprias peças teatrais.

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