Este é um momento de juntar forças para impedir o avanço da agenda conservadora que inclui medidas repressivas como a lei “anti-terrorismo” e a redução da maioridade penal
Maria Luisa Mendonça
Maria Luisa Mendonça
As mobilizações massivas, nunca vistas nas últimas décadas, estimulam a reflexão coletiva e o debate político, mais do que necessário no Brasil. Essa é a melhor notícia que poderíamos ter, apesar de estarmos com a sensação de nadar em águas turvas, porém com muitos pontos luminosos.
O início das mobilizações foi singular por apresentar uma pauta mais do que clara - a redução da tarifa dos transportes - que foi vitoriosa. Essa pauta foi capaz de aglutinar a juventude organizada, movimentos sociais, partidos de esquerda, assim como uma multidão bastante diversa que busca participação política. Portanto, não existe nada de “apolítico” neste processo. A aversão a um processo que se demonstra completamente “político” (no sentido amplo da palavra) foi orquestrada pela mídia conservadora e seus porta-vozes.
A partir dos primeiros protestos em São Paulo, a repressão policial foi rechaçada e uma multidão ainda maior tomou as ruas do país. Este pode ser um indício de que a sociedade não está disposta a aceitar a violência do Estado. Em retrospectiva, era de se esperar que os setores reacionários orquestrassem uma reação, como ocorreu ontem com claros casos de grupos infiltrados nas manifestações para justificar a repressão policial.
O discurso fascista anti-partido preocupa, mas não pode tomar o centro da agenda. Estes atos isolados são criados justamente para gerar medo e apagar o que importa no debate – mudanças estruturais capazes de fazer avançar a luta por direitos. Este processo será necessariamente longo e deverá incluir pautas históricas dos movimentos sociais. Ao mesmo tempo, este é um momento de juntar forças para impedir o avanço da agenda conservadora que inclui medidas repressivas como a lei “anti-terrorismo” e a redução da maioridade penal. No meio rural, o agronegócio também impõe violência, com a repressão a povos indígenas e camponeses.
Outra estratégia da direita é emplacar o discurso sobre o medo da inflação. Segundo estes setores, a inflação seria um “fantasma” ou uma espécie de força sobrenatural assustadora. A vulnerabilidade da economia brasileira tem sua raiz justamente na década de 1990 com a privatização de serviços públicos, que atrelaram suas tarifas à taxa de câmbio. Por sua vez, os governos de Lula e Dilma seguiram com uma espécie de malabarismo econômico que não permitiu mudanças estruturais que atendessem as demandas sociais por reforma agrária e urbana.
A vulnerabilidade econômica atual tem origem na continuidade do apoio estatal a grandes empresas, que se dizem “produtivas”, mas na verdade contribuem com a especulação financeira ao atuar nos mercados de derivativos, de câmbio e de commodities. Este será o grande nó político e econômico a ser desatado para gerar transformações no longo prazo.
Maria Luisa Mendonça é jornalista e coordenadora da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos.
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