Estudo desenvolvido no IEL demonstra como anedotas podem ampliar preconceito
PATRÍCIA LAURETTI
PATRÍCIA LAURETTI
Há muitos que consideram as piadas ou “enunciados” politicamente incorretos, preconceituosos, sem graça. “Qual discurso se constrói a partir da leitura dessas piadas? Como essa piada circula, e de que forma as pessoas se manifestam sobre aquele enunciado, foram algumas das minhas indagações iniciais”, diz. O método para estudar as piadas veio da Análise do Discurso (AD), um campo da Linguística que estuda o funcionamento dos sentidos na relação da língua com a história, isto é, objetiva analisar as condições de produção de determinado discurso. Para as teorias da AD, todo discurso é construído historicamente.
PREGUIÇA HISTÓRICA
Outro estereótipo verificado nas piadas analisadas pelo autor é o do baiano ignorante. É possível, ressalta, que o estereótipo esteja relacionado com a migração em massa do nordestino para outros cantos do país a partir da década de 50. “A Bahia oferecia mão de obra barata, sem estudo, que acabava ocupando dessa forma sempre cargos marginais. Nesse caso, o baiano é caracterizado a partir do outro escolarizado, detentor de cargos socialmente valorizados e bem remunerados”, assinala.
Nas piadas, a figura que está sendo tratada como objeto do riso já sofreu retaliações e, por isso, quem reconhece a história não acha graça na piada, mesmo tratando-se de humor, acredita o autor, que também ressalta um dos aspectos do humor. “O texto humorístico é voltado para o riso, mas não é bem isso que acontece. Nem todo texto humorístico é encarado como tal”.
De acordo com Alan, nos últimos anos o texto humorístico, por ter como base o estereótipo, passou a ter a ênfase do preconceito. “Vários teóricos do humor afirmam que o humor trabalha com o rebaixamento, o mote inicial do humor é rebaixar seu adversário por vias de terceiros que ouvem e compartilham daquele riso. Hoje isso é encarado como politicamente incorreto”. O autor observa, no entanto, que as tentativas de impor limites ao humor vem desde a Antiguidade – rir das autoridades e políticos locais poderia ser um mau negócio. Na Idade Média, por exemplo, a Igreja era um dos alvos preferenciais. “A cada dia que passa, os grupos sobre os quais não se pode fazer piada defendem a existência do preconceito. É controverso porque os judeus, por exemplo, fazem piadas de judeus, brasileiros fazem piada sobre si mesmo”, afirma.
Alan enumerou algumas piadas e as dividiu em três grupos. As que trabalham com o estereótipo do baiano preguiçoso, as que tratam o baiano como ignorante, indesejado ou marginal e um terceiro tipo foi postulado, que seria chamado de “piada de resistência”, que trabalha com o estereótipo do baiano esperto, que sabe “dar o troco”. Porém, o pesquisador encontrou apenas um exemplar desta forma de piada.
“Nesta piada, o baiano está deitado numa rede, passa um paulista suado, de terno e gravata, e diz: ‘você sabia que a preguiça é um dos pecados capitais?’. Ao que o baiano responde: ‘a inveja também.’ ” Alan já decorou os enunciados: “nesse caso, se constrói um estereótipo a partir do estereótipo do outro”, acrescenta.
NÃO É SÓ NA PIADA
Além de considerar em suas conclusões que nem sempre o texto humorístico é visto como tal e que a piada de resistência não se sustentaria, Alan sintetizou algumas de suas ideias em paráfrases como “a preguiça baiana seria o simulacro da lentidão”. “Em comédia a gente vê o baiano lento; a preguiça seria a forma pela qual também está caracterizada essa lentidão”.
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