Adital
O relator da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre Tortura, Juan Méndez, afirma que a prática está enraizada no Estado brasileiro e é generalizada nos presídios brasileiros. Afirma também que a tortura ocorre com especial frequência nas primeiras horas da detenção e que o país falha na investigação e no julgamento desses casos.
Durante 12 dias em que esteve no país, no início deste mês de agosto, o especialista visitou presídios, delegacias, instituições socioeducativas e de saúde mental em São Paulo, Distrito Federal e em estados do Nordeste (Sergipe, Alagoas, Maranhão) – "uma área pouco coberta nas missões anteriores”, disse o relator em entrevista coletiva.
A última visita da relatoria ao Brasil aconteceu há 15 anos. A nova missão foi motivada por denúncia feita pelas organizadores de direitos humanos Conectas, Justiça Global e Sociedade Maranhense de Direitos Humanos, em março de 2014, no Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, Suíça. O Brasil vivia, então, uma das mais graves crises de seu sistema prisional, com pelo menos 63 mortes no período de um ano, no complexo prisional de Pedrinhas, Estado do Maranhão.
"As conclusões do relator, uma das maiores autoridades neste tema no mundo, evidenciam, mais uma vez, que temos um sistema carcerário falido e que apenas contribui para violações cotidianas dos mais básicos direitos. É dever do governo brasileiro dar seguimento às recomendações que serão apontadas no relatório”, ressalta Juana Kweitel, diretora de Programas da Conectas.
Sobre a desconfiança que parte da população brasileira tem sobre a necessidade de se respeitar os direitos dos presos e presas, Méndez afirma que "a pior maneira de combater o crime é permitir violações de direitos humanos porque isso gera mais violência, além de suscitar na população uma sensação de desconfiança em relação às instituições de aplicação da lei. A prevenção do crime deve se basear numa relação de confiança. O ciclo de vingança, tortura e violência coloca em xeque o Estado de Direito e a democracia”.
O relator condena ainda as práticas da revista intima vexatória de familiares de presos/as e afirma que "há modos de inspecionar e garantir a segurança sem humilhar”.
Juan Méndez saúda iniciativas como o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura e as audiências de custódia, que vêm sendo implantadas, de maneira experimental, com o apoio do Conselho Nacional de Justiça, em 10 estados. Afirma, no entanto, que estas medidas não têm sido suficientes para reduzir a superlotação dos locais de privação de liberdade. "Nós, definitivamente, encorajamos o Brasil a prosseguir com as audiências de custódia, mas, muito minimamente, elas conseguem impactar na taxa de encarceramento”. Por outro lado, o relator afirma estar "um pouco decepcionado com a investigação da tortura nas audiências de custódia”.
O relator da ONU aponta que a redução da maioridade penal será um erro porque agravará a situação nas unidades socioeducativas e também viola convenções internacionais: "a detenção de adolescentes não é usada como último recurso e as condições desses locais não servem para seu propósito original de educar e ressocializar”, assinala.
Com relação à privatização dos presídios, proposta apontada recentemente pelos deputados federais como saída para a crise no sistema carcerário, Méndez expressa grande preocupação de que essa tendência dificulte ainda mais a investigação e responsabilização dos responsáveis por maus tratos nas prisões.
Sem mencionar o iminente julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a descriminalização do uso de drogas ilícitas [previsto para esta quarta-feira, 19 agosto], o relator também alerta sobre o impacto da atual Lei de Drogas no sistema carcerário. Enfatiza que a aplicação da norma permite uma avaliação subjetiva por parte de delegados e juízes, resultando em detenções que não configurariam flagrante delito, mas, sim, "detenções arbitrárias”, segundo parâmetros internacionais.
As recomendações do especialista serão sistematizadas em um relatório, que será apresentado ao governo brasileiro e ao Conselho de Direitos Humanos da ONU, em março de 2016, e na Assembleia Geral das Nações Unidas, perante outros países.
O relator conclui afirmando que, no Brasil, há um ciclo de impunidade ao redor da tortura, que deve ser quebrado. "Estou convencido que a impunidade para esse crime foi herdada da ditadura militar”.
Julgamentos de tortura
Conforme o levantamento da pesquisa "Julgando a tortura”, publicada em janeiro deste ano, agentes públicos acusados de tortura têm mais chances de serem absolvidos do que atores privados (familiares, cônjuges e seguranças particulares, por exemplo). O estudo, produzido pela Conectas, IBCCrim [Instituto Brasileiro de Ciências Criminais], NEV-USP [Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo], Pastoral Carcerária e Acat [Ação dos Cristãos para a Abolição da Tortura], analisou 455 casos julgados em segunda instância por tribunais de todo o país e concluiu que os funcionários do Estado condenados em primeira instância foram absolvidos, em segundo grau, em 19% dos casos, praticamente o dobro de vezes dos agentes privados (10%)
Durante 12 dias em que esteve no país, no início deste mês de agosto, o especialista visitou presídios, delegacias, instituições socioeducativas e de saúde mental em São Paulo, Distrito Federal e em estados do Nordeste (Sergipe, Alagoas, Maranhão) – "uma área pouco coberta nas missões anteriores”, disse o relator em entrevista coletiva.
A última visita da relatoria ao Brasil aconteceu há 15 anos. A nova missão foi motivada por denúncia feita pelas organizadores de direitos humanos Conectas, Justiça Global e Sociedade Maranhense de Direitos Humanos, em março de 2014, no Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, Suíça. O Brasil vivia, então, uma das mais graves crises de seu sistema prisional, com pelo menos 63 mortes no período de um ano, no complexo prisional de Pedrinhas, Estado do Maranhão.
"As conclusões do relator, uma das maiores autoridades neste tema no mundo, evidenciam, mais uma vez, que temos um sistema carcerário falido e que apenas contribui para violações cotidianas dos mais básicos direitos. É dever do governo brasileiro dar seguimento às recomendações que serão apontadas no relatório”, ressalta Juana Kweitel, diretora de Programas da Conectas.
Sobre a desconfiança que parte da população brasileira tem sobre a necessidade de se respeitar os direitos dos presos e presas, Méndez afirma que "a pior maneira de combater o crime é permitir violações de direitos humanos porque isso gera mais violência, além de suscitar na população uma sensação de desconfiança em relação às instituições de aplicação da lei. A prevenção do crime deve se basear numa relação de confiança. O ciclo de vingança, tortura e violência coloca em xeque o Estado de Direito e a democracia”.
O relator condena ainda as práticas da revista intima vexatória de familiares de presos/as e afirma que "há modos de inspecionar e garantir a segurança sem humilhar”.
Juan Méndez saúda iniciativas como o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura e as audiências de custódia, que vêm sendo implantadas, de maneira experimental, com o apoio do Conselho Nacional de Justiça, em 10 estados. Afirma, no entanto, que estas medidas não têm sido suficientes para reduzir a superlotação dos locais de privação de liberdade. "Nós, definitivamente, encorajamos o Brasil a prosseguir com as audiências de custódia, mas, muito minimamente, elas conseguem impactar na taxa de encarceramento”. Por outro lado, o relator afirma estar "um pouco decepcionado com a investigação da tortura nas audiências de custódia”.
O relator da ONU aponta que a redução da maioridade penal será um erro porque agravará a situação nas unidades socioeducativas e também viola convenções internacionais: "a detenção de adolescentes não é usada como último recurso e as condições desses locais não servem para seu propósito original de educar e ressocializar”, assinala.
Juan Méndez, relator da ONU sobre Tortura, realizou missão no Brasil para visitar presídios. |
Com relação à privatização dos presídios, proposta apontada recentemente pelos deputados federais como saída para a crise no sistema carcerário, Méndez expressa grande preocupação de que essa tendência dificulte ainda mais a investigação e responsabilização dos responsáveis por maus tratos nas prisões.
Sem mencionar o iminente julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a descriminalização do uso de drogas ilícitas [previsto para esta quarta-feira, 19 agosto], o relator também alerta sobre o impacto da atual Lei de Drogas no sistema carcerário. Enfatiza que a aplicação da norma permite uma avaliação subjetiva por parte de delegados e juízes, resultando em detenções que não configurariam flagrante delito, mas, sim, "detenções arbitrárias”, segundo parâmetros internacionais.
As recomendações do especialista serão sistematizadas em um relatório, que será apresentado ao governo brasileiro e ao Conselho de Direitos Humanos da ONU, em março de 2016, e na Assembleia Geral das Nações Unidas, perante outros países.
O relator conclui afirmando que, no Brasil, há um ciclo de impunidade ao redor da tortura, que deve ser quebrado. "Estou convencido que a impunidade para esse crime foi herdada da ditadura militar”.
Julgamentos de tortura
Conforme o levantamento da pesquisa "Julgando a tortura”, publicada em janeiro deste ano, agentes públicos acusados de tortura têm mais chances de serem absolvidos do que atores privados (familiares, cônjuges e seguranças particulares, por exemplo). O estudo, produzido pela Conectas, IBCCrim [Instituto Brasileiro de Ciências Criminais], NEV-USP [Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo], Pastoral Carcerária e Acat [Ação dos Cristãos para a Abolição da Tortura], analisou 455 casos julgados em segunda instância por tribunais de todo o país e concluiu que os funcionários do Estado condenados em primeira instância foram absolvidos, em segundo grau, em 19% dos casos, praticamente o dobro de vezes dos agentes privados (10%)
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