O sistema de ensino na Finlândia se consolida há anos como um modelo de igualdade no ensino. A condição é atestada pelos excelentes resultados que o país escandinavo apresenta nas pesquisas
Philippe Descamps
Philippe Descamps
Alguns vão achar difícil acreditar no que elas descrevem: uma escola sem tensão, sem competição entre os alunos, sem concorrência entre as instituições, sem inspetores, sem repetência, até mesmo sem nota nos primeiros anos, e que teria os melhores resultados do mundo.
Os resultados do Pisa atraíram um novo tipo de turista. Após uma visita em agosto de 2011, o então ministro francês da Educação Nacional, Luc Chatel, explicou: "Há uma série de receitas que vi funcionar aqui, que podem ser transpostas", sobretudo "a grande autonomia dada às escolas".3 Um ano depois, a revista britânica Socialist Review elogiava um sistema "desprovido de avaliações" e no qual "cada criança recebe um almoço saudável ao meio-dia".4 Quer venham da direita liberal francesa ou do trotskismo inglês, cada observador estrangeiro vem fazer sua feira, em busca dessa ou daquela inovação que, isolada do resto, validará seu próprio projeto.
Na maioria das vezes, a imprensa internacional ignora as condições específicas da gênese do "modelo", ao qual várias obras cativantes foram consagradas.5 No entanto, aqui, "descentralização" não é sinônimo de territórios em competição; falar de "envolvimento" dos professores não se resume à vontade de aumentar suas horas de "presença" nas escolas; e promover a "moderação" das despesas não disfarça o desejo de favorecer prestadores privados. "Esqueçam o Pisa!", dispara Jukka Sarjala, um dos arquitetos da reforma escolar na década de 1970. "É claro que estamos orgulhosos desse reconhecimento do nosso trabalho. Mas temos de olhar para nosso sistema como um todo, e não bicar esse ou aquele aspecto."
O sucesso finlandês tem suas raízes na tradição política dos países nórdicos, ligada às realizações concretas do Estado de bem-estar social, mais do que a uma doutrina. Instado a revelar a elogiada receita pedagógica em uma mesa-redonda da rede de televisão norte-americana PBS, em 10 de dezembro de 2010, o professor Pasi Sahlberg respondeu com um amplo sorriso: "Você sabe, entre nós a escola é gratuita para todos, desde o curso preparatório até a universidade!". Com base nesses pressupostos, é difícil levar adiante comparações com o modelo dos Estados Unidos...
Na Finlândia, a gratuidade não se aplica apenas ao ensino. Até os 16 anos, todos os suprimentos são bancados pela comunidade, bem como o apoio escolar, a cantina, as despesas de saúde e o transporte para a instituição. O financiamento vem principalmente dos 336 municípios, mas o Estado central harmoniza a distribuição dos recursos. Se por um lado ele participa com apenas 1% do orçamento da escola no município mais rico, Espoo (perto de Helsinque), por outro, ele garante 33% dos recursos na média dos municípios,6 chegando a até 60% nas comunidades pobres. O governo também desestimula a abertura de escolas privadas. Elas praticamente desapareceram na década de 1970 (menos de 2% dos efetivos, contra 17% na França), com exceção de escolas associativas de pedagogias alternativas, do tipo Steiner ou Freinet.
Esse serviço público unificado não se mostra particularmente caro, muito pelo contrário. Em paridade de poder aquisitivo, a Finlândia gasta menos dinheiro por aluno no ensino primário e secundário do que a média dos países ocidentais, e muito menos do que os Estados Unidos ou o Reino Unido.7 A ênfase foi colocada na qualidade da supervisão, no número e na formação dos professores: a profissão do magistério tornou-se altamente respeitada e muito cobiçada, ainda que exija uma longa formação (pelo menos cinco anos de universidade, em geral mais) e que os salários acompanhem mais ou menos a média ocidental:8 significativamente mais altos do que os salários franceses no início de carreira (36% mais no fundamental, 27% no médio), eles se aproximam no fim da carreira. Apenas um candidato a professor em dez atinge seu objetivo. Também se espera dos docentes um envolvimento tão forte que não é incomum que alguns confiem seu número de telefone ou endereço de e-mail aos pais. Uma boa parte da formação (no mínimo um ano) não é dedicada ao conteúdo a ser transmitido, mas à pedagogia: a maneira de transmitir.
Ameaça no horizonte
Enquanto o modelo internacional se baseia em indicadores de desempenho, auditorias e rankings, os pedagogos finlandeses defendem outro uso das avaliações. Elas devem continuar a ser uma ferramenta para ajuste dos meios ou dos métodos a serviço do desenvolvimento de professores e crianças, nunca uma ferramenta de controle ou de competição. É por isso que as avaliações são realizadas por amostragem, e não em nível nacional. Cada um fica sabendo de seus resultados, mas não os de outras escolas. Vários municípios também lutaram contra os jornais que queriam publicar as classificações. E, quando os tribunais deram perda de causa à administração, boa parte da imprensa preferiu guardar silêncio.
"Na década de 1990, encorajou-se a competição entre as escolas, e um conservador eleito de Helsinque chegou a convidá-las a fazer publicidade. Hoje entendemos que foi um erro", explica Susse Huhta, professor de finlandês em Helsinque. Com a abolição da obrigatoriedade de frequentar a escola de seu bairro, a busca pelas escolas mais conceituadas, até então marginal, tornou-se um fenômeno importante na capital, onde 30% das crianças no oitavo ano (13 anos) não frequentam o estabelecimento da sua região. Isso só fez provocar um rápido crescimento das desigualdades sociais na Finlândia, segundo Tuomas Kurttila, diretor da Associação de Pais: "Nossa política educacional corre o risco de se tornar uma simples vitrine, enquanto nossas políticas sociais se degradam. Os sucessos de hoje foram construídos nas décadas de 1970 e 1980. O sucesso de amanhã se constrói hoje. Ainda há muitas crianças que não vão além da escolaridade obrigatória. Estou otimista, mas temos de permanecer vigilantes diante do crescimento das disparidades". "Pedimos à escola que responda a todos os problemas da sociedade, algo que ela dificilmente pode fazer", acrescenta Petri Pohjonen, vice-diretor do Escritório Nacional de Educação.
Depois de ter dirigido por um longo tempo uma escola e em seguida o departamento de ensino da cidade de Vantaa, vizinha a Helsinque, Eero Väätäinen resume um sentimento generalizado entre os professores finlandeses: "Devemos ter em mente que as crianças não estão na escola para passar nas provas. Elas vêm aprender a vida, encontrar seu próprio caminho. É possível medir a vida?". No país europeu mais bem colocado nos rankings internacionais, as pessoas veem com muita desconfiança... os rankings.
Philippe Descamps é jornalista
Ilustração: Orlando
1 OCDE (2011), Résultats du Pisa 2009 [Resultados do Pisa 2009], em seis volumes, Edição OCDE, Paris.
2 Estatística da OCDE, 2010.
3 "En visite en Finlande, Chatel prépare la rentrée et 2012" [Em visita à Finlândia, Chatel prepara o retorno em 2012], Les Échos, Paris, 19 ago. 2011.
4 Terry Wrigley, "Growing up in Goveland: how politicians are wrecking schools" [Crescer em Goveland: como os políticos estão destruindo escolas], Socialist Review, Londres, jul.-ago. 2012.
5 Paul Robert, La Finlande: un modèle éducatif pour la France? Les secrets de la réussite [Finlândia: um modelo educacional para a França? Os segredos do sucesso], ESF Editor, 2008. Pasi Sahlberg, Finnish lessons: what can the world learn from educational change in Finland? [Lições finlandesas: o que o mundo pode aprender com a mudança educacional na Finlândia?], Teachers College Press, 2011. Hannele Niemi, Auli Toom e Arto Kallioniemi, Miracle of education, the principles and practices of teaching and learning in Finnish schools [Milagre da educação: os princípios e práticas do ensino e do aprendizado nas escolas finlandesas], Sense Publishers, 2012.
6 Dados do Escritório Nacional de Educação, agência independente encarregada do acompanhamento dos programas e da avaliação do ensino médio e fundamental.
7 OCDE, Regards sur l'éducation [Olhares sobre a educação], 2010.
8 Idem.
2 Estatística da OCDE, 2010.
3 "En visite en Finlande, Chatel prépare la rentrée et 2012" [Em visita à Finlândia, Chatel prepara o retorno em 2012], Les Échos, Paris, 19 ago. 2011.
4 Terry Wrigley, "Growing up in Goveland: how politicians are wrecking schools" [Crescer em Goveland: como os políticos estão destruindo escolas], Socialist Review, Londres, jul.-ago. 2012.
5 Paul Robert, La Finlande: un modèle éducatif pour la France? Les secrets de la réussite [Finlândia: um modelo educacional para a França? Os segredos do sucesso], ESF Editor, 2008. Pasi Sahlberg, Finnish lessons: what can the world learn from educational change in Finland? [Lições finlandesas: o que o mundo pode aprender com a mudança educacional na Finlândia?], Teachers College Press, 2011. Hannele Niemi, Auli Toom e Arto Kallioniemi, Miracle of education, the principles and practices of teaching and learning in Finnish schools [Milagre da educação: os princípios e práticas do ensino e do aprendizado nas escolas finlandesas], Sense Publishers, 2012.
6 Dados do Escritório Nacional de Educação, agência independente encarregada do acompanhamento dos programas e da avaliação do ensino médio e fundamental.
7 OCDE, Regards sur l'éducation [Olhares sobre a educação], 2010.
8 Idem.
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