A cidade do norte, que por muito tempo permaneceu afastada do conflito que tomava conta do país, entrou em combate em meados de julho
Cécile Hennion
Cécile Hennion
Combatente rebelde sírio atira durante confrontos contra forças leais a Bashar Assad na cidade de Aleppo
Será que Aleppo se tornará, como jura um militante local, "o túmulo do exército de Bashar al-Assad"? Aleppo, que é a segunda maior cidade do país com cerca de 2 milhões de habitantes, por muito tempo foi o carro-chefe da economia síria, e por sua proximidade com a Turquia, goza de uma posição geográfica estratégica. Portanto, a batalha que ocorre ali desde julho é uma questão capital tanto para o regime quanto para seus adversários.
Aleppo não tem a reputação de uma cidade dócil. Em 1982, junto com Hama ela foi palco de uma rebelião conduzida pela Irmandade Muçulmana contra o regime de Hafez al-Assad. A repressão, que resultou na destruição de Hama e na morte de 10 mil a 20 mil de seus habitantes, foi menos cruel em Aleppo, mas deixou seus rastros.
Apesar de incessantes apelos dos militantes, a cidade parecia impenetrável ao clima de insurreição que se apoderara da Síria em março de 2011. Enquanto Deraa, Homs, Hama e Idlib efervesciam, a rica cidade do norte permanecia em silêncio, exceto pelas manifestações na universidade.
"Os comerciantes apoiavam o regime, eles queriam continuar com suas atividades a qualquer custo", explica um porta-voz do Exército Livre Sírio (ELS) para o setor oeste de Aleppo, em entrevista pelo telefone. Mas a razão principal que adiou a entrada de Aleppo na revolução foi a presença maciça das forças de segurança e dos shabiha --milicianos a mando do regime-- que ali fizeram reinar o terror.
A revolta não fermentava em Aleppo, onde viviam em harmonia uma maioria de muçulmanos sunitas e grandes comunidades armênias e curdas, mas ela logo chegou ao interior, onde manifestações eram organizadas.
Os primeiros combates em Aleppo tiveram início em meados de julho, com uma intensidade que pegou o regime de surpresa, mas também inúmeros militantes que já não esperavam mais. Na verdade, os rebeldes vieram em sua grande maioria das zonas rurais. Eles eram soldados desertores, lavradores ou agricultores.
A violência logo se voltou contra os shabiha e o temido clã Nabih, cujo chefe, Zino Berrih, foi massacrado no dia 31 de julho por uma multidão ensandecida. As imagens de sua execução se espalharam pela internet. Pela primeira vez, o ELS foi acusado por abusos que ninguém podia negar ou atribuir ao regime.
Um concentrado da guerra
Em muitos sentidos, a batalha de Aleppo aparece como um concentrado daquilo que a guerra na Síria tem de mais radical. Enquanto os bombardeios aéreos e de artilharia assolam a cidade, os ricos fogem para Damasco ou para o exterior. Alguns aderiram de longe à insurreição financiando os rebeldes. Os mais pobres vão mudando de bairro, dependendo das derrotas e das vitórias.
Desde o início dos combates, pelo menos 4.792 habitantes de Aleppo, civis ou rebeldes, foram mortos, segundo a contagem do Centro de Documentação das Violações na Síria, um grupo de militantes de direitos humanos. Um número que exclui as baixas do exército regular e os mortos estrangeiros.
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Essa é uma outra especificidade de Aleppo: única cidade insurgente a dispor de uma região de retaguarda "libertada" e de uma porção de fronteira por ela controlada, ela se tornou o destino lógico dos combatentes estrangeiros. Para lá se dirigiram revolucionários que queriam combater pela causa da "primavera árabe" e jihadistas, afiliados ou não à Al-Qaeda.
Entre estes últimos, Jabat al-Nousra, que apareceu na Síria em janeiro, fez de Aleppo seu campo de batalha privilegiado. Mais bem armados e mais bem treinados que os soldados do ELS, seus homens se mostraram superiores (às vezes com sua visão muito radical do islamismo) apesar das reticências iniciais de parte das brigadas rebeldes.
Mais ou menos reunidas sob o comando do conselho militar do ELS, as brigadas rebeldes (a principal delas sendo At-Tawhid, com 116 batalhões) hoje conduzem operações conjuntas regulares com Jabat al-Nousra.
Inicialmente mal equipado, o ELS viu sua eficácia ser consideravelmente melhorada graças a essa parceria e com a tomada de dois grandes galpões de armamentos em Lahan Khan e em Touman.
Ainda que afirme controlar 80% da cidade, o ELS ainda não conseguiu se impor em toda Aleppo. As batalhas decisivas agora estão acontecendo do lado de fora.
O principal alvo dos rebeldes é o vilarejo xiita de Zaharaa, cerca de vinte quilômetros ao noroeste, a partir do qual a artilharia do regime vem bombardeando toda a região. Segundo a mesma fonte do ELS contatada pelo "Le Monde", Zaharaa estaria atualmente cercada pelos rebeldes e abastecida somente por helicóptero.
A outra grande batalha está ocorrendo perto do aeroporto de Aleppo, onde houve combates muito violentos na noite de 27 de dezembro entre os insurgentes e o 18º batalhão do exército de Bashar al-Assad, último baluarte do regime antes da tomada desse local altamente estratégico.
Tradutor: Lana Lim
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