A correlação de forças entre os lobbies LGBT e religioso é terrivelmente desigual. Obviamente, parte desse desequilíbrio é reflexo também da sociedade que escolhe seus representantes
Vange Leonel
Vange Leonel
A revista Fórum fez, em abril, uma matéria de capa sobre a crescente influência de religiosos no cenário político brasileiro. Para nós, LGBTs e feministas, este projeto de poder de segmentos fundamentalistas das igrejas católicas e neopentecostais ameaça direitos já conquistados e barra aqueles que ainda queremos ver aprovados. A descriminalização do aborto e a lei anti-homofobia são bandeiras nossas que enfrentam fortíssima oposição no Congresso.
Será que nós, LGBTs, poderemos um dia contar com um lobby tão poderoso e eficiente como o dos religiosos no Congresso? As igrejas têm um rebanho enorme, um discurso simplista calcado num moralismo rasteiro, dízimos que engordam suas caixinhas, programas na televisão aberta e ainda por cima contam com isenção de impostos.
Os movimentos e ONGs LGBTs dependem majoritariamente de patrocínios de órgãos governamentais, alguma benemerência e doações de anônimos. Temos pouquíssimos representantes no Congresso, não temos dinheiro para fazer lobby ou promover candidatos, nosso discurso é complexo e evitamos as armadilhas de um moralismo simplório.
Enfim, a correlação de forças entre os lobbies LGBT e religioso é terrivelmente desigual. Obviamente, parte desse desequilíbrio é reflexo também da sociedade que escolhe seus representantes. Entretanto, a maneira como os religiosos colocam seus representantes no Legislativo não é lá muito justa.
Vou explicar. Nos Estados Unidos, por exemplo, a lei tributária prevê isenção de impostos para as igrejas, mas esse privilégio é cortado imediatamente se alguma dessas instituições fizer campanha política para algum candidato. Observem: ninguém lá proíbe que as igrejas façam campanha, mas, se o fizerem, terão que pagar impostos como qualquer outra organização. A mesma lei vale para ONGs seculares e isentas de taxação.
Assim, vejo alguns caminhos para o fortalecimento das ONGs e dos movimentos LGBT. Um deles passa por uma maior autonomia financeira. O financiamento público é necessário e desejável, mas até para que esse dinheiro apareça, precisamos de recursos privados para fazer lobby no Congresso. Outra frente é batalhar para a implementação de uma lei parecida com a que citei anteriormente, retirando privilégios tributários das igrejas que fazem campanhas políticas. Como já existem muitos políticos membros de igrejas legislando em causa própria, o desafio será enorme, mas não menos estimulante.
Apenas um parêntese final. A matéria da Fórum de abril ressaltou que não são apenas os religiosos que barram as discussões dos direitos LGBT no Congresso, vide o deputado Jair Bolsonaro. Por outro lado, existem segmentos progressistas em algumas igrejas que apoiam causas feministas e LGBTs. De qualquer maneira, uma maior autonomia financeira dos movimentos LGBT virá a calhar. É a economia, estúpido!
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