quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Controle do sexo, controle da vida


  27/02/2013

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Velhas formas de repressão caducaram, mas sociedade permanece incapaz de aceitar sexualidade liberta e criativa, por seu imenso poder questionador
Por Katia Marko, editora da coluna Outro Viver | Imagem: Gustaf Klimt, Serpenttes do Mar
Na coluna passada comecei a abordar o tema “prazer” e me senti desafiada a ir além, pois entre Eros e Thánatos, parece que o instinto de morte está dominando as relações sociais.
Segundo a mitologia grega, Eros, o deus do amor e da sensualidade, nos ensina a amar, a cultivar amizades autênticas, a apreciar as artes, as ciências, e tudo de bom e belo que existe no mundo. Ele nos dá a energia necessária para sentir-nos motivados, cheios de entusiasmo e alegria, para conduzir a vida com sentido, e contribuir com nossa parcela de talento para o progresso da humanidade.
Por sua vez, Thánatos nos atrai para a morte. Ele extrai do nosso ser toda energia, toda vitalidade. Vivemos nossa existência sem propósito, sentimo-nos apáticos, carentes de motivação. Não achamos graça em nada. Tudo é fastio, tristeza, insatisfação, constrangimento. Experimentamos uma existência de cor cinza, vendo os dias e as noites passarem, sentindo o final inevitável se aproximar.
No trabalho de autoconhecimento que desenvolvemos na Comunidade Osho Rachana, prazer e sexualidade são questões tratadas como muita seriedade, pois acreditamos serem a chave do ser. Dizer que as pessoas têm medo do sexo soa quase tão absurdo quanto dizer que elas têm medo da vida. Mas a realidade é que tanto a vida como o sexo possuem aspectos assustadores para as pessoas. Isso porque a vida e o sexo são imprevisíveis, estão além do ego, são de natureza intrinsecamente explosiva.
Contudo, é precisamente esta qualidade da vida, sua mágica, sua criatividade, este seu lado explosivo que nossa cultura dominante está tentando suprimir. Procuramos controlar o processo da vida para nos defender de suas vicissitudes, sem quase perceber que para fazer isso devemos nos transformar num aparato mecânico.
No livro Medo da Vida, o médico-psiquiatra Alexander Lowen, criador da Bioenergética, afirma que a monotonia da vida é efetivada pela supressão sexual. “É evidente que o sexo não pode ser totalmente suprimido, uma vez isso acabaria com a atividade reprodutiva. O que se suprime é o lado repentino, explosivo, encantador, da sexualidade. No passado, isso era alcançado com um código moral que limitava sua expressividade. Atualmente este código está praticamente desativado pela remoção de todos os limites e barreiras à expressão sexual, mas o fizemos de tal modo que a vida se tornou ainda mais monótona. Explorando comercialmente o sexo, fazendo divulgações vulgares e pornográficas, impedimos o acúmulo da excitação até aquele ponto em que pode ocorrer uma explosão, uma quebra. Nos nossos tempos, o sexo tornou-se uma produção, não uma criação”.
Lowen, assim como outros estudiosos do assunto, defende que o sexo é a mais intensa manifestação do processo vital. Controlando o sexo, controla-se a vida. “Podemos brincar com sexo das maneiras mais sensuais, mas morremos de medo de explodir num orgasmo de júbilo e êxtase”. Essa visão de sexualidade baseia-se nas ideias de Wilhelm Reich que chamava esse medo de “ansiedade do orgasmo”. Ele descrevia o orgasmo como uma convulsão corporal total, vivida como extremamente agradável e satisfatória. Sua função é descarregar toda a excitação excedente ou energia, no orgasmo. Essa descarga deixa a pessoa em estado de completo relaxamento e paz. Reich denominava a capacidade para uma tal descarga de “potência orgástica”, equacionando-a à saúde emocional.
No livro A Função do Orgasmo, ele afirma que a saúde psíquica depende da potência orgástica, do ponto até o qual o indivíduo pode entregar-se e pode experimentar o clímax de excitação no ato sexual natural. “No caso da impotência orgástica, de que sofre a esmagadora maioria, ocorre um bloqueio da energia biológica, e esse bloqueio se torna a fonte de ações irracionais. A condição essencial para curar perturbações psíquicas é o restabelecimento da capacidade natural de amar.”
Ainda segundo Reich, “as enfermidades psíquicas são a conseqüência do caos sexual da sociedade. Durante milhares de anos, esse caos tem tido a função de sujeitar psiquicamente o homem às condições dominantes de existência e de interiorizar a dinâmica externa da vida. Tem ajudado a efetuar a ancoragem psíquica de uma civilização mecanizada e autoritária, tornando o ser humano incapaz de agir independentemente”.
Além de apaixonante, o estudo das relações entre corpo e sociedade, que Reich tanto impulsionou, explica muito de como estão estruturadas as relações humanas atuais. Será assunto para debater em detalhes, nas próximas colunas

Katia Marko é jornalista, terapeuta bioenergética e uma pessoa em busca de si mesma. Para ler todos os seus textos publicados em Outras Palavras, clique aqui

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