quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

CORONEL PEDRO JOSÉ ABOUDIB (1873 – 1947) - 7- MEMÓRIA DA IMIGRAÇÃO LIBANESA


Em Haya, o edifício em que se realizou a conferencia de paz em 1905. Nesta famosa assembléia, se reuniram 44 nações. ‘’Aqui sentou-se o embaixador, Ruy Barbosa. Era o menor na estatura, mas o mais alto no saber. ‘’ Essas palavras levaram ao auge meu entusiasmo. Abracei o guia, declarando-me brasileiro. Passei alguns dias em Londres e, de volta a Paris, tomei passagem no vapor Ortega, regressando ao Brasil. Nas vésperas do Natal estava já em Benevente com minha família.

Em 1911 comprei uma lancha a vela. Reformei-a adaptando-lhe um motor e batizei-a com o nome de Zgharta, minha cidade natal. Comprei dois armazéns com instalações e maquinismo para beneficiar café. Nesta época dei sociedade a meu irmão Paulo, pai de Carlos Aboudib, e a meu sobrinho por afinidade, Philadelpho Fernandes. Fiz o capital de ambos cabendo-lhes nos lucros 33% e a mim 34%. Em 1912, fiz construir em Barra do Itapemirim, o navio que denominei “Moniz Freire”, sendo o governador Marcondes de Souza. A inauguração que constituiu numa passeata na baia “barra de Vitória”, comparecera o representante do Presidente do Estado, jornalistas, o próprio Moniz Freire (então no ostracismo) e, por acaso, estando de passagem no porto, o Senador Lauro Sodré que também participou da festividade a convite de Moniz. Desse encontro nunca esqueceu o ilustre Senador pelo Pará, tratando-me com simpatia sempre que nos víamos.

De 1913 a 1914, fiz uma viagem a Bahia para comprar 2 navios de aço de construção holandesa, para pesca e a motor. No momento de passar a escritura por 200 contos, o tabelião fez duas guias para pagamento dos impostos: estadual 7% e federal 5%. Recusei-me, alegando que seria inconstitucional que um objeto pagasse 2 impostos. Consultei o Dr. Sales Guerra que confirmou o veredicto do tabelião, com o qual não me conformei. Pelo cabo submarino, resolvi telegrafar ao Dr. Moniz, conhecedor de leis, nos seguintes termos:

“Dr. Moniz- Barão de Amazonas, 19 – RIO.- Comprei dois navios pt. Pede dois impostos estadual 7% federal 5%. Devo pagar ambos? Qual devo pagar? Responda urgente, Rua Chile3 pt.

Horas depois, recebi a seguinte resposta: Pedro José – Rua Chile, 3- Nenhum pt. Apenas dois mil réis cada conto selo proporciona. Procurei então o advogado que redigira a escritura de venda e mostrei-lhe o telegrama de Moniz Freire. Ao tomar conhecimento do mesmo, admirou-se pois conhecia o valor de Moniz Freire como jurisconsulto e fora seu colega na Faculdade de Direito de São Paulo. Levou o caso ao conhecimento do então Presidente do Estado da Bahia, Dr. Antonio Moniz, o qual lhe sugeriu consultar a Ordem dos Advogados, que, após discutir o assunto, resolveu acatar a opinião de Moniz Freire.

Paguei então 400 mil réis de imposto em lugar dos 30 contos.

OS MONTEIROS

Como ficou dito atrás, em 1906 tive de deixar a minha casa comerial em Guarapari entregue a meu irmão e ao compadre Joaquim Castro, meu empregado. Apesar da confiança que neles depositava, os negócios não iam bem, devido principalmente, á tremenda guerra comercial que os Borges, chefes da política local no governo de Henrique Coutinho me moviam, não me era possível de Benevente ir a Guarapari zelar por meus interesses.

Em 23 de maio de 1908, tomando posse no cargo de presidente o Dr. Jerônimo Monteiro, no mesmo dia recebi um telegrama do saudoso D. Fernando Monteiro, bispo do E. Santo, irmão do presidente, chamando-me a Vitória. D. Fernando que anos antes estivera em Benevente em sua visita pastoral, já me considerava seu amigo, disse-me:

-“Já conversei com o presidente a seu respeito.  O Sr. Vá ao palácio, onde será bem recebido, e esteja certo de que serão tomadas todas as providências que o caso exige.” De fato esse ilustre espírito-santense recebeu-me amistosamente fazendo vir à minha presença o desembargador Carlos Gonçalves, chefe de polícia. Disse-lhe então: Sr. Carlos, quero dar ao Coronel Pedro José todas as garantias para que possa viajar livremente no município de Guarapari. Se for preciso mandar o corpo de Polícia, faça-o.

- Sim senhor, serão cumpridas as suas ordens, mas acho que convém ao Coronel Pedro José afastar-se um pouco da política.

A essa opinião tendenciosa  de um cooestaduano dos Borges, respondi: Sr. Presidente: se as providências que vossa Excia.  esta dando ao chefe de polícia tem alguma condição, agradeço-lhe muito, mas não posso aceitar isso, porque no dia em que houve o rompimento, entre Dr. Moniz e o presidente Coutinho, hipoequei ao Dr. Moniz minha solidariedade irrestrita e cumprirei minha palavra com o risco da própria vida.

- Sr. Carlos, as garantias ao Coronel Pedro José não tem condição. Poderá ele acompanhar o seu amigo e chefe nesse mesmo dia, minha cunhada de 23 anos de serviço, fora demitida pelo presidente Coutinho, foi reintegrada como professora pública.

Saí do palácio satisfeitíssimo.

No dia seguinte o jornal oficial estampava uma notícia dizendo que o Sr. Presidente do Estado havia deliberado, de acordo com o Dr.Dioclécio Borges, a volta do Coronel Pedro José para o município de Guarapari. Ao ler essa notícia, fui ao palácio episcopal agradecer ao querido D. Fernando Monteiro, sua intervenção, mas recusando o favor desde que me fosse oferecido por Dioclécio Borges. Compartilhando com meu aborrecimento, garantiu-me D. Fernando que, no dia seguinte, o jornal publicaria uma nota reparadora. Como de fato foi publicada uma nota nestes termos: Sua Excia. o Sr. Presidente do Estado, ao dar garantias ao Coronel Pedro José, não ouviu nenhuma pessoa.

Foi então que, a convite de amigos que levaram sua solidariedade ao ponto de irem buscar-me em Benevente, pude entrar em Guarapari triunfalmente. Mas já radicado em Benevente, para lá transferi todos os meus negócios deficitários em Guarapari.

Dos Monteiro, apesar de estarmos sempre em campo aposto na política, tive sempre provas de consideração e respeito. Sem falar em D. Fernando, cuja memória venero, recebi do Dr. Jerônimo Monteiro e do Dr. Bernardino Monteiro as mais inesquecíveis provas de simpatia devidas ao adversário leal. Da mesma forma travei relações com o Dr. Henrique de Novaes, sobrinho dos Monteiro, de quem fui amigo dedicado, merecendo a honra de ser convidado; muitos anos mais tarde, para padrinho de casamento de sua primeira filha, em 1928.

Por ocasião da solenidade da sagração do bispo espírito-santense D. Helvécio Gomes de Oliveira, no Rio de Janeiro, não mais existia o Dr. Moniz Freire, meu inesquecível e querido amigo. Convidou-me então o Senador Jerônimo Monteiro, seu ferrenho adversário, a ingressar no seu partido, excusei-me, procurando demonstrar que não tinha mais elementos como político. Respondeu-me que fazia questão da minha pessoa. Prometi pensar...

Certa vez, em Vitória, sendo Ministro da Agricultura (no governo Epitácio) o Dr. Simões Lopes, recebi de seu filho, Dr. Álvaro Simões Lopes, um amistoso telegrama podo-se à minha disposição para o que pudesse necessitar. É que, alguns anos antes, adoecendo o Dr. Álvaro de febre palustre, quando em viagem pelo E. Santo, eu procurara cercá-lo de todo conforto e assitência.

No gabinete de Ministro, recebeu-me o Dr. Álvaro  Simões Lopes, apresentando ao seu ilustre pai, ao qual encaminhou o requerimento em que eu solicitava fosse pago pelo Ministério, o frete dos maquinismos da usina de minha propriedade adquiridos em São Paulo. Apesar de estar vetada a lei orçamentária que facultava aos usineiros esse favor; foi deferido o meu pedido, graças a intervenção do Dr. Álvaro que enalteceu ao Ministro a importância de minha indústria no Espírito Santo.

Neste momento, surge à porta do gabinete, o Senador Jerônimo Monteiro. Um momento Senador, estamos tratando de interesses do seu Estado, disse o Dr.Álvaro. E eu subscrevo tudo o que o Coronel Pedro José pedir, respondeu-lhe o Senador Jerônimo Monteiro.

No fim do governo Marcondes fui eleito deputado pela vontade expressa do Dr. Moniz.
     
    -Tenho direito a cinco nomes na chapa estadual. Sabe que você é um desses cinco.

- Não aceito, Dr. Moniz, prefira Radagazio no meu lugar.

-Esta decidido. É você mesmo. Chegou a hora de dar uma demonstração pública de minha gratidão para com você. A sua vida esteve em jogo.

Fui eleito e tive o meu diploma. Mas acontece que, na reforma da Constituição, Deoclécio Borges promoveu a retirada de artigo anterior com a resolução expressa da necessidade de ser brasileiro nato. Na circunstância, o presidente Marcondes, havia posto na chapa Braz Vivacqua, de forma que foram impugnados meu reconhecimento e o do candidato do sul do Estado.

Nessa ocasião fui ao Rio, pois Dr. Muniz estava acamado por fratura, sabendo então por meu filho que ele havia passado para o Marcondes um telegrama um pouco áspero, disposto até o rompimento. Procurei imediatamente o Dr. Muniz pedindo-lhe desistir do meu lugar no Congresso. Respondeu-me a Constituição Federal permite serem os naturalizados até deputados federais, e que, por isso, se dispunha recorrer à ordem de habes-corpus ao Supremo Tribunal Federal. Para dissuadi-lo lancei mão de todo recurso, pedindo intervenção de vários amigos, inclusive Dr. Raul Martins. Dos encontros e intervenções de vários próceres, resultou convite do Jerônimo Monteiro para Ârgeo Monjardim (genro de Moniz) integrar a chapa e prova de não haver má vontade para comigo, ofereceu lugar para meu filho que assim, aos 19 anos, foi eleito Deputado Federal. Tive que aceitar.
Sonho premonitório.
Em princípios de 1918, acompanhei Dr. Moniz ao navio que o levaria ao Rio, adoentado, pés inchado. Na noite de 2 de abril sonhei com Dr. Muniz a meu lado. Acordei impressionado. Não pude mais dormir. Às 6 horas fui à sacada e vi sinal de vapor ao norte. Apressei-me e fui à Agencia do Lloyd comprar a passagem, embarcando às 9 horas para o Rio. Quando cheguei ao Hotel Avenida, disse-me o gerente:
- Coronel Aboudib, o senhor está sendo esperado. Acabam de lhe telefonar.
Encontrei o Dr. Moniz agonizante.

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