Em 1930 transferi-me para o Rio de Janeiro, acompanhado de meu filho estão deputado federal.
Com o advento da Revolução, voltamos a residir em Vitória. Em 1934 senti que a vista me ia faltando consideravelmente e para isso lancei mão de todos os recursos, peregrinando pelos consultórios médicos, inutilmente. A conselho de meu dedicado amigo, Dr. Aldemar Pessoa, filho do saudoso farmacêutico Inácio Pessoa, fui a Campinas consultar o Dr. Penido Burnier, sumidade no assunto. Nesta ocasião fazia eu, com Sinhá, uma estação em Poços de Caldas, onde ela procurava melhoras para uma dermatose. Guardo de Dr. Burnier a melhor recordação, tanto do ponto de vista de probidade profissional como pela bondade que teve para comigo. Examinou-me duas vezes n mesmo dia, durante quatro horas. Das 9 às 11 da manhã e das 3 às 5 da tarde. Às 5 me disse:
-Preciso lhe ser franco para que o senhor não seja vítima de algum ganancioso que lhe proponha tratamento ou operação. O senhor só tem um oitavo da vista. A esclerose atacou a retina e para isso não há remédio. Suas grandes preocupações de espírito influíram para isso, mas vamos tentar sustar-lhe a evolução.
Ao deixar o consultório, senti-me preso da emoção e por momentos julguei-me cego. Desesperado gritei pelo seu nome. Foi então que deu expressão a sua bondade, levando-me o ânimo e fazendo-me conduzir ao hotel no seu automóvel. À noite, fez-me ali uma visita e levou-me a passear de carro pela cidade.
Na manhã seguinte regressei a Poços de Caldas.
Em 1936, nutrindo anda a esperança de recuperar a vista, deixei Sinhá em Guarapari onde estávamos passando uma temporada e, a conselho de amigos, decidi ver o maior oculista do mundo, Dr. Barraquer, em Barcelona. Meu filho não escondia sua preocupação e tentou dissuadir-me de atravessar o Atlântico só e quase cego.
Vendi algumas terras que me restavam, apurando cerca de 20 contos e com isso tomei passagem na agência Cook, ida e volta de Santos a Barcelona. Embarquei em junho de 1936, no Cap. San Antonio direto a Barcelona, onde cheguei a 9 de julho. Nesse mesmo dia fui ao consulado brasileiro para o qual levava uma carta; e o cônsul, muito distinto, marcou-me hora com o Dr.Barraquer. Ao fim de nove dias de tratamento, disse-me o Dr:
- O senhor nunca mais pode ler. Seu caso é irremediavelmente perdido. A esclerose atacou a retina devido às grandes preocupaççoes de espírito que o senhor teve.
Desiludido, tive ainda a coragem de lhe relatar o que dois anos antes me dissera o Dr. Burnier. Pensei que no velho mundo as celebridades tivessem mis valor que as do Brasil. Vejo agora que se igualam.
Levava eu uma carta para o Dr. Barraquer e outra para irmã diretora do Instituto Barraquer e isso me valeu de ambos, amável tratamento. A irmã sobretudo, foi delicadíssima, e quando lhe falei em minha irmã Germaine, religiosa também de São Vicente de Paulo em Beirute, ficou contente. Ao despedir-me, indagando se ainda me demoraria em Barcelona, respondi-lhe:
- Sim, por mais alguns dias.
Disse-me:
-Acho que não deva demorar-se.
Essas palavras me impressionaram e ao descer do elevador com o cônsul do Brasil, repeti-lhe o que me dissera a irmã, informou-me então dos boatos que corriam de próxima revolução e por esse motivo, cancelando o passeio a Madrid, que haviam combinado, tomei o trem no dia seguinte com destino ao Líbano, via Marselha.
No mesmo dia à noite, já em Marselha, soube que havia rebentado a revolução espanhola. De Marselha viajei de trem até Triste, parando em Gênova, Milão, Veneza.
(com a morte do ilustre depoente ficou inconclusa sua interessante autobiografia).
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