USINA JABAQUARA
Em julho de 1915 mudei-me com minha família para Vitória, abrindo um escritório de transações comerciais. Em Benevente a firma continuava em franco progresso e adquiria café em grande escala, falilitando-me firmar-me com o produto na praça de Vitória.
Em começos de 1919, veio a Benevente o nosso comprador de aguardente em São João da Barra, Antonio Almeida. Subiu o rio Benevente até Alfredo Chaves e vendeu em Jabaquara, um canavial com alambique a fogo nu, de propriedade de Feliciano Garcia e Agostinho Ginelli. Sugeriu a meu sócio Philadelpho, a idéia de montar ali um alambique moderno e fabricar aguardente e alta escala. Em meu regresso, achando viável a idéia, fui a Campos e telegrafei ao Almeida que ali me fosse encontrar. Visitamos várias usinas, desejando eu comprar um jogo de moendas e um alambique. Encomendamos então um alambique ao Sr. Antonio Martins Júnior (Sr. de bem) para fabrico de 10 pipas de aguardente em 24 horas. Logo em seguida, soube da existência de uma usina parada em Santa Cruz, pertencente ao Dr. Aristides Guaraná, de saudosa memória, a qual estava hipotecada ao Banco do Brasil por cerca de 3000 contos.
Telegrafei então ao Almeida, para que trouxesse técnico competente e viesse com ele a Santa Cruz para opinar sobre a compra.
Como não entendesse do assunto, vali-me da opinião do técnico engenheiro David Findley, que achou a maquinaria em boas condições. Propus negócio ao Banco, mas para efetuá-lo tive de permanecer 6 meses no Rio de Janeiro, afim de conseguir anuência e assinatura do velho Guaraná e seus herdeiros. Tinha começado a minha grande luta. O transporte desta imensa maquinaria em saveiros e rebocadores até Benevente, seria trabalho digno de titãs, se em seguida não o subrepujasse a subida do rio de peças pesadíssimas e imensas, em pranchas a remo. Tive de mandar limpar o rio Benevente num percurso de cerca de 20 quilômetros , tarefa árdua e caríssima, para facilitar a condução desse material.
Em Jabaquara, onde adquiri terras, instalei guindastes para descarregar a maquinaria pesada. Durante a montagem da usina verificou-se a falta de muitas máquinas, sendo necessário modernizar outras. Fiz uma encomenda à casa Jan Maquinismos de Glasgow, Inglaterra, importando a mesma em 12.000 libras, cerda de 500 contos, moeda brasileira, tendo pago 113 no ato da entrega na alfândega e o restante em prestações. Nunca pude cumprir esse trato; e a casa foi tão correta que jamais me incomodou até que, em 1929, com a venda da usina, pude liquidar integralmente meu débito.
Quando me atirei neste empreendimento, jamais poderia imaginar as dificuldades que teria de enfrentar. Faltava-me tudo. Foi preciso prover a lavoura de braços e para isso cheguei a mandar vir, por várias vezes, centenas de trabalhadores de Alagoas, Sergipe e de Campos.
Ali chegavam, mas poucos parceiros permaneciam, acossados pelo impaludismo impiedoso. Era-me forçoso mandar vir novas levas para que, aos canaviais em formação, não faltassem braços. Tratei desde logo do problema sanitário, trazendo técnicos sanitaristas, que determinaram abertura de valas, plantação de eucaliptos e limpeza dos terrenos adjacentes, instalei uma farmácia que fornecia aos trabalhadores medicamentos. Ajudei também os lavradores próximos a fim de que intensificassem a plantação de canaviais, para a venda e consumo de minha usina.
Só o prédio da usina me custou, naquela época, mais de 100 contos. Mais a construção da casa do alambique e cerca de 50 casas de operários. Instalei luz elétrica. Iniciei e levei a termo a construção de 36 quilômetros de estrada de ferro de bitola 60, de Alfredo Chaves a Benevente, passando pela usina Jabaquara. Para isso contei com valioso auxílio do governo do Estado.
Mas apesar de haver época em que se produziam 200 sacos de açúcar diários, os prejuízos eram enormes e isso por insuficiência dos canaviais. A usina permanecia parada dias e dias, por falta de matéria prima; apesar de meus esforços conjugados aos de meus sócios, amigos e interessados, Paulo, Philadelpho e Cinquinho Gonçalves, que não pouparam sacrifícios de toda natureza nestes 10 anos de lutas, fui obrigado a vender a usina ao governo do Estado, 950 contos, os quais ficaram reduzidos a 830, porque descontados 450 contos que eu devia ao Banco do Estado do Espírito Santo, entregou-me o governo do Estado 500 contos em letras ao prazo de 1, 2, 3 anos, as quais entreguei aos meus credores. Como os juros dessas promissórias corriam por minha conta, tive de desembolsar 120 contos, ficando pois reduzida a venda para 830.
Nela eu empregara cerca de 3000 contos. Realizei esta venda ao governo do Estado, sendo presidente o Dr. Aristeu Aguiar, jovem e querido amigo de longa data, que chegou a convidar-me para testemunha de seu casamento.
Essa transação foi orientada pelo então secretário da Fazenda, José Vieira Machado que, como todo secretariado, sabia que eu, anos antes, recebera uma proposta de compra da parte do Dr. Henrique Novaes, representando industriais de São Paulo; proposta esta que, no momento, Philadelpho achou melhor não aceitar. Já havíamos empregado na usina 2200 contos e a proposta era de 2000 contos pagáveis 350 no ato da escritura, 350 seis meses depois e 1300 pagáveis em oito anos.
Meu passivo era nessa época, 1929, 1000 contos: 750 contos ao comércio Vitória – Rio – Glasgow; e 305 contos a amigos, alguns sem documento. Na sua totalidade, meus credores, quer comerciais, quer particulares, achavam que eu deveria fazer uma concordata de 20% de acordo com a lei vigente. Entretanto, com meus sócios, decidimos pagar a todos integralmente. Para isso vendemos todos os bens de minha propriedade, conseguindo salvar apenas o prédio, em Vitória, do Palace Hotel, de cuja renda exclusiva passei a viver muito modestamente. Tinha porém inabalado meu crédito e gozava de prestígio nas rodas políticas e sociais, tanto que permaneci até 1930 no cargo de vereador municipal da Capital, para o qual fui eleito em 1924, no início do governo Avidos. Nessas legislaturas, nunca me deixei levar por interesses subalternos, zelando pelo município, como era meu dever.
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ResponderExcluirRonaldo Mansur vem procurando relato sobre esta Usina de Jabaquara foi bom de mais encontrar esta tua postagem de relato do Cel. PEDRO JOSÉ ABOUDIB que fala de dois ex-prefeitos de Anchieta que foram Philadelpho Fernandes e Agostinho Ginelli, além do meu primo Francisco José Gonçalves ou Chiquinho Gonçalves. Estou escrevendo oito livros da genealogia de minha família que são um de escravo, dois de indignas e cinco de português, que faço relato de acontecido no município e gostaria de pulicar este depoimento do Coronel Aboudib, que é muito importante e interessante, com sua permissão. Meu e-mail costabr@hotmail.com
ResponderExcluirDesculpa pelo erro do nome e sim Ronald Mansur.
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