Hugo Chávez: e Cuba?
A presença da Venezuela e sua revolução bolivariana é de importância imensa para Cuba, que passa por uma etapa de transformações significativas em sua economia, com reflexos óbvios em seu cotidiano. Nicolás Maduro, indicado por Chávez para sucedê-lo, conta com a confiança de Fidel e Raúl Castro. Aliás, esse foi um dos pontos que pesaram a seu favor no momento da escolha para a difícil tarefa de suceder o condutor do processo bolivariano na Venezuela. O artigo é de Eric Nepomuceno.
Eric Nepomuceno
A cada dia que passa aportam em Cuba cem mil barris de petróleo venezuelano. Chegam a preços favorecidos. Se fosse recorrer ao mercado, o estado cubano não teria como pagar esses cem mil barris vitais. Ou até que teria, mas boa parte dos parcos recursos país sucumbiria. É disso que se trata.
Como se fosse pouco, a Venezuela é uma das mais generosas fontes de ingressos para Cuba. Faz décadas que a ilha obtém divisas em quantidades essenciais com a venda de serviços profissionais ao exterior.
Esse é, aliás, o segmento que mais recursos propicia a Cuba: no ano passado, foram seis bilhões de dólares, o triplo do turismo (dois bilhões) e cinco vezes mais que as exportações de níquel (um bilhão e duzentos milhões).
Em todo o mundo, o país que mais gera recursos pagando por serviços profissionais a Cuba é a Venezuela. Existem pelo menos 40 mil profissionais cubanos, todos altamente especializados, trabalhando no país presidido por Hugo Chávez.
São, em sua maioria, médicos. Mas também há assistentes sociais, engenheiros, psicólogos e profissionais de várias outras áreas trabalhando principalmente nas chamadas missões sociais, gigantescos mutirões dedicados a construir e equipar bairros populares, destinados à população carente. Somente em 2012 funcionaram 47 projetos conjuntos entre os dois países, que vão de educação a esporte, de agricultura a saúde. Isso, para não mencionar empresas binacionais e uma vasta gama de assessoria em gestão, segurança pública e instrução militar que Cuba presta aos venezuelanos.
Por essas e por outras, a presença da Venezuela e sua revolução bolivariana é de importância imensa para Cuba, que passa por uma etapa de transformações significativas em sua economia, com reflexos óbvios em seu cotidiano.
Para trás ficaram os tempos de agrura provocados pelo fim abrupto da antiga União Soviética, quando da noite para o dia a ilha perdeu 85% de seu comércio exterior e a economia entrou em colapso. Depois de terem alcançado um estágio de relativa bonança ao longo dos anos 80, de forma igualitária e estável, os cubanos viram como em apenas três anos – entre 1990 e 1993 – o PIB do país despencou quase 40%.
A vida cotidiana virou um tormento, com apagões diários que em alguns bairros de Havana duravam até 16 horas, e o país praticamente ficou sem transporte. Um tempo de sacrifício e resistência árdua, marcado para sempre na memória de gerações.
O cenário, hoje, é certamente diferente. Ao longo dos últimos seis anos foram implantadas reformas que estão significando um forte estímulo à produção, enquanto a economia cresce a taxas sólidas. Mas ainda assim há problemas sérios.
A ilha continua dependendo da importação de alimentos, e a demanda, que afeta a tudo que é tipo de produtos e serviços, é muito superior à oferta nacional. Há um evidente hiato nessa etapa de transição, e todos em Cuba – tanto no governo como nas ruas – têm plena consciência de que esse processo será lento. Tentar apressá-lo seria pôr tudo em risco.
Pois bem: nesse quadro, uma eventual interrupção da cooperação venezuelana teria consequências funestas em Cuba. Não seria, é verdade, como o colapso da primeira metade dos anos 90. Mas ainda assim, o peso da falta seria tremendo, e se faria sentir de maneira contundente.
Os cubanos sabem disso. Os venezuelanos sabem disso. Os opositores dos dois governos não apenas sabem, como já traçam projeções do que acontecerá caso a cooperação seja suspensa, e não parecem exatamente preocupados com as consequências. Que, aliás, seriam sentidas fortemente nos dois países.
Na Venezuela, porque, entre outras coisas, a saúde pública entraria em pane, e essa é uma das conquistas mais valorizadas pelos milhões de venezuelanos beneficiados pelo governo. Em Cuba, pelo corte abrupto do petróleo e de todo o resto.
Nicolás Maduro, indicado por Chávez para sucedê-lo, conta com a confiança de Fidel e Raúl Castro. Aliás, esse foi um dos pontos que pesaram a seu favor no momento da escolha para a difícil, muito difícil tarefa de suceder o condutor do processo bolivariano na Venezuela.
Na eventualidade de uma nova eleição, caso Hugo Chávez não possa assumir seu quarto mandato consecutivo, Maduro é o candidato favorito. Ele certamente manterá os acordos entre seu país e Cuba. Será, porém, um desafio a mais: a oposição terá mais força, e seu principal dirigente, Henrique Capriles, o mesmo que Chávez derrotou com folga em outubro passado, já deixou mais do que claro que se opõe terminantemente à ideia de continuar beneficiando a ilha.
Não há dúvida que, aconteça o que acontecer com Chávez, e isso vale inclusive para a possibilidade de um afastamento definitivo, as linhas básicas e centrais da revolução bolivariana serão preservadas. Mesmo sem ele, o chavismo continuará determinando o processo político venezuelano por muitos anos. Mas alguns de seus aspectos – e a forte ajuda que o país presta principalmente a Cuba, mas também a outros governos da região – com certeza passarão a ser alvo preferencial da oposição. Impedidos de acabar os programas sociais que beneficiam milhões de venezuelanos (a reação popular seria de dimensões impensáveis), os que se opõem a Chávez e seu governo irão buscar brechas para despejar sua artilharia.
A solidariedade internacional será um dos ímãs para seus ataques. Todos sabem disso – a começar, claro, pelos cubanos. E, com razão, estão preocupados.
Como se fosse pouco, a Venezuela é uma das mais generosas fontes de ingressos para Cuba. Faz décadas que a ilha obtém divisas em quantidades essenciais com a venda de serviços profissionais ao exterior.
Esse é, aliás, o segmento que mais recursos propicia a Cuba: no ano passado, foram seis bilhões de dólares, o triplo do turismo (dois bilhões) e cinco vezes mais que as exportações de níquel (um bilhão e duzentos milhões).
Em todo o mundo, o país que mais gera recursos pagando por serviços profissionais a Cuba é a Venezuela. Existem pelo menos 40 mil profissionais cubanos, todos altamente especializados, trabalhando no país presidido por Hugo Chávez.
São, em sua maioria, médicos. Mas também há assistentes sociais, engenheiros, psicólogos e profissionais de várias outras áreas trabalhando principalmente nas chamadas missões sociais, gigantescos mutirões dedicados a construir e equipar bairros populares, destinados à população carente. Somente em 2012 funcionaram 47 projetos conjuntos entre os dois países, que vão de educação a esporte, de agricultura a saúde. Isso, para não mencionar empresas binacionais e uma vasta gama de assessoria em gestão, segurança pública e instrução militar que Cuba presta aos venezuelanos.
Por essas e por outras, a presença da Venezuela e sua revolução bolivariana é de importância imensa para Cuba, que passa por uma etapa de transformações significativas em sua economia, com reflexos óbvios em seu cotidiano.
Para trás ficaram os tempos de agrura provocados pelo fim abrupto da antiga União Soviética, quando da noite para o dia a ilha perdeu 85% de seu comércio exterior e a economia entrou em colapso. Depois de terem alcançado um estágio de relativa bonança ao longo dos anos 80, de forma igualitária e estável, os cubanos viram como em apenas três anos – entre 1990 e 1993 – o PIB do país despencou quase 40%.
A vida cotidiana virou um tormento, com apagões diários que em alguns bairros de Havana duravam até 16 horas, e o país praticamente ficou sem transporte. Um tempo de sacrifício e resistência árdua, marcado para sempre na memória de gerações.
O cenário, hoje, é certamente diferente. Ao longo dos últimos seis anos foram implantadas reformas que estão significando um forte estímulo à produção, enquanto a economia cresce a taxas sólidas. Mas ainda assim há problemas sérios.
A ilha continua dependendo da importação de alimentos, e a demanda, que afeta a tudo que é tipo de produtos e serviços, é muito superior à oferta nacional. Há um evidente hiato nessa etapa de transição, e todos em Cuba – tanto no governo como nas ruas – têm plena consciência de que esse processo será lento. Tentar apressá-lo seria pôr tudo em risco.
Pois bem: nesse quadro, uma eventual interrupção da cooperação venezuelana teria consequências funestas em Cuba. Não seria, é verdade, como o colapso da primeira metade dos anos 90. Mas ainda assim, o peso da falta seria tremendo, e se faria sentir de maneira contundente.
Os cubanos sabem disso. Os venezuelanos sabem disso. Os opositores dos dois governos não apenas sabem, como já traçam projeções do que acontecerá caso a cooperação seja suspensa, e não parecem exatamente preocupados com as consequências. Que, aliás, seriam sentidas fortemente nos dois países.
Na Venezuela, porque, entre outras coisas, a saúde pública entraria em pane, e essa é uma das conquistas mais valorizadas pelos milhões de venezuelanos beneficiados pelo governo. Em Cuba, pelo corte abrupto do petróleo e de todo o resto.
Nicolás Maduro, indicado por Chávez para sucedê-lo, conta com a confiança de Fidel e Raúl Castro. Aliás, esse foi um dos pontos que pesaram a seu favor no momento da escolha para a difícil, muito difícil tarefa de suceder o condutor do processo bolivariano na Venezuela.
Na eventualidade de uma nova eleição, caso Hugo Chávez não possa assumir seu quarto mandato consecutivo, Maduro é o candidato favorito. Ele certamente manterá os acordos entre seu país e Cuba. Será, porém, um desafio a mais: a oposição terá mais força, e seu principal dirigente, Henrique Capriles, o mesmo que Chávez derrotou com folga em outubro passado, já deixou mais do que claro que se opõe terminantemente à ideia de continuar beneficiando a ilha.
Não há dúvida que, aconteça o que acontecer com Chávez, e isso vale inclusive para a possibilidade de um afastamento definitivo, as linhas básicas e centrais da revolução bolivariana serão preservadas. Mesmo sem ele, o chavismo continuará determinando o processo político venezuelano por muitos anos. Mas alguns de seus aspectos – e a forte ajuda que o país presta principalmente a Cuba, mas também a outros governos da região – com certeza passarão a ser alvo preferencial da oposição. Impedidos de acabar os programas sociais que beneficiam milhões de venezuelanos (a reação popular seria de dimensões impensáveis), os que se opõem a Chávez e seu governo irão buscar brechas para despejar sua artilharia.
A solidariedade internacional será um dos ímãs para seus ataques. Todos sabem disso – a começar, claro, pelos cubanos. E, com razão, estão preocupados.
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