O texto busca traçar a emergência e o desenvolvimento tanto do conceito de nação, de seus pioneiros formuladores, ao final do século XVIII e início do XIX, como Rousseau, Herder e Fichte, quanto de seus desdobramentos ao longo do século XIX, destacando-se, também, alguns processos concretos de constituição de nações, em particular os casos dos Estados Unidos, da Itália e da Alemanha. Ao final, discute-se a recepção da questão nacional por Marx e Engels.
João Antônio de Paula
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A idéia de nação no século XIX
O livro de Vossler citado discute tanto o conceito de nação quanto alguns de seus mais significativos intérpretes, de diversas colocações político-ideológicas: Rousseau, Burke, Jefferson, Fichte, Wilhelm Humboldt, Mazzini, Hegel, Ranke.
Essa lista, mais que uma coleção arbitrária, sintetiza a ampla gama de perspectivas que o tema "nação" motivou: o romantismo democrático de Rousseau e Jefferson; o conservadorismo exaltado de Burke; o idealismo de Fichte e Hegel; o liberalismo de Mazzini; o historicismo conservador de Ranke. De fato, tanto a idéia de nação quanto a materialização concreta das nações e dos nacionalismos a partir da Revolução Francesa são marcados pelas disputas e pelas tensões, pelos conflitos e pelas guerras.
a luta por um teatro nacional e um teatro burguês, por um teatro que participasse dos problemas da burguesia a que se ligava, então, indissoluvelmente, o progresso da nação: luta pela emancipação que, na situação concreta, forçosamente tinha de dirigir-se contra o classicismo francês (e contra Gottsched seu expoente alemão), por este representar então um teatro alheio, que impedia a eclosão das virtualidades nacionais, e simbolizar, sobretudo, o espírito do absolutismo.
Lessing, espírito retor do iluminismo alemão, vai buscar no barroco, em Shakespeare, as armas contra um classicismo que "pretensamente universal" era, naquelas circunstâncias, a convalidação da autoridade e da ortodoxia, que obliteravam a formação da nação, da liberdade e da tolerância.
Discutir a atitude de Lessing ante o classicismo coloca uma questão complexa, com algo de paradoxal. É que há, com razão, forte afinidade entre iluminismo e classicismo, e, no entanto, o iluminismo de Lessing tem que negar o classicismo para afirmar o nacional, a autonomia política e cultural. Esse mesmo diapasão é o que se vê no caso de Jean Jacques Rousseau (1712-1778). Inegavelmente um dos grandes nomes do iluminismo francês, o genebrino foi tão mais iluminista quanto mais se o reconheça como pioneiro da corrente romântica que, para todos os efeitos, é quase auto-atribuidamente uma reação ao iluminismo, em vários aspectos. Ao Rousseau iluminista, direto e legítimo inspirador da Revolução Francesa, agregue-se o Rousseau romântico e inspirador do sentimento nacional.
Diz Otto Vossler (1949, p.13): "Rousseau foi o primeiro e, pode-se dizer, o mais importante propulsor da vontade e da idéia de nação". Firme defensor da autonomia genebrina, autor de um projeto de constituição para a Córsega, de uma proposta de reforma da constituição polonesa, Rousseau inspirou também o projeto de nação norte-americana, que se associa a Thomas Jefferson (1743-1826). São de Rousseau as idéias de uma república social baseada na pequena propriedade agrícola, protegida da corrupção, que seria indissociável da grande cidade.
Rousseau, mais de uma vez, registrou a importância de John Locke (1632-1704) como referência para a elaboração de seu próprio pensamento político. Leitor e entusiasta dos grandes pensadores políticos da Antigüidade clássica e das virtudes cívicas dos antigos e do humanismo cívico renascentista, Rousseau vai tomar Locke como interlocutor, a quem respeita, mas a quem não pode seguir inteiramente. No centro da crítica de Rousseau está a invocação da "vontade geral" contra o ditado do individualismo privatista de Locke. A síntese dessa oposição está exemplarmente posta nas diferenças entre as tríades de Locke e a de Jefferson, discípulo de Rousseau. Para Locke , no Segundo tratado sobre o governo civil, de 1690, os três direitos inalienáveis dos homens são: o direito à vida, o direito à liberdade e o direito à propriedade. Jefferson, redator da Declaração da Independência dos Estados Unidos, em 1776, retoma a tríade de Locke alterando-a, assim: os três direitos inalienáveis dos homens são: o direito à vida, o direito à liberdade e o direito à busca da felicidade. Essas tríades sumarizam as duas matrizes básicas do Estado burguês: a liberal, inspirada em Locke, e a democrática, tributária da lição de Rousseau. Com efeito, com Rousseau constituiu-se não só uma idéia de república democrática, quanto esboçou-se uma nação.
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