domingo, 31 de março de 2013

ANÁLISE: A ORFANDADE INFORMATIVA DOS LEITORES DE JORNAIS



Pesquisa feita nos Estados Unidos aponta que 31% dos adultos consultados "deixaram de ler jornais por falta de credibilidade no conteúdo publicado", informa o jornalista e professor Carlos Castilho em artigo publicado no site Observatório da Imprensa
31 DE MARÇO DE 2013 ÀS 16:11
Carlos Castilho, Observatório da Imprensa
Todos nós fomos educados a buscar as informações que necessitamos nos jornais, revistas e programas noticiosos na rádio e TV. Foi assim com nossos pais e avós, mas o mesmo já não acontece mais com os nossos filhos e nem mesmo com boa parte dos que têm hoje 40 anos ou mais.
Surgiu uma geração de órfãos informativos que não têm mais certeza e segurança de onde vão encontrar o que precisam para tomar decisões pessoais ou coletivas. A edição 2013 do relatório "O Estado da Imprensa" (The State of the News Media 2013) confirma esta tendência nos Estados Unidos, ao apontar que 31% dos adultos consultados numa pesquisa em abril do ano passado deixaram de ler jornais por falta de credibilidade no conteúdo publicado. É quase 5% a mais do que em 2011, o que mostra uma preocupante tendência ascendente.
O mais intrigante desse fenômeno é que um contingente de 81% dos que deixaram de ler jornais no ano passado é formado por indivíduos que admitiram ter conhecimento da crise financeira pela qual passa boa parte da imprensa, nos Estados Unidos e no mundo. Os desiludidos com os jornais norte-americanos são, em sua maioria, ricos, com mais de 50 anos, sexo masculino e politicamente conservadores.
Se somarmos a esse perfil o fato de que apenas um em cada 12 jovens entre 18 e 30 anos, e um em cada 20 adolescentes têm algum contato com meios jornalísticos impressos (dados de uma pesquisa feita em 2007 na Universidade Harvard), fica ainda mais clara a mudança de comportamentos. O distanciamento em relação aos veículos impressos e até mesmo da televisão configura um vácuo informativo expresso no teor das informações que buscamos e recebemos.
Fomos educados a esperar que a imprensa nos dissesse o que é certo ou errado, verídico ou inverídico, justo ou injusto. Mas o mundo mudou com uma enorme rapidez e a imprensa não soube acompanhar. Resultado: fomos educados a esperar verdades tranquilizadoras, mas a realidade que nos cerca fornece cada vez mais situações relativas, contextos complexos e percepções contraditórias.
A responsabilidade que cabe às empresasjornalísticas nesse processo é a de terem colocado em primeiro lugar a sobrevivência do seu negócio e só depois procurado ver como a revolução causada pelas novas tecnologias de informação e comunicação afetou os comportamentos do público em matéria de leitura e consumo de notícias.
O State of the News Mediavem mostrando desde que começou a ser produzido, em 2004, a irreversibilidade das mudanças de comportamento do público e a preocupação das empresas em buscar receitas a qualquer custo, mesmo que isso signifique o abandono do leitor como meta prioritária. Além do jejum de notícias por conta dos cortes orçamentários nas redações, os compradores de jornal passaram a receber cada vez mais informações enviesadas – como mostramos no post sobre a comercialização do noticiário.
Estamos órfãos dos jornais, mas não de informações. Há uma avassaladora fartura delas na internet, só que apresentadas de forma desorganizada, o que nos obriga a pesquisar e refletir muito antes de incorporar informações online ao nosso conhecimento pessoal. Era mais cômodo nos tempos em que as pessoas acreditavam na imprensa, mas os tempos mudaram irreversivelmente. Ficamos órfãos de uma imprensa que leva a sério a sua função de servir ao interesse público.
Agora teremos de nos aventurar quase sozinhos pelo emaranhado da avalancha informativa para descobrir o que é bom ou ruim para nós. Dará mais trabalho e nos obrigará a conviver com a insegurança, a incerteza e com o contraditório, mas pelo menos estaremos mais próximos da realidade.

Sindicatos se articulam para tentar se aproximar de jovens


Sindicatos se articulam para tentar se aproximar de jovens

A preocupação em unir movimento sindical e juventude, dois pólos de mobilização social, ocupou posição central nas discussões de representantes de organização de trabalhadoras e trabalhadores presentes no Fórum Social Mundial da Tunísia.

Túnis – Uma das chaves dos levantes populares que derrubou o ditador Ben Ali, na Tunísia, em janeiro de 2011, foi a convergência entre o movimento sindical e a juventude do país. A preocupação em unir estes dois pólos de mobilização social ocupou posição central nas discussões de representantes de organização de trabalhadoras e trabalhadores presentes no Fórum Social Mundial (FSM) 2013.

No texto-base redigido por membros de sindicatos das mais distintas partes do mundo que tomaram parte na assembleia de convergência sobre a “solidariedade internacional perante a crise”, a preocupação em “melhorar a visibilidade” dos sindicatos junto a jovens aparece logo no primeiro parágrafo, antes mesmo da menção ao “trabalho decente” – atualmente uma das principais “bandeiras” de referência em nível internacional.

A dificuldade compartilhada por muitos sindicatos de se aproximar dos jovens foi um dos motivos pelos quais a Central Única dos Trabalhadores (CUT), do Brasil, juntamente com entidades sindicais da região de Quebec, no Canadá, promoveu uma oficina para debater a renovação sindical durante o FSM.

“Uma das dificuldades na tentativa de recolocar o trabalho no centro da agenda está em entender melhor onde está se dando o trabalho hoje e quem são essas pessoas que estão trabalhando”, pontua a secretária de comunicação da CUT, Rosane Bertotti. “O ex-presidente Lula dizia primeiro que era preciso que o sindicato estivesse na porta da fábrica. Depois, ele passou a dizer que era necessário atuar dentro da fábrica. Hoje, muita gente já não está mais dentro da fábrica. Está em pequenas e múltiplas unidades de produção fragmentadas e dispersas, fazendo serviço em casa ou mesmo nas ruas”.

Uma das estratégias citadas pela dirigente para atrair o interesse de jovens – que sofrem diante de altos índices de desemprego em diferentes partes do mundo, mas mantém uma distância com o cotidiano das lutas sindicais – é desenvolver, segundo Rosana, mais programas e ações concretas no campo da subjetividade. “A arte e a cultura têm um papel crucial na formação política. Pensamos que o caminho de convencimento seria apenas pela razão e `esquecemos` do subjetivo”, afirma Rosane. 

Maior central sindical da Tunísia e uma das entidades mais ativas de oposição ao atual governo do governo do partido islâmico Ennahda, a União Geral dos Trabalhadores da Tunísia (UGTT), também tem adotado medidas para reduzir o distanciamento com a juventude. Entre as diversas cooperações que mantêm com outras organizações da sociedade civil, a UGTT firmou parcerias com as universidades, criando centros de formação para facilitar a conexão entre estudantes universitários e o mundo do trabalho. 

De acordo com o dirigente sindical da UGTT, Ben Ahmed Mustapha, o objetivo maior consiste em “fazer dos sindicatos um espaço de disputa real por um mundo melhor, uma referência na discussão de ideias, um espaço aberto a quem compartilha dos mesmos anseios e queira se integrar”. Nesse sentido, o FSM significa, para ele, uma oportunidade para efetivar coordenações concretas, para além de protocolos de intercâmbio e cooperação “que ficam no papel”. Além da realização de um Fórum Social Sindical próprio, em período específico e distinto dos encontros do FSM, outra proposição que ganhou força foi a da possível realização de “greves de solidariedade” transfronteiriças em sinal de apoio à luta sindical da classe trabalhadora, especialmente aquelas submetidas à pressão pela redução dos direitos, como é o caso de nações estranguladas pela dívida do Sul da Europa.

Desenha-se também uma agenda conjunta de lutas para o mês de outubro, período de grandes mobilizações mundo afora em prol do “trabalho decente”. Com relação aos países do Norte da África e Oriente Médio que têm sido palco da chama da Primavera Árabe, a secretária da CUT vê algumas semelhanças com o cenário de redemocratização de nações da América Latina, após a queda de ditaduras militares, há algumas décadas. “Não é fácil manter a unidade”, aponta. O estreitamento de relações com movimentos sociais, acredita Rosana, pode ajudar a propiciar a contribuição dos sindicatos em disputas mais amplas como a relacionada com a democracia e a atuação do Estado.

Enquanto sindicalistas concluíam o posicionamento resultante das discussões no FSM, um jovem participante acompanhava as discussões. À Carta Maior, Mike, nome pelo qual preferiu se identificar, comentou que esteve presente na assembleia dos representantes de sindicatos porque queria ter conhecer as condições de trabalho de quem vive experiências de exploração, injustiça e discriminação na pele. “O movimento sindical é muito importante, mas parte dele ainda é muito conservador. Poderiam, por exemplo, ser mais participativos e mais horizontais. Isso certamente facilitaria o diálogo com outros movimentos”. 


Fotos: Maurício Hashizume 

Movimento quer transformar Curupaiti em modelo de inclusão de pessoas com hanseníase


31/03/2013 - 18h07

Akemi Nitahara
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro – Um parque ecológico com um centro de atenção ao idoso, um teatro para a comunidade, preservação de ruínas, um hospital de referência em dermatologia e um museu sobre hanseníase. Esse é o projeto do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan) para a antiga Colônia Curupaiti, em Jacarepaguá, na zona oeste do Rio, espaço criado em 1929 que recebia e isolava os doentes da sociedade.
Segundo o coordenador nacional do Morhan, Artur Custódio, já foi dada a cessão do uso das cerca de 300 casas para os antigos pacientes e suas famílias. “Hoje, você trata hanseníase no posto de saúde, mas naquela época as pessoas eram isoladas. Então, Curupaiti tem pessoas remanescentes, elas não têm mais a doença, mas muitos têm sequelas da doença, e aqui se transformou em uma grande comunidade”.
Ele explica que a Organização das Nações Unidas (ONU) tem acompanhado, por meio da comissão de direitos humanos, o que tem sido feito nas antigas colônias no mundo todo. Só no Brasil, existem 33 locais desse tipo, todos praticamente abandonados, segundo Custódio. “Toda vez que tem um movimento a gente sempre observa. A vinda dos índios para Curupaiti traz uma discussão interessante, podemos discutir a memória deles e a dos atingidos por hanseníase também”.
Curupaiti irá acolher parte dos índios que deixaram aldeia, próxima ao Maracanã, que será demolida por causa da reforma do estádio.
Para Custódio, o modelo adotado na antiga colônia é um exemplo, o que não está ocorrendo em outros lugares. “Já o que está acontecendo em São Paulo, em Pernambuco, que é tentar transformar essas antigas unidades em centros de reclusão para usuários de crack, isso é extremamente negativo. Em algumas colônias construíram presídios dentro, outras, como Salvador, derrubaram tudo para construir um hospital, o que também não é a melhor solução”, acrescentando que as Nações Unidas alertam para os locais sejam tratados de forma a nãor eforçar o estigma em relação às pessoas com a doença.
"O Brasil não tem um museu da hanseníase e a gente tem toda uma questão que foi construída em cima disso e que precisava ser preservada, como moedas antigas próprias, da época do isolamento”. Segundo o coordenador do Morhan, vários países têm museus temáticos, como a África do Sul, o Japão e a Noruega.
Custódio aponta como avanço o pagamento de indenização aos pacientes, prevista na Lei 11.520, a cessão das casas para os moradores, além de verba federal para melhorar o hospital de Curupaiti.
Porém, outra frente de luta é a indenização para os filhos dos paciente, que foram separados dos pais. “Houve um crime de Estado, eles foram separados. A cura da hanseníase surgir na década de 40, então não tinha mais porque separar. Tinha uma recomendação mundial em 53 [1953] de acabar com o isolamento e a separação de filhos. O Brasil só foi cumprir isso oficialmente em 76 [1976], e na prática até 86 [1986]. Em outros países, como o Japão, o isolamento ocorreu até 1990”, lembra.
Uma das pessoas que pedem a reparação é Elizabeth de Jesus Eggnstein, que mora na Colônia Curupaiti. Ela conta que nasceu na colônia e foi levada para um orfanato com duas horas de vida. “A gente sofreu muito. Era chamado de leprosinho, apanhava no orfanato e não podia se defender. Ficava presa por ordem do governo da época. Muitas crianças morreram lá no orfanato, muitos filhos não conheceram os pais”, lembra.
De acordo com Artur Custódio, o tema vai ser discutido em um encontro em São Paulo, no dia 21 de abril, com a ministra da Secretaria de Direitos Humanos, Maria do Rosário.
Apesar da cessão das casas de Curupaiti para os antigos pacientes, o projeto de revitalização do local, incluindo preservação ambiental e valorização cultural, ainda não foi implantado. Procurada pela Agência Brasil, a Empresa Estadual de Obras Públicas (Emop) não se pronunciou sobre o andamento do projeto e das obras.
De acordo com a Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos, responsável pela acomodação dos índios da Aldeia Maracanã, o local vai receber um centro de referência da cultura indígena e uma aldeia modelo, com acesso independente, para abrigar os indígenas que aceitaram ser transferidos. Por enquanto, os 12 índios estão em abrigos provisórios, montados em contêineres ao lado do Pavilhão Jesuíno Albuquerque.

Edição: Carolina Pimentel

Antiga Colônia de Curupaiti é contraste entre atendimento modelo e abandono



31/03/2013 - 17h45
Akemi Nitahara
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro – De um lado, um pavilhão todo reformado, bem iluminado, com amplas janelas e mobiliário e quartos individuais com até 12 pacientes em estado grave. Do outro, um prédio de três andares abandonado ainda abriga, em condições precárias, 17 pessoas. O contraste ocorre na antiga Colônia Curupaiti, em Jacarepaguá, na zona oeste do Rio, espaço criado em 1929 em que recebia e isolava pessoas com hanseníase do convívio social.
Morador do Pavilhão Jesuíno Albuquerque, o homem que se identificou apenas como Francisco diz que vive no lugar há 20 anos, por não ser aceito pela família por causa da doença. Ele denuncia as condições desumanas em que se encontra. “A comida é colocada dentro do banheiro para nós comermos, o banheiro de baixo está em total ruína, tudo quebrado. O benefício que temos direito eles se negam a repassar, dizem que não tem verba. Não posso melhorar meu quarto porque eles não me dão renda nenhuma”.
Como foi morar em Curupaiti nos anos 90, Francisco diz que não teve direito à indenização prevista pela Lei 11.520, de 18 de setembro de 2007, que prevê a reparação aos internados compulsoriamente até 31 de dezembro de 1986. “Nós vivemos assim, sem renda e em um pavilhão. Então, nosso destino é viver e morrer aqui dentro mesmo”, lamenta. A lei também prevê uma pensão vitalícia e intransferível para os antigos albergados.
Por outro lado, o Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan) conseguiu levantar verba, graças a um show de apoio do cantor Ney Matogrosso há três anos, para reformar o Pavilhão Jorge Rabelo. O coordenador nacional do Morhan, Artur Custódio, explica que o prédio também estava em condições precárias.
“A gente pegou o pior de todos para reformar, era um pavilhão antigo, todo abertão, pé direito alto, com um monte de leitos jogados. A enfermaria ficava lá no final, não conseguia atender aos pacientes direito. Agora, a enfermagem veio para o meio, fica mais alta, então dá para ver tudo. O Morhan fez a obra, custou R$ 700 mil com tudo, mobiliário, tem TV nos quartos. Aqui é mais uma enfermaria mesmo, mas a gente mostrou que dá para humanizar um pouco”. O pavilhão conta com 12 leitos e atualmente tem10 pessoas.
A Secretaria de Estado de Saúde informa que é responsável pela área hospitalar do Instituto Estadual de Dermatologia Sanitária, que fica no local, e pela área externa de todo o complexo. “Foram iniciadas em março, obras de saneamento básico na área comunitária do hospital. Os investimentos em infraestrutura e manutenção dos pavilhões também já tiveram início. As reformas seguem uma prioridade por locais que tenham assistência aos deficientes e idosos”, diz a nota enviada pela assessoria de imprensa do órgão.

Edição: Carolina Pimentel

Manifestação lembra 29 vítimas de chacina na Baixada Fluminense



31/03/2013 - 18h31
Vladimir Platonow
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro – A dor de perder um filho assassinado não passa, mesmo depois de anos. Esse é o sentimento de parentes de vítimas da Chacina da Baixada, ocorrida em 2005 e que hoje (31) completou oito anos. Na ocasião, um grupo de policiais militares saiu matando indiscriminadamente moradores inocentes dos municípios de Nova Iguaçu e de Queimados, na Baixada Fluminense, deixando um rastro de 29 mortes. Para marcar a data, um grupo de mães e parentes realizou uma caminhada, que começou na Rodovia Presidente Dutra e passou pela rua Gama, em Nova Iguaçu, principal palco da tragédia.
“Queremos que pare o extermínio de jovens que acontece na Baixada Fluminense. Temos o exemplo do que aconteceu na Chatuba [em setembro de 2012, quando traficantes mataram oito jovens inocentes] e outros meninos que morrem aqui, não em grupo, mas a varejo. Por isso, a caminhada não é só para homenagear as vítimas daquele dia, mas para dizer à sociedade e às autoridades que existe um grupo que se incomoda com o que continua acontecendo”, declarou Luciene Silva, organizadora do ato e mãe de Raphael Silva, morto aos 17 anos no massacre.
Ela disse que a vida das famílias que tiveram mortos na chacina nunca mais foi a mesma, embora passados tantos anos: “É um vazio que nunca se acaba. É um vazio eterno. A gente sente uma falta dele muito grande. Nunca mais as reuniões da minha família foram as mesmas. Sempre temos a sensação de que está faltando alguém”.
A manifestação contou com pessoas ligadas a outros assassinatos acontecidos no estado e também em São Paulo, que registrou dezenas de mortes entre os dias 12 e 21 de maio de 2006, como resposta a uma série de atentados de criminosos paulistas contra civis e policiais. Em todo o estado de São Paulo, os homicídios praticados por grupos de extermínio resultou na morte direta de pelo menos 142 pessoas. Só na Baixada Santista, foram 40 vítimas. Entre elas, a filha de Vera Lúcia Gonzaga, Ana Paula, de 20 anos, que estava grávida de nove meses.
“Na noite de 15 de maio de 2006 morreram ela, o marido e o bebê. Só nesta noite foram 25 assassinatos na Baixada Santista. Até hoje ninguém foi preso. Depois de quatro meses, o inquérito foi arquivado, disse Vera Lúcia. Até hoje ela não se conforma com a perda da filha e do bebê que ia nascer, sem que ninguém tenha sido condenado: “Ficou tudo bagunçado. A gente não tem mais festa, Natal, Páscoa. Não temos mais nada. A dor não sai e as lembranças continuam. O que mais dói é o manto da impunidade”.
Para o ativista social Adriano Dias, fundador da organização Com Causa, que trabalha na defesa dos direitos humanos na Baixada Fluminense, as mortes continuam acontecendo na região, mas cada vez mais ligadas ao tráfico de drogas, que vem se fortalecendo nos municípios vizinhos, na medida em que se enfraquece nas favelas cariocas ocupadas pelas Unidades de Polícia Pacificadora.
“Hoje tem um aumento considerável das áreas controladas pelo narcotráfico. Está mudando o perfil. Sempre houve tráfico aqui, mas a mudança de controle territorial, com mais armamentos e brutalidade, está acontecendo a olhos vistos. Os negócios [do tráfico] estão migrando para cá. Por conta das políticas de pacificação das favelas do Rio”, disse Adriano.

Edição: Beto Coura

Meninas têm mais chance de sucesso na escola do que os meninos


31/03/2013 - 16h41

Mariana Tokarnia
Repórter da Agência Brasil
Brasília – Os meninos são mais propensos a repetir o ano ou abandonar a escola do que as meninas. Eles têm, em média, uma probabilidade 12% maior de fracasso escolar do que as meninas. Segundo a pesquisadora Paula Louzano, as meninas geralmente têm uma maneira de portar-se mais alinhada com a cultura escolar, com o que se espera dos estudantes. Ela explica que as escolas esperam que os estudantes “prestem atenção nas aulas, sejam calmos, o que se aproxima mais do comportamento feminino. Os meninos geralmente são vistos como agressivos, difíceis, pelos professores”, diz.
As conclusões da professora da Universidade de São Paulo são resultado de levantamento feito com base nos dados do questionário socieconômico da Prova Brasil 2011. O questionário do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira foi aplicado em todo o país e respondido por 2,3 milhões de alunos do 5º ano do ensino fundamental. Ela escreveu o artigo Fracasso Escolar e Desigualdade do Ensino Fundamental, publicado no relatório De Olho nas Metas de 2012, do movimento Todos pela Educação.
As diferenças de probabilidade de fracasso variam entre as regiões brasileiras e entre a cor da pele dos estudantes. “Em termos absolutos, os meninos pretos - seguindo a denominação adotada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - representam o grupo mais vulnerável ao fracasso escolar, em todas as regiões e em todos os níveis de escolaridade dos pais”, diz Paula Louzano.
No Nordeste, estudantes do sexo masculino autodeclarados pretos têm 59% de chance de fracasso e, no Norte, o número vai para 59,3%. Nas mesmas regiões, a probabilidade de uma menina autodeclarada preta fracassar é 45,5% e 45,8% respectivamente. Entre os alunos autodeclarados brancos, no Norte, os meninos têm 52,2% de possibilidade de insucesso e no Nordeste 50,9%. Entre as meninas, o índice é 38,8% e 37,5%, respectivamente. Os menores índices estão no Sudeste, onde, para meninos pretos é 42,3% e para meninas pretas é 29.8%. Meninos brancos na região têm 26,5% de chance de fracassar, enquanto as meninas brancas, 17,3%.
Outra pesquisadora da universidade, Marília Carvalho concorda com Paula Louzano, segundo a qual a postura das meninas está mais alinhada com a cultura escolar. Marília acrescenta que os meninos sofrem uma pressão dupla. “A primeira é a da sociedade de que, para se firmar como macho, tem que ser respondão, briguento. A segunda é a da escola, que reforça a questão. Quando os meninos são quietos, não gostam de futebol etc, a escola estranha e isso é colocado nas reuniões de professores”, diz.

Edição: Beto Coura

Estudantes negros têm maior probabilidade de insucesso na escola, dizem pesquisas



31/03/2013 - 15h31
Mariana Tokarnia
Repórter da Agência Brasil
Brasília – Duas pesquisas da Universidade de São Paulo indicam que alunos negros têm maior possibilidade de fracassar na escola do que os brancos. Para os pesquisadores o menor êxito dos negros é resultado de condições socioeconômicas. Contribuem também fatores culturais. Um deles é o preconceito desenvolvido por professores. Pequena parte deles acredita que os alunos negros terão, naturalmente, desempenho pior do que os brancos.
O conjunto de fatores determina que, quando os estudantes chegam ao 6º ano do ensino fundamental, 7% dos alunos brancos tenham mais de dois anos de atraso escolar, e entre os negros, o indicador chega a 14%. Os números são apresentados no artigo Fracasso Escolar e Desigualdade do Ensino Fundamental da pesquisadora Paula Louzano, publicado no relatório De Olho nas Metas de 2012, lançado pelo movimento Todos pela Educação.
O artigo é baseado no questionário socieconômico da Prova Brasil 2011, aplicada nacionalmente e respondido por 2,3 milhões de alunos do 5º ano. Dos alunos que responderam à questão de reprovação ou abandono da escola, um terço havia passado pela situação de insucesso na escola. Desses, 43% se autodeclararam pretos, 34% pardos e 27% brancos, segundo a denominação adotada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
Paula Louzano afirma que os números gerais são alarmantes e o cenário se agrava mais para alguns grupos sociais. “A chance de isso [repetência ou abandono] acontecer não é distribuída igualmente entre grupos. Alguns tem processos mais tortuosos, o que está ligado também ao nível socioeconômico. A desigualdade que marca o Brasil se reproduz no sistema de educação”, diz a pesquisadora.
No Norte e no Nordeste, a probabilidade de um aluno preto repetir o ano ou abandonar a escola é respectivamente 53% e 52%. Para os alunos pardos, o índice chega a 47% e a 45%. Nas mesmas regiões, a possibilidade de fracasso entre alunos brancos é 46% na Região Norte e 44% na Região Nordeste. O Sudeste apresenta os menores índices nacionais, 36% para os alunos pretos, 27% para os pardos e 22% para os brancos.
A também pesquisadora Marília Carvalho faz pesquisas qualitativas. Segundo ela, é preciso esclarecer que o fracasso escolar não é do aluno, mas sim da escola que não foi capaz de dar ao estudante o nível de aprendizado e desempenho esperado para o período. Durante as pesquisas, ela observou que a cor autodeclarada pelo estudante está relacionada também ao seu desempenho.
“O processo de declaração diz respeito a autoimagem que a pessoa tem. No conjunto da sociedade, quanto mais escolarizada, com maior renda, a pessoa é clareada. O processo ocorre na escola. Quando as crianças vão bem, elas são clareadas, tanto para si mesmas quanto para professores e colegas”, diz Marília Carvalho.
Ela acrescenta que os próprios professores declararam que nunca tiveram a oportunidade de discutir questões raciais nem durante a formação, nem no espaço coletivo da escola. “Relações de racismo marcam a nossa sociedade. As crianças negras têm que enfrentar mais esta dificuldade na escola, têm que se afirmar a todo momento e gastam parte da energia que deveria ser voltada ao aprendizado para se defender”.

Edição: Beto Coura

IPI reduzido para automóveis e caminhões é prorrogado até 31 de dezembro



31/03/2013 - 11h47
Ivan Richard*
Repórter da Agência Brasil
 
Brasília – O governo decidiu prorrogar até o final do ano a redução das alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para automóveis e caminhões. A medida foi anunciada na noite de ontem (30), dois dias antes do prazo previsto para o fim da redução, 1º de abril.
Em nota, o Ministério da Fazenda justificou que, com a medida, o governo, “não só estimula o setor automotivo, um dos principais motores da economia, como toda a cadeia automobilística, como as indústrias de autopeças, de estofado e de acessórios”.
A prorrogação da desoneração do IPI até 31 de dezembro, de acordo com a Fazenda, representará renúncia fiscal adicional de R$ 2,2 bilhões de abril a dezembro.
Para os veículos flex e a gasolina de até 1.000 cilindradas, a alíquota do IPI permanecerá em 2%. Antes, a previsão era que o imposto fosse elevado para 3,5% a partir de 1º de abril. Segundo o Ministério da Fazenda, a alíquota original para essa classe de veículos é 7%.
Já para os veículos flex de 1.000 a 2.000 cilindradas, que teriam a alíquota do IPI elevada para 9% a partir da próxima segunda-feira, serão mantidos os atuais 7%. Os carros a gasolina, que teriam o imposto elevado para 10%, permanecerão com o IPI em 8%. As alíquotas originais das duas categorias são, respectivamente, 11% e 13%.
Segundo o Ministério da Fazenda, a alíquota para os veículos acima de 2.000 cilindradas permanecerá alterada em 25% para aqueles movidos a gasolina e em 18% para os flex. Para os caminhões, o IPI permanece em zero.
O governo também decidiu prorrogar até 31 de dezembro a alíquota de 2% do IPI para os veículos comerciais leves. Originalmente, o IPI para essa categoria é 8%.
*Colaborou Daniel Lima
Edição: Nádia Franco
 

Novas desonerações podem impedir que arrecadação cresça mais que inflação em 2013


31/03/2013 - 11h09

Wellton Máximo
Repórter da Agência Brasil
 
Brasília – Depois de registrar recorde em janeiro e queda em fevereiro, a arrecadação federal enfrenta um desafio para crescer em 2013. Apesar da recuperação da economia, que reforça o caixa do governo, as desonerações podem impedir que a arrecadação cresça mais do que a inflação neste ano. O impacto pode chegar a quase R$ 100 bilhões, caso o governo anuncie novas medidas. Ontem (30) à noite, o governo anunciou a prorrogação das atuais alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) reduzido para caminhões e automóveis. A redução venceria amanhã (1º).
Nos dois primeiros meses do ano, a arrecadação acumulada teve aumento real (descontada a inflação) de 3,67%. Em janeiro, no entanto, a alta era bem maior: 6,59%. O secretário da Receita Federal, Carlos Alberto Barreto, evita apresentar estimativas para a arrecadação em 2013, mas, na semana passada, admitiu que as desonerações dificultam qualquer previsão.
“Não dá para saber se o desempenho [das receitas federais] em 2013 representa uma retomada da atividade”, disse Barreto na semana passada, ao explicar os números da arrecadação de fevereiro. O secretário também não quis fazer projeções sobre o resultado de março, que só será divulgado no fim de abril. Ele disse apenas que as receitas serão maiores por causa do fim do ajuste anual do Imposto de Renda das empresas.
De acordo com a própria Receita, a União deixaria de arrecadar R$ 53,2 bilhões neste ano somente com as desonerações já em vigor. O montante já inclui medidas que deixarão de vigorar ao longo de 2013, como a redução de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para automóveis e produtos da linha branca. A perda de Receita, no entanto, será bem maior por causa das novas reduções de impostos que o governo pretende fazer.
Primeiramente, o Orçamento Geral da União reservava R$ 15,2 bilhões para futuras desonerações. Durante a tramitação do orçamento no Congresso, o governo acrescentou emendas que elevaram as desonerações em mais R$ 21,5 bilhões. Além disso, no início do mês, a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, anunciou mais R$ 10 bilhões em reduções de impostos para este ano.
Caso sejam postas em prática, as novas medidas farão o governo deixar de arrecadar mais R$ 46,7 bilhões em relação ao volume inicialmente previsto pela Receita Federal. O impacto final para os cofres públicos, dessa forma, ficaria em R$ 99,9 bilhões. Entre as ações em estudo pelo governo, estão a inclusão de novos setores na desoneração da folha de pagamento, novos pacotes de incentivo aos investimentos e a redução de tributos sobre os combustíveis. Única medida anunciada até agora, a redução a zero dos tributos federais sobre a cesta básica custará R$ 5,5 bilhões em 2013.
Edição: Juliana Andrade e Tereza Barbosa

O sequestro da Petrobras



É preciso evitar que a agenda da crise paralise e ensombreça o Brasil. 

Quem adverte são economistas simpáticos ao governo, preocupados com a prostração em que se encontra o debate do desenvolvimento. 

Seriam eles os últimos a subestimar o teor sistêmico da desordem internacional, cuja implosão, na verdade, previram e advertiram.

Mais que isso.

Atuam para mitigar seus efeitos no país. São ouvidos e consultados pelo governo na implantação de contrapesos estratégicos. 

Baixar as taxa de juros, reduzir o superávit primário e corrigir o câmbio, por exemplo. No limite, se necessário, adequar a meta de inflação.

O fundamental é assegurar a travessia do colapso mundial sem trazer a crise para dentro do Brasil, como anseia o conservadorismo. 

A agenda mercadista mal disfarça esse propósito. 

Com os meios generosos a sua disposição, difunde a fatalidade cinza em cada esquina. 

A ênfase sobressaltada atende a interesses de bolso, ideologia e palanque.

É um bloco respeitável. Exacerbado pelo poder desigual de vocalização que o monopólio midiático lhe confere. 

Tome-se o Brasil das manchetes, que não raro agridem o próprio texto. Tome-se a negligência diante das decisões estratégicas anunciadas na reunião dos BRICS, em Durban.(Leia reportagem nesta pág)

As cinco maiores economias emergentes criaram nada menos que um ensaio de FMI keynesiano; e um Banco Mundial de investimento, fora da hegemonia dos EUA. As manchetes preferiram espetar em Dilma a 'negligência com a inflação'. 

Tome-se, ainda, o silencioso, mas expressivo processo de reindustrialização dos EUA, que está trazendo de volta a manufatura de alta tecnologia.

Enfim, a crise continua, mas o mundo se move. 

A prostração inoculada diuturnamente pelo noticiário econômico recusa ao Brasil a capacidade de dizer: ‘eppur si muove’.

É um objetivo político, não um recorte isento.

A escolha menospreza singularidades locais que podem subverter a dinâmica da crise entre nós, dizem os economistas.

Eles dispensam os exemplos mais notórios desses trunfos -- o mercado de massa expandido nos últimos 11 anos e os níveis recordes de emprego.

Preferem se fixar em uma alavanca quase épica que foge ao estereótipo de um debate vicioso e datado sobre o desequilíbrio entre oferta e demanda, entre inflação e juros.

O passo seguinte do desenvolvimento brasileiro, dizem eles, está no impulso industrializante contido no pré-sal.

A paralisia da industrialização brasileira é real e afeta todo o tecido econômico.

Asfixiada pelo câmbio valorizado e pela concorrência chinesa, a indústria brasileira de transformação perdeu elos importante, em diferentes cadeias de fornecimento de insumos e implementos. 

Não é um fenômeno recente, mas é progressivo.

O PIB cresceu em média 2,8% entre 1980 e 2010; a indústria da transformação cresceu apenas 1,6%, em média. Sua fatia nas exportações recuou de 53%, entre 2001-2005, para 47%, entre 2006-2010 .

O mais preocupante é o recheio disso.

Linhas e fábricas inteiras foram fechadas. Clientes passaram a se abastecer no exterior. Fornecedores se transformaram em importadores. Apenas carimbam seu logotipo ao lado do fabricante estrangeiro. Empregos industriais foram eliminados; o padrão salarial do país foi afetado, para pior.

É possível interromper essa sangria, com redução de juros, incentivos, desonerações, protecionismo e ajuste do câmbio, como tem sido feito pelo governo.

Mas é difícil, muito, reverter buracos consolidados.

O dinamismo que se perdeu teria que ser substituído por um gigantesco esforço de inovação e redesenho fabril, a um custo que um país em desenvolvimento dificilmente poderia arcar. 

Exceto se tivesse em seu horizonte a exploração soberana, e o refino, das maiores jazidas de petróleo descobertas no século 21.

É esse bilhete premiado que o pré-sal representa para o Brasil.

São cerca de 50 bilhões de barris de petróleo, guardados a 300 km da costa e cerca de seis mil metros abaixo da superfície d’água.

O país tem tecnologia para tirá-lo de lá. Na verdade, a Petrobras detém a ponta dessa tecnologia no mundo.

Esse trunfo avaliza a possibilidade da reindustrialização, como resposta brasileira à crise.

A agenda enfatizada pelos economistas é o oposto do que alardeia o conservadorismo.

Seu empenho, neste momento, é sequestrar a Petrobras para o palanque da campanha sombria: o ‘Brasil que não dá certo’.

Os números retrucam.

O pré-sal já produz 300 mil barris/dia. Em quatro anos, a Petrobras estará extraindo 1 milhão de barris/dia da Bacia de Campos.

Até 2017, a estatal vai investir US$ 237 bilhões; 62% em exploração e produção.

Dentro de quatro anos, os poços do pré-sal estarão produzindo um milhão de barris/dia. Em 2020, serão 2,1 milhões de barris/dia. 

Praticamente dobrando da produção atual. 

O pré-sal mudou o tamanho geopolítico do Brasil. 

Não existe automatismo econômico que leve ao desenvolvimento: os efeitos virtuosos desse salto no conjunto da economia brasileira exigiam um lacre de segurança.

Ele foi fixado em lei, no governo Lula.

O marco regulador do pré-sal --aprovado com a oposição de quem agora agita a bandeira da defesa da Petrobras –- institui o regime de partilha e transfere o comando de todo o processo tecnológico, logístico, industrial, comercial e financeiro da exploração à estatal.

Todos os contratados assinados nesse âmbito passam a incluir cláusula obrigatória de conteúdo nacional nas compras –da ordem de 60% , pelo menos.

Esse é o ponto de mutação da riqueza do fundo do mar em prosperidade na terra.

Toda uma cadeia de equipamentos, máquinas, logística, tecnologia e serviços diretamente ligados, e também externos, ao ciclo do petróleo será alavancada nos próximos anos. 

O conjunto pode fazer do Brasil um grande exportador industrial nessa área.

É sobre isso que os economistas falam quando demonstram impaciência com o círculo vicioso de fatalismo embutido na pauta conservadora da crise.

O mais difícil foi feito.

O novo marco regulador transfere à Petrobras a responsabilidade soberana de harmonizar duas variáveis básicas: o ritmo da extração e do refino; e a capacidade brasileira de atender à demanda por plataformas, máquinas, barcos, sondas etc.

Se a exploração corresse livre, como gostariam a república dos acionistas e as multinacionais, o fôlego da indústria local seria atropelado.

Todo o efeito multiplicador vazaria na forma de importações e geração de empregos lá fora. 

Não são apenas negócios, portanto.

Cerca de 300 mil jovens brasileiros serão treinados nos próximos anos pelo Promimp, o Programa de Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás Natural.

Sem o novo marco regulador, que sofreu um cerco beligerante do conservadorismo, eles seriam desnecessários.

A arquitetura da soberania pressupõe, ainda, forte expansão da rede brasileira de refinarias, estagnada desde 1980.

Cinco plantas estão sendo construídas, simultaneamente.

Tudo isso causa erupções cutâneas na pátria dos dividendos, que prefere embolsar lucros rápidos, com o embarque predatório de óleo bruto.

O parque tecnológico de ponta que está nascendo na Ilha do Fundão, no Rio de Janeiro, com laboratórios de todo o mundo, é um desperdício do ponto de vista dessa lógica. 

Ele é uma espécie de berçário da reindustrialização que se preconiza.

Dali sairão inovações e tecnologias que vão irradiar saltos de eficiência e produtividade em toda a rede de fornecedores nacionais do pré-sal.

É desse amplo arcabouço de medidas e salvaguardas que poderão jorrar os recursos do fundo soberano para erradicar as grandes iniquidades que ainda afligem a população brasileira. 

Tudo isso é sabido. Mas passa hoje por um moedor de memória e esperanças, destinado a triturar a reputação da estatal, que detém o comando sobre esse processo.

Desqualificá-la é um requisito para reverter a blindagem em torno de uma riqueza, da qual as petroleiras internacionais e o privatismo de bico longo ainda não desistiram.

A Petrobras passa por ajustes compreensíveis depois do gigantesco estirão desencadeado pelas descobertas do pré-sal. 

Uma crise planetária atravessou o seu caminho e o do seu faturamento, bem como o de todas as grandes corporações do planeta. Após o colapso de 2008, a cotação do barril de petróleo recuou de US$150 para US$ 35.

Ainda assim, seu lucro em 2012 foi de R$ 21,18 bilhões.

Ficou em R$ 8 bilhões, ao final do governo do PSDB.

A narrativa que ensombrece o país capturou a Petrobras para a pauta da crise sem fim.

Cabe ao governo, em primeiro lugar, pôr ordem no seu próprio salão.

E trazê-la de volta para a agenda do desenvolvimento.
Postado por Saul Leblon às 06:09
É preciso evitar que a agenda da crise paralise e ensombreça o Brasil. 

Quem adverte são economistas simpáticos ao governo, preocupados com a prostração em que se encontra o debate do desenvolvimento. 

Seriam eles os últimos a subestimar o teor sistêmico da desordem internacional, cuja implosão, na verdade, previram e advertiram.

Mais que isso.

Atuam para mitigar seus efeitos no país. São ouvidos e consultados pelo governo na implantação de contrapesos estratégicos. 

Baixar as taxa de juros, reduzir o superávit primário e corrigir o câmbio, por exemplo. No limite, se necessário, adequar a meta de inflação.

O fundamental é assegurar a travessia do colapso mundial sem trazer a crise para dentro do Brasil, como anseia o conservadorismo. 

A agenda mercadista mal disfarça esse propósito. 

Com os meios generosos a sua disposição, difunde a fatalidade cinza em cada esquina. 

A ênfase sobressaltada atende a interesses de bolso, ideologia e palanque.

É um bloco respeitável. Exacerbado pelo poder desigual de vocalização que o monopólio midiático lhe confere. 

Tome-se o Brasil das manchetes, que não raro agridem o próprio texto. Tome-se a negligência diante das decisões estratégicas anunciadas na reunião dos BRICS, em Durban.(Leia reportagem nesta pág)

As cinco maiores economias emergentes criaram nada menos que um ensaio de FMI keynesiano; e um Banco Mundial de investimento, fora da hegemonia dos EUA. As manchetes preferiram espetar em Dilma a 'negligência com a inflação'. 

Tome-se, ainda, o silencioso, mas expressivo processo de reindustrialização dos EUA, que está trazendo de volta a manufatura de alta tecnologia.

Enfim, a crise continua, mas o mundo se move. 

A prostração inoculada diuturnamente pelo noticiário econômico recusa ao Brasil a capacidade de dizer: ‘eppur si muove’.

É um objetivo político, não um recorte isento.

A escolha menospreza singularidades locais que podem subverter a dinâmica da crise entre nós, dizem os economistas.

Eles dispensam os exemplos mais notórios desses trunfos -- o mercado de massa expandido nos últimos 11 anos e os níveis recordes de emprego.

Preferem se fixar em uma alavanca quase épica que foge ao estereótipo de um debate vicioso e datado sobre o desequilíbrio entre oferta e demanda, entre inflação e juros.

O passo seguinte do desenvolvimento brasileiro, dizem eles, está no impulso industrializante contido no pré-sal.

A paralisia da industrialização brasileira é real e afeta todo o tecido econômico.

Asfixiada pelo câmbio valorizado e pela concorrência chinesa, a indústria brasileira de transformação perdeu elos importante, em diferentes cadeias de fornecimento de insumos e implementos. 

Não é um fenômeno recente, mas é progressivo.

O PIB cresceu em média 2,8% entre 1980 e 2010; a indústria da transformação cresceu apenas 1,6%, em média. Sua fatia nas exportações recuou de 53%, entre 2001-2005, para 47%, entre 2006-2010 .

O mais preocupante é o recheio disso.

Linhas e fábricas inteiras foram fechadas. Clientes passaram a se abastecer no exterior. Fornecedores se transformaram em importadores. Apenas carimbam seu logotipo ao lado do fabricante estrangeiro. Empregos industriais foram eliminados; o padrão salarial do país foi afetado, para pior.

É possível interromper essa sangria, com redução de juros, incentivos, desonerações, protecionismo e ajuste do câmbio, como tem sido feito pelo governo.

Mas é difícil, muito, reverter buracos consolidados.

O dinamismo que se perdeu teria que ser substituído por um gigantesco esforço de inovação e redesenho fabril, a um custo que um país em desenvolvimento dificilmente poderia arcar. 

Exceto se tivesse em seu horizonte a exploração soberana, e o refino, das maiores jazidas de petróleo descobertas no século 21.

É esse bilhete premiado que o pré-sal representa para o Brasil.

São cerca de 50 bilhões de barris de petróleo, guardados a 300 km da costa e cerca de seis mil metros abaixo da superfície d’água.

O país tem tecnologia para tirá-lo de lá. Na verdade, a Petrobras detém a ponta dessa tecnologia no mundo.

Esse trunfo avaliza a possibilidade da reindustrialização, como resposta brasileira à crise.

A agenda enfatizada pelos economistas é o oposto do que alardeia o conservadorismo.

Seu empenho, neste momento, é sequestrar a Petrobras para o palanque da campanha sombria: o ‘Brasil que não dá certo’.

Os números retrucam.

O pré-sal já produz 300 mil barris/dia. Em quatro anos, a Petrobras estará extraindo 1 milhão de barris/dia da Bacia de Campos.

Até 2017, a estatal vai investir US$ 237 bilhões; 62% em exploração e produção.

Dentro de quatro anos, os poços do pré-sal estarão produzindo um milhão de barris/dia. Em 2020, serão 2,1 milhões de barris/dia. 

Praticamente dobrando da produção atual. 

O pré-sal mudou o tamanho geopolítico do Brasil. 

Não existe automatismo econômico que leve ao desenvolvimento: os efeitos virtuosos desse salto no conjunto da economia brasileira exigiam um lacre de segurança.

Ele foi fixado em lei, no governo Lula.

O marco regulador do pré-sal --aprovado com a oposição de quem agora agita a bandeira da defesa da Petrobras –- institui o regime de partilha e transfere o comando de todo o processo tecnológico, logístico, industrial, comercial e financeiro da exploração à estatal.

Todos os contratados assinados nesse âmbito passam a incluir cláusula obrigatória de conteúdo nacional nas compras –da ordem de 60% , pelo menos.

Esse é o ponto de mutação da riqueza do fundo do mar em prosperidade na terra.

Toda uma cadeia de equipamentos, máquinas, logística, tecnologia e serviços diretamente ligados, e também externos, ao ciclo do petróleo será alavancada nos próximos anos. 

O conjunto pode fazer do Brasil um grande exportador industrial nessa área.

É sobre isso que os economistas falam quando demonstram impaciência com o círculo vicioso de fatalismo embutido na pauta conservadora da crise.

O mais difícil foi feito.

O novo marco regulador transfere à Petrobras a responsabilidade soberana de harmonizar duas variáveis básicas: o ritmo da extração e do refino; e a capacidade brasileira de atender à demanda por plataformas, máquinas, barcos, sondas etc.

Se a exploração corresse livre, como gostariam a república dos acionistas e as multinacionais, o fôlego da indústria local seria atropelado.

Todo o efeito multiplicador vazaria na forma de importações e geração de empregos lá fora. 

Não são apenas negócios, portanto.

Cerca de 300 mil jovens brasileiros serão treinados nos próximos anos pelo Promimp, o Programa de Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás Natural.

Sem o novo marco regulador, que sofreu um cerco beligerante do conservadorismo, eles seriam desnecessários.

A arquitetura da soberania pressupõe, ainda, forte expansão da rede brasileira de refinarias, estagnada desde 1980.

Cinco plantas estão sendo construídas, simultaneamente.

Tudo isso causa erupções cutâneas na pátria dos dividendos, que prefere embolsar lucros rápidos, com o embarque predatório de óleo bruto.

O parque tecnológico de ponta que está nascendo na Ilha do Fundão, no Rio de Janeiro, com laboratórios de todo o mundo, é um desperdício do ponto de vista dessa lógica. 

Ele é uma espécie de berçário da reindustrialização que se preconiza.

Dali sairão inovações e tecnologias que vão irradiar saltos de eficiência e produtividade em toda a rede de fornecedores nacionais do pré-sal.

É desse amplo arcabouço de medidas e salvaguardas que poderão jorrar os recursos do fundo soberano para erradicar as grandes iniquidades que ainda afligem a população brasileira. 

Tudo isso é sabido. Mas passa hoje por um moedor de memória e esperanças, destinado a triturar a reputação da estatal, que detém o comando sobre esse processo.

Desqualificá-la é um requisito para reverter a blindagem em torno de uma riqueza, da qual as petroleiras internacionais e o privatismo de bico longo ainda não desistiram.

A Petrobras passa por ajustes compreensíveis depois do gigantesco estirão desencadeado pelas descobertas do pré-sal. 

Uma crise planetária atravessou o seu caminho e o do seu faturamento, bem como o de todas as grandes corporações do planeta. Após o colapso de 2008, a cotação do barril de petróleo recuou de US$150 para US$ 35.

Ainda assim, seu lucro em 2012 foi de R$ 21,18 bilhões.

Ficou em R$ 8 bilhões, ao final do governo do PSDB.

A narrativa que ensombrece o país capturou a Petrobras para a pauta da crise sem fim.

Cabe ao governo, em primeiro lugar, pôr ordem no seu próprio salão.

E trazê-la de volta para a agenda do desenvolvimento.
Postado por Saul Leblon às 06:09