sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Os desafios atuais do Direito Ambiental



 
Bruno Gasparini
Advogado, especialista em Gestão Ambiental, mestre em Direito das Relações Sociais, coordenador do Curso de Direito da Unibalsas
Adital
A atual conjuntura, caracterizada pela Globalização Geopolítica, pela Economia de Mercado e pela Era da Informação, agravou as condições que caracterizam a propalada "Crise Ambiental”, evidenciada pela perda da biodiversidade, pela erosão genética, pelo desflorestamento e fragilização de ecossistemas, pela depauperação das funções ecossistêmicas, pela introdução de espécies invasoras, pela poluição dos recursos hídricos, pelo esgotamento de determinados recursos naturais, pela alteração dos ciclos dos nutrientes, pela diminuição das terras agricultáveis, pelas mudanças climáticas, enfim, uma inumerável gama de problemas socioambientais resultantes das pressões antrópicas impulsionadas pelos fenômenos citados.
Diante de tais problemas, surgem inúmeros desafios epistemológicos, teóricos e práticos relacionados à construção e aplicabilidade da ciência jurídica ambiental. Para que tais desafios possam ser enfrentados, faz-se necessário levar em consideração pressupostos epistemológicos trazidos por teorias que não se abstiveram ao debate conjuntural, a exemplo da Transdisciplinaridade (Nicolescu), da Complexidade (Morin), do Risco (Beck) e da emergência de outras Racionalidades (Sachs e Leff), aportes que, indubitavelmente, fornecerão elementos aptos a uma reformulação teórica e prática do Direito Ambiental.
No que se refere aos pressupostos teóricos, é importante que o próprio objeto do Direito Ambiental seja ampliado, visto que a vertente preservacionista, que caracteriza a visão tradicional desse ramo da ciência jurídica, não se coaduna com a realidade contemporânea em que a ação antrópica se faz presente em praticamente todos os recantos do planeta. Sendo assim, pensar o ambiente, um bioma, um ecossistema, uma espécie ou processo de maneira isolada, sem levar em consideração as interações destes com os seres humanos, em nada ajuda a efetividade das políticas públicas ambientais.
No que tange aos pressupostos práticos, relacionados ao acesso à justiça, satisfação das demandas e resolução dos conflitos socioambientais, algumas questões merecem destaque. A primeira delas reside na visibilidade que é dada a determinados atores sócio-políticos e sua consequente legitimidade enquanto sujeitos de direito. O problema reside na orientação individualista e privatista que norteou a construção da sistemática processual civil brasileira, tendente a afastar demandas de sujeitos coletivos, a exemplo do que ocorre com as comunidades tradicionais. Tal óbice deve-se ao fato do CPC vincular interesse de agir com capacidade postulatória, como estabelece o art. 3º, fato que viabiliza apenas pretensões individuais e não coletivas.
Outro obstáculo se faz presente em razão das características inerentes às temáticas socioambientais, notadamente de caráter difuso e, portanto, enquadradas no rol de direitos de terceira dimensão, que não se coadunam com a sistemática liberal-individualista que norteou a construção dos direitos patrimoniais. Tal orientação torna dificultosa a afirmação dos direitos fundamentais das coletividades, notadamente quando tais direitos vão de encontro às regras que norteiam a propriedade imobiliária e a propriedade intelectual.
Ainda, cabe ressaltar que alguns óbices são impostos pelo próprio modelo de desenvolvimento adotado pelo Poder Público, o que, em última análise, determinará a construção das políticas públicas ambientais. No caso brasileiro, ainda estamos atrelados ao paradigma do crescimento contínuo e ao mito da universalização do desenvolvimento econômico (observe-se o conteúdo dos Programas de Aceleração do Crescimento), o que redunda em políticas públicas dúbias, que ora incentivam a produção e o consumo, sem maiores questionamentos de caráter socioambiental (a exemplo da redução do IPI dos veículos automotores), e ora perseguem a conservação dos recursos naturais (a exemplo dos vetos presidenciais a alguns dispositivos do Código Florestal).
Por fim, resta salientar a apropriação e deturpação do conceito de desenvolvimento sustentável por parte dos organismos multilaterais e dos conglomerados financeiros transnacionais que, por intermédio da "economia verde”, transformou os componentes do conceito em oportunidades empresariais (a exemplo dos créditos de carbono e dos pagamentos por serviços ambientais) com o simples propósito de abertura de novos nichos de mercado e não, necessariamente, de enfrentamento das causas que ocasionam conflitos socioambientais.
Em razão do exposto, a percepção de que o Direito Ambiental deve refundar-se a partir dos pressupostos do socioambientalismo se faz premente, pois permitirá que a ciência jurídica cumpra seu papel, consagrando-se como instrumento de proteção, seguridade e libertação, que reconheça a hipossuficiência de parte dos atores interessados e assegure a efetivação das justiças social e ambiental em um Estado que se exterioriza, em razão de preceitos constitucionais, como Democrático Socioambiental de Direito.

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