sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Saúde, Veríssimo!



A inteligência do país esteve em risco quando Veríssimo foi hospitalizado em estado grave. Brecht já disse que há pessoas importantes por lutarem em alguns momentos e conclui que algumas são indispensáveis porque o fazem durante toda a vida. Luís Fernando Veríssimo é um incansável batalhador pela inteligência nacional, o que não costuma ser atribuído a ele porque suas armas são sutis, como quem plana suavemente sobre o cotidiano de todos nós, nos oferecendo observações irônicas, muito sofisticadas para que pareçam representar alguma causa.

Montserrat Martins

Luis Fernando Veríssimo. Foto no site Pra Ler.

Luis Fernando Veríssimo
Sua causa é a educação cultural, o senso crítico, a consciência social – que ele não nos cobra, nos seduz a ver. Somos eternos aprendizes de seus ensinamentos, de uma amplitude capaz de alcançar desde a sua própria geração até a dos jovens de hoje. Ao invés do senso comum moralista ou superficial, a capacidade de nos mostrar nossas fraquezas cotidianas, nossas hipocrisias e contradições. Até a futilidade nele atingiu sua mais alta graça, nas passagens fulgurantes por suas páginas de Dorinha, a socialite socialista. Os sagazes investigadores ganharam mais humildade, com Ed Mort, e os psicanalistas mais objetividade, com o Analista de Bagé.
Nele a leveza não é superficial, é calculada como o modo de nos atingir no âmago, pois a digerimos sorrindo. E é justamente por sua calculada leveza, por sua sutil profundidade, que Veríssimo abriu todas as portas da comunicação brasileira – contribuindo com jornais, revistas, publicando livros e até tiras das Cobras (mesmo sempre dizendo não saber desenhar). Já teve atividades tão variadas que incluem desde equipes de redação para programas de TV, ou cobrir a Copa do Mundo para a Playboy.
Com a autoridade que o conhecimento e a sabedoria lhe conferiram ao longo do tempo, foi adquirindo o direito de dizer o que ninguém mais poderia – chegou a confessar que já escreveu horóscopo, no início da carreira, e não causaria estranheza se fosse autêntica uma frase sua usada como post no facebook, “às vezes, a única coisa verdadeira num jornal é a data”. Para quem conquistou espaços nobres nos maiores jornais não só do sul como do centro do país, ironizar o próprio meio que o consagrou seria um exemplo extremo do grau de liberdade que ele, sedutora e audaciosamente, atingiu.
Em 2012 o próprio Veríssimo escreveu seu lamento pela perda do Millôr e Ivan Lessa, gênios da categoria dele, o que o fez se sentir mais solitário, podemos imaginar. Agora chega, 2012, você já nos tirou demais, ainda precisamos – e muito – do Veríssimo, de preferência por largo tempo, para nos ensinar a pensar criticamente, com inteligência e graça. Não estamos prontos para ficarmos órfãos do nosso grande mestre. Saúde, Veríssimo, por ti, por tua família. E por todos nós.
Montserrat Martins, colunista do Portal EcoDebate, é Psiquiatra.

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