Nos arredores de Budapeste há um parque chamado Szoborpark, o Parque das Estátuas. Criado em 1993, este museu ao ar livre abriga esculturas que perderam espaço na Hungria com o fim do regime comunista.
CASSIANO ELEK MACHADO
CASSIANO ELEK MACHADO
Além de bustos de obsoletos líderes locais, como Béla Kun, estão lá, entre estátuas de Lênin e Stálin, diversas esculturas representando a efígie barbuda de Karl Marx.
Em conjunto ao lançamento da nova edição de "O Capital", a Boitempo e o Sesc-SP promovem, a partir de março, um ciclo de palestras e debates sobre Marx que se estenderá até maio.
"Marx - A Criação Destruidora" (veja programação completa acima) terá a participação de mais de 20 intelectuais de diversas áreas do conhecimento, incluindo convidados internacionais de renome, como o filósofo esloveno Slavoj iek, o geógrafo britânico David Harvey, que lançará, na ocasião, o livro "Para entender 'O Capital'", e o cientista político alemão Michael Heinrich.
"Marx - A Criação Destruidora" (veja programação completa acima) terá a participação de mais de 20 intelectuais de diversas áreas do conhecimento, incluindo convidados internacionais de renome, como o filósofo esloveno Slavoj iek, o geógrafo britânico David Harvey, que lançará, na ocasião, o livro "Para entender 'O Capital'", e o cientista político alemão Michael Heinrich.
O CIENTISTA POLÍTICO
Heinrich tinha 14 anos quando começou a ler Karl Marx, ainda no colégio. Hoje, aos 55, trabalha no MEGA, codinome do projeto alemão Marx-Engels-Gesamtausgabe, que vem reestabelecendo os textos e publicando em edições críticas todas as linhas já escritas pela dupla.
O professor, que virá ao país para uma palestra em 22 de março intitulada "Os Manuscritos de Karl Marx e Friedrich Engels", é autor de um popular livro de apresentação chamado "Uma Introdução aos Três Volumes de 'O Capital" (sem edição brasileira).
A menção aos "três volumes" no título de seu livro não é casual. Quais seriam as suas sugestões para entender bem o intrincado "O Capital"?, lhe questiona a Folha.
"Vou resumir todas minhas dicas em uma só", responde. "Leia 'O Capital' na íntegra."
Heinrich, que vem trabalhando em perspectiva não ortodoxa marxista (o próprio Marx se disse "não marxista" em carta para o genro Paul Lafargue, lembra ele) para recuperar o legado intelectual do autor, diz que certos livros de introdução desvirtuam os objetivos da obra.
"As três partes do livro formam uma unidade. Se você ler apenas o primeiro volume terá uma visão não só incompleta, como errada. O sentido integral, mesmo de categorias como valor e mercadoria, só se revela com o final do livro", afirma.
É preciso, diz ele, questionar o que Marx tenta analisar de fato. "Não era o capitalismo inglês nem o capitalismo do século 19, mas sim a organização interna do modo de produção capitalista, em seu ideal médio, como Marx resume no final do volume 3."
Nessa perspectiva, sustenta ele, a leitura do livro hoje faria muito mais sentido (e a Folha perguntou a importantes intelectuais brasileiros "por que ler Marx hoje"). "Grande parte da análise que ele faz do capitalismo se aplica muito mais ao que aconteceu no século 20 e no 21 do que ao tempo dele."
Heinrich diz que um dos grandes enigmas para ele "é entender como o trabalho de um homem que devotou a maior parte da vida à análise do capitalismo e fez pontuais notas sobre a sociedade capitalista é considerado o responsável por um modelo social extremamente autoritário chamado 'socialismo'".
Testemunha da queda do Muro de Berlim, em 1989, ele assistiu o interesse por Marx na Alemanha desabar, até ganhar empuxo novamente no final dos anos 1990.
Ele defende o projeto no qual trabalha, o MEGA (também chamado de MEGA-2, para se diferenciar de iniciativa semelhante dos anos 1920) por difundir uma visão mais científica de Marx.
O TRADUTOR
É com perspectiva condizente ao discurso de Heinrich que Rubens Enderle encarou a escalada do Everest que é a tradução de "O Capital".
Já responsável, sozinho ou em parcerias, por traduções de importantes trabalhos de Marx para a Boitempo, como "A Ideologia Alemã" e "A Guerra Civil na França", ele atuou durante dois anos no Marx-Engels-Institut da Academia de Ciências de Berlim-Brandemburgo, responsável pelo projeto MEGA.
Apesar de estar embebido em Karl Marx há muitas primaveras, Enderle, 38, diz que "não é marxista, mas sim um marxólogo", diz o tradutor gaúcho-mineiro-alemão.
"Isso influenciou o trabalho de tradução, pois minha preocupação como tradutor é permanecer o mais fiel possível aos textos, o que, no caso de Marx, implica se desvencilhar de chavões e vulgaridades ideológicas que se acumularam sobre sua obra ao longo de séculos."
Enderle, atualmente vivendo em Munique, ainda não chegou ao topo da montanha.
Ele está trabalhando no livro 2, que deve ser lançado no ano que vem.
Além das dificuldades tradicionais da tradução do alemão ("falta ao português palavras como 'coisal' ou 'coisalmente'"), ele sublinha outras dificuldades técnicas específicas: "Há passagens em que Marx entra em detalhes sobre peças mecânicas, principalmente de relojoaria". Um dicionário alemão de relojoaria foi de grande ajuda.
Segundo ele, o fato de a atual tradução ser a primeira baseada na edição MEGA trará mais diferenciais nos volumes 2 e 3 da obra, publicadas depois da morte de Marx.
Ivana Jinkings, diretora editorial da Boitempo, que tem extenso catálogo de marxistas, já publicou 15 obras de Marx e Engels (o campeão de vendas é "O Manifesto Comunista", com 15 mil exemplares), diz que o volume 3 será lançado em 2015. Curadora de diversos seminários sobre Marx, incluindo o atual, ela espera bater o recorde de público desta vez. "Esperamos mais de 15 mil pessoas."
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