sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Plano investirá R$ 8,8 bi na produção de alimentos saudáveis


Najla Passos

Brasília - O governo lançou nesta quinta (17) o Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica – Brasil Ecológico, que injetará R$ 8,8 bilhões, nos próximos três anos, em 125 iniciativas que visam ampliar a produção e o consumo de alimentos orgânicos e agroecológicos no país. Promessa da presidenta Dilma às camponesas que participaram da Marcha das Margaridas em 2011, o plano também dialoga com as diretrizes definidas na Rio 20, a conferência mundial da ONU sobre o meio ambiente.

O ministro do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas, que apresentou o plano aos 1,5 mil representantes dos movimentos sociais que participam da 2ª Conferência Nacional de Desenvolvimento Rural, em Brasília, o classificou como um marco na agricultura brasileira. Segundo ele, só em crédito agrícola, serão disponibilizados R$ 7 bilhões, por meio do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e do Plano Agrícola Pecuário.

O ministro afirmou que o plano vai integrar e articular um conjunto de políticas e ações que contribuem com o desenvolvimento sustentável. Entre elas, a garantia de assistência técnica e extensão rural, no prazo de três anos, para 73 mil assentados, dos quais 50% são mulheres, 26 mil famílias do agroextrativismo, seis mil pescadores e 10 mil jovens do campo.

O plano também apoiará a pesquisa e extensão desenvolvida pela Embrapa e pelas universidades, ao oferecer R$ 43,5 milhões em bolsas via CNPq. Investirá no acesso à água, por meio da distribuição de 60 mil cisternas no semiárido, e ampliará o acesso dos agricultores a sementes não transgênicas, em um investimento de R$ 168 milhões. Segundo o ministro, há hoje no país 10 mil agricultores certificados como produtores orgânicos. “A meta do plano é chegar a 50 mil”, destacou.

A presidenta Dilma, que decidiu falar de improviso para os beneficiários diretos das ações, destacou a ampliação do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que prioriza a compra de alimentos agroecológicos para os programas do governo. “No Brasil, nós fomos capazes de construir tecnologias de inclusão. (...)E o PAA é uma das nossas maiores e melhores tecnologias de inclusão no meio rural: nós garantimos a demanda”, afirmou.

A presidenta ressaltou que, quando assume um compromisso, como foi o de lançar este plano,  durante a Marcha das Margarida, há mais de um ano, ela cumpre. E justificou que a demora se deveu a opção por fazê-lo da forma mais democrática possível, ouvindo os mais diversos interessados. “Muita gente pode falar: ‘olha, mas levou tanto tempo’. É obvio que leva o tempo necessário para que todos participem, para que o plano não saia da cabeça de três ou quatro pessoas”, justificou.

Sua fala foi entrecortada por várias palavras de ordem, que pediam reforma agrária, demarcação de terras indígenas e quilombolas, um plano nacional para a juventude do campo e creches rurais, entre outros pontos. A presidenta, ao seu estilo, dialogou com cada uma delas. “Eu também concordo com creche rural. Mas vocês peçam isso no próximo programa, porque têm creches, o governo está fazendo seis mil creches. E se vocês querem creches, tem que dizer onde e quando”, improvisou.

Ela também comemorou a aprovação do Programa Mais Médicos pelo Congresso, na noite de quarta (16), que agora só depende da sua sanção para se tornar lei. E provocou os delegados da conferência: “A gente podia estar aqui discutindo mais médicos para o campo, porque lá não tem médicos. Ontem, nos aprovamos o Mais Médicos e eu asseguro a vocês que agora vai ter médicos no campo”, prometeu.

Alento em meio à ofensiva ruralista
Os movimentos sociais do campo comemoraram o lançamento do plano como um alento em meio à ofensiva que vêm sofrendo do agronegócio e dos ruralistas, na avaliação deles, muitas vezes com o aval do governo.

Representando o Movimento da Mulher Trabalhadora Rural do Nordeste, Maria Verônica de Santana destacou a emoção de vivenciar um momento tão importante para a agricultura familiar brasileira. “A agroecologia tem uma grande destaque na agenda dos movimentos rurais, especialmente nos movimentos de mulheres. Somos a favor da vida, de alimentos saudáveis e da soberania alimentar do povo brasileiro”, afirmou.

Ela observou, porém, que o plano, por si só, não resolve a desigualdade que assola o campo e nem freia a hegemonia do agronegócio no país. “A agroecologia e o processo de transformação agroecológica traz desafios: não podemos fazer agroecologia sem reforma agrária, precisamos garantir a água como direito e criar um plano para a redução do uso de agrotóxicos”, cobrou.

Representando a Comissão Nacional de Agroecologia, que trabalhou na elaboração do plano, o engenheiro agrônomo do MST, Elson Borges dos Santos, disse que o plano traz em si uma semente de revolução, porque muda o rumo das coisas e inicia um processo de recivilização. Mas também observou, que embora o sentimento dos movimentos sociais é de comemoração, muito ainda está por se fazer. “Temos 20% da água potável do mundo, mas também temos a maior concentração de recursos naturais”, exemplificou.

Em entrevista à Carta Maior, Alexandre Conceição, da coordenação nacional do MST, reforçou as observações dos companheiros. “O plano é uma excelente iniciativa, a ampliação do PAA é fundamental, mas sem reforma agrária, não haverá como expandir a produção de alimentos saudáveis, porque o grosso da produção ainda estará nas mãos do agronegócio”, afirmou.

Segundo ele, a destinação de R$ 7 bilhões em créditos rurais via Pronaf também não irá beneficiar o grosso dos assentados da reforma agrária e pequenos agricultores familiares, que já estão muito endividados com o programa, sem conseguir negociar uma solução viável com o governo. “A proposta que apresentamos na nossa jornada de lutas, esta semana, é que o governo aceite abater parte da dívida e aceite o pagamento em produção de alimentos. Não pedimos perdão da dívida, como os grandes produtores, mas uma negociação adequada”, justificou.

Conceição criticou, ainda, a contradição do governo em lançar um plano que estimula a produção de alimentos saudáveis, enquanto apoia a bancada do agronegócio na aprovação de leis que autorizam o aumento do uso de agrotóxicos, inclusive o de fórmulas já abolidas nos principais países do mundo. “Elogiamos essa iniciativa do governo, mas consideramos que seu compromisso maior ainda é com o agronegócio, e não com os movimentos do campo”, concluiu.

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