'Quando a Embraer começou a incomodar a Bombardier com sua concorrência, o Canadá logo tratou de questionar o financiamento de suas exportações na OMC; Não bastasse, acabou levantando suspeitas de que o gado “verde” brasileiro poderia estar contaminado com o mal da vaca louca. Agora, setores do Congresso perseguem o BNDES, presidido por Luciano Coutinho, com argumentos tão toscos e desonestos quanto o usado pelo governo canadense; Uma coisa, porém, é certa: a Bombardier agradece'; alerta é do sociólogo e especialista em Relações Internacionais Marcelo Zero, em artigo para o 247; leia
quinta-feira, 11 de junho de 2015
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Por Marcelo Zero
Em 1996, a EMBRAER participou de sua primeira grande concorrência internacional.
Tratava-se do fornecimento de 150 aeronaves para as empresas americanas de aviação regional ASA e Comer. A Embraer entrou na concorrência com o seu ERJ-145, um jato regional moderno e eficiente. Era o melhor avião e ainda tinha a grande vantagem de ser o mais barato.
Contudo, a EMBRAER perdeu. Perdeu para a Bombardier, que oferecia melhores condições de financiamento para os compradores, pois contava com forte apoio governamental para a comercialização de suas exportações.
Pouco tempo depois, a gigante American Airlines lançou concorrência de US$ 1 bilhão para a compra de jatos regionais. Era a grande oportunidade que a Embraer tinha de pagar o custoso desenvolvimento do ERJ-145 e de se lançar no promissor mercado internacional de aviação regional, que crescia exponencialmente.
Mas a Embraer sabia que não tinha a menor condição de ganhar a concorrência, mesmo tendo o melhor avião, se não contasse com condições de financiamento semelhantes às que dispunham as suas concorrentes.
Resolveu, então, bater na porta do BNDES. A Embraer tinha de oferecer um financiamento à American Airlines que contemplasse não apenas taxas de juros baixas e amortização de longo prazo, mas também a garantia da devolução das aeronaves, caso houvesse algum problema com os equipamentos.
Para o BNDES, era uma aposta de risco considerável. A Embraer era novata nesse mercado e, caso ocorresse algum problema com as suas aeronaves, o banco ficaria em maus lençóis. Nenhum banco privado, nacional ou internacional, queria assumir esse risco.
O BNDES, entretanto, resolveu confiar na Embraer e ofereceu o financiamento com todas as garantias exigidas pela American Airlines.
Resultado: a Embraer ganhou a concorrência e, com isso, iniciou uma carreira vitoriosa no mercado internacional de aviação regional e executiva.
Hoje, a Embraer oscila entre a terceira e a quarta maior empresa mundial do setor. Apenas em 2013, entregou 90 aeronaves comerciais e 119 de aviação executiva, obtendo uma receita líquida de R$ 13, 64 bilhões. É, de longe, a empresa brasileira que mais exporta produtos de alto valor agregado, gerando altos rendimentos e empregos muito qualificados no Brasil.
Assim, a Embraer e o Brasil aprenderam a lição. Não se faz exportações volumosas de bens e serviços, no concorridíssimo mercado internacional, sem apoio financeiro governamental e bancos públicos de investimento.
A Embraer da qual tanto nos orgulhamos simplesmente não existiria, caso não tivesse contado com o apoio do BNDES.
Ironicamente, o orgulho justificado que dedicamos à Embraer não se estende ao banco público que financiou o seu sucesso e o de tantas outras empresas brasileiras.
Ao contrário, há, atualmente, uma grande campanha contra esse estratégico banco público de investimentos.
Uma campanha bem sórdida, por sinal. A desonestidade intelectual que cerca o debate sobre a atuação desse grande banco público de investimentos é assustadora. A bem da verdade, ou é desonestidade intelectual assustadora ou é ignorância abissal.
Tratava-se do fornecimento de 150 aeronaves para as empresas americanas de aviação regional ASA e Comer. A Embraer entrou na concorrência com o seu ERJ-145, um jato regional moderno e eficiente. Era o melhor avião e ainda tinha a grande vantagem de ser o mais barato.
Contudo, a EMBRAER perdeu. Perdeu para a Bombardier, que oferecia melhores condições de financiamento para os compradores, pois contava com forte apoio governamental para a comercialização de suas exportações.
Pouco tempo depois, a gigante American Airlines lançou concorrência de US$ 1 bilhão para a compra de jatos regionais. Era a grande oportunidade que a Embraer tinha de pagar o custoso desenvolvimento do ERJ-145 e de se lançar no promissor mercado internacional de aviação regional, que crescia exponencialmente.
Mas a Embraer sabia que não tinha a menor condição de ganhar a concorrência, mesmo tendo o melhor avião, se não contasse com condições de financiamento semelhantes às que dispunham as suas concorrentes.
Resolveu, então, bater na porta do BNDES. A Embraer tinha de oferecer um financiamento à American Airlines que contemplasse não apenas taxas de juros baixas e amortização de longo prazo, mas também a garantia da devolução das aeronaves, caso houvesse algum problema com os equipamentos.
Para o BNDES, era uma aposta de risco considerável. A Embraer era novata nesse mercado e, caso ocorresse algum problema com as suas aeronaves, o banco ficaria em maus lençóis. Nenhum banco privado, nacional ou internacional, queria assumir esse risco.
O BNDES, entretanto, resolveu confiar na Embraer e ofereceu o financiamento com todas as garantias exigidas pela American Airlines.
Resultado: a Embraer ganhou a concorrência e, com isso, iniciou uma carreira vitoriosa no mercado internacional de aviação regional e executiva.
Hoje, a Embraer oscila entre a terceira e a quarta maior empresa mundial do setor. Apenas em 2013, entregou 90 aeronaves comerciais e 119 de aviação executiva, obtendo uma receita líquida de R$ 13, 64 bilhões. É, de longe, a empresa brasileira que mais exporta produtos de alto valor agregado, gerando altos rendimentos e empregos muito qualificados no Brasil.
Assim, a Embraer e o Brasil aprenderam a lição. Não se faz exportações volumosas de bens e serviços, no concorridíssimo mercado internacional, sem apoio financeiro governamental e bancos públicos de investimento.
A Embraer da qual tanto nos orgulhamos simplesmente não existiria, caso não tivesse contado com o apoio do BNDES.
Ironicamente, o orgulho justificado que dedicamos à Embraer não se estende ao banco público que financiou o seu sucesso e o de tantas outras empresas brasileiras.
Ao contrário, há, atualmente, uma grande campanha contra esse estratégico banco público de investimentos.
Uma campanha bem sórdida, por sinal. A desonestidade intelectual que cerca o debate sobre a atuação desse grande banco público de investimentos é assustadora. A bem da verdade, ou é desonestidade intelectual assustadora ou é ignorância abissal.
Com efeito, divulgou-se uma série de mentiras deslavadas sobre esse banco.
Disseram, por exemplo, que o BNDES investe muito em obras na Venezuela, Cuba, Angola, etc., em detrimento dos investimentos imprescindíveis para o Brasil.
Ora, como bem assinalou o presidente Luciano Coutinho, entre 2007 e 2014, as operações de apoio à exportação de serviços do BNDES corresponderam a apenas cerca de 2% do total dos financiamentos que foram oferecidos pelo banco.
Portanto, o BNDES investe ao redor de 98% de seus recursos no Brasil.
Mesmo assim, há gente que, iludida pelas mentiras divulgadas, quer simplesmente proibir o BNDES de dar apoio financeiro à exportação de serviços. A natureza obviamente beócia da proposta deveria saltar aos olhos até do reino mineral, caso lá houvesse olhos, mas há gente que a leva a sério, mesmo no Congresso Nacional.
Da mesma forma, alegou-se que as taxas usadas pelo BNDES para a exportação de serviços constituíam “subsídios indevidos” às empreiteiras. Argumento muito parecido ao usado pelo governo canadense, quando nos acionou na OMC quanto às exportações da Embraer. Ora, o uso das taxas Libor nessas operações foi estabelecido em 1996, pois, para ser competitivo no mercado mundial, é necessário praticar financiamentos com base em taxas internacionais.
Insinuaram também que o sigilo envolvido nas operações financeiras de exportação de serviços destinava-se a ocultar ilícitos e favorecimentos ideológicos a governos “comunistas” e “bolivarianos”, lançando uma suspeita indigna sobre o BNDES, banco que opera com critérios técnicos rigorosos e no qual a análise da concessão de um grande empréstimo demora, em média, 450 dias.
Ora, o BNDES não pode divulgar os detalhes dessas operações financeiras não porque não queira, mas simplesmente porque não pode. Ele é proibido por lei de fazê-lo.
A Lei Complementar nº 105, de 2001, ratificada no segundo governo tucano, protege o sigilo do tomador de empréstimo, independentemente do banco ser público ou privado. Não interessa se o empréstimo foi obtido junto ao Itaú, ao Bradesco, ao Banco do Brasil ou ao BNDES: a proteção jurídica é a mesma.
Há quem argumente, entretanto, que, no caso de banco público, não deveria haver nenhum sigilo. Bom, nesse caso, a lei tucana teria de ser modificada.
O problema maior, porém, não é esse. Leis podem ser modificadas. A dura realidade do concorrido mercado internacional de bens e serviços não pode.
Imaginemos o cenário idealizado pelos que propugnam pela total transparência dessas operações financeiras. Caso a Embraer precisasse do apoio do BNDES para fazer uma grande exportação de aeronaves, esse banco estaria obrigado a divulgar ao público informações sensíveis e estratégicas da empresa, como nível de endividamento, capacidade de pagamento, nível de exposição ao risco, probabilidade de êxito na concorrência, competitividade do bem a ser exportado, estratégia de atuação da empresa no mercado mundial, etc.
Bonito, não? Bonito, e por certo, muito inteligente também. A Bombardier e outras empresas concorrentes das empresas brasileiras lá fora concordam inteiramente.
É por isso que nenhum banco que financia exportações no mundo divulga detalhes sensíveis dessas operações. Os americanos não o fazem, os alemães e os chineses, tampouco. Ninguém faz. É fácil imaginar a razão. Menos no Brasil.
Na realidade, conforme a Open Society Foundations, principal ONG mundial dedicada à transparência, o BNDES já é o banco de investimentos mais transparente do mundo. E essa transparência não adveio de pressões recentes. Ela já fazia parte da linha de atuação do banco há bastante tempo. Conforme o testemunho da Open Society, que participou de muitas reuniões com o BNDES, o programa de crescente transparência do banco avançou por iniciativa da própria gestão do BNDES.
Há muito que o BNDES disponibilizava informações sobre essas linhas de crédito que praticamente nenhum banco semelhante do mundo fornecia. Junto com o Eximbank dos EUA, o BNDES era o único banco que, há anos, oferecia ao público informações como relatórios detalhados anuais, portal de transparência com possibilidade requisição de informações e estatísticas detalhadas online.
O novo portal apenas ampliou a transparência já existente.
Tudo isso deveria ser motivo de orgulho em qualquer país do mundo. Menos no Brasil.
Aqui continuam as acusações parvas contra o banco e as iniciativas para submeter o BNDES a uma CPI. Sempre com argumentos desonestos e mal informados.
Quando a Embraer começou a incomodar a Bombardier com sua concorrência, o governo canadense logo tratou de questionar o financiamento de suas exportações na OMC. Não bastasse, acabou levantando suspeitas de que o gado “verde” brasileiro poderia estar contaminado com o mal da vaca louca. Um golpe desonesto, que, por iniciativa do então deputado Aloizio Mercadante, provocou a pronta resposta do Congresso Nacional, o qual sustou a tramitação dos atos internacionais firmados com o Canadá. Assim, o Legislativo brasileiro defendeu o Brasil, a Embraer e, por tabela, o banco que financiou seu sucesso mundial.
Agora, setores desse mesmo Congresso perseguem o BNDES, com argumentos tão toscos e desonestos quanto o usado pelo governo canadense.
Não se sabe ao certo no que isso vai dar.
Uma coisa, porém, é certa: a Bombardier agradece.
Haja vaca louca!
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