AGROTURISMO
OS PRIMEIROS PASSOS
DE UMA COMUNIDADE RURAL
DA MONTANHA CAPIXABA.
VENDA NOVA DO IMIGRANTE.
LEANDRO CARNIELLI
Apresentação -
Os primeiros passos -
O projeto -
Organização e êxito -
A família -
Associativismo -
Atrativos e potencialidades -
Perfil do turista -
Como receber o turista e o que ele - quer saber
A fazenda e a família -
O produto a ser comercializado -
A imprensa -
Opinião -
Uma breve análise -
Conclusão
APRESENTAÇÃO
Agroturismo me faz retornar ao ano de 1992,
quando participamos do Congresso Internacional das Escolas Famílias Agrícolas
na Espanha. Na época eu era Secretário Executivo do Movimento Educacional e
Promocional do Espírito Santo (MEPES), que convidou para participar da
delegação capixaba o Vice-Governador e Secretário da Agricultura, Adelson
Salvador, o jornalista Ronald Mansur e a pedagoga Eliane Stauffer de Andrade
Mansur. Após o Congresso visitamos o agroturismo na Itália.
A
idéia do agroturismo capixaba surge na visita a Azienda Agroturistica
Mondragon, de Roberto e Tina Tessari, ele que trabalhou como voluntário no
Mepes na década de 70. A idéia virou semente e foi lançada em Venda Nova do
Imigrante. Mais adiante o Mepes enviou a Itália o agrônomo José Valdemar Pin,
para um curso de especialização.
A
idéia/semente germinou e o agroturismo deu os primeiros passos, já é marco e
referencia. Produtos de qualidade e
atendimento de primeira geram trabalho e renda. Famílias competentes que buscam
sobreviver e permanecer no campo. Leandro nos mostra uma fotografia da
capacidade, criatividade, vontade e espírito empreendedor da família rural. Vi
nascer e crescer o agroturismo, alegria pessoal e mais uma ação vitoriosa do
Mepes.
Cachoeirinha,
Rio Novo do Sul, 11/09/2002.
João
Baptista Martins, agricultor.
OS PRIMEIROS PASSOS
Em
1986 nossa família, Zorzal Carnielli, estava diante de dois problemas para
resolver. O primeiro era encontrar nova fonte lucrativa que não fosse a
monocultura do café. Conversávamos muito para encontrar saídas viáveis. O preço do café oscilava muito no decorrer
dos anos, havia anos bons e anos ruins. Outro problema era o grande número de
membros que possuía. Mais pessoas, mais despesas com alimentação, vestuário,
saúde e educação. Tudo ia ficando sem horizontes.
Nessa
época, Pedro, o oitavo irmão, cursava agronomia em Viçosa/MG. Esse investimento
ajudou a família a aprofundar a idéia de encontrar novas alternativas. A opção
foi introduzir a pecuária de leite, já tínhamos alguns animais para consumo
próprio, que dizíamos ser da raça PC, Puro Carrapato. Queríamos vacas boas de
leite, pois as que tínhamos só eram boas no preparo físico, subiam e desciam
morros, o dia todo.
Para
iniciar a mudança compramos algumas vacas que produziam oito litros de leite
por dia. Em pouco tempo elas tornaram-se insuficientes para nossas
expectativas, o que nos fez buscar novos animais.
Esse
período foi muito difícil. Na região ninguém tinha o tipo de animal que
queríamos, já que necessitava de um tratamento diferenciado. Foi
indispensável a busca de tecnologia.
Fomos a outros Estados onde havia experiência na atividade. Junto com o gado
melhor, nasce outro desafio: o que fazer com o leite. Iríamos transformá-lo em
queijos? Mas que queijo faríamos?
Tínhamos
em mente fazer um produto de boa qualidade. Esbarramos em uma enorme
dificuldade. Não sabíamos como melhorar o queijo que a nona (vovó) fazia no
passado e que minha mãe fazia do mesmo jeito. Não havia nenhum órgão do Governo
ou da iniciativa privada que pudesse ajudar. Na busca encontramos solução para
as rachaduras que apareciam no queijo após três dias de fabricado. Viajamos mil
quilômetros para descobrir que bastava envolver o queijo com um pano no momento
de ser prensado. Com essa história já havia passado três anos de muito
aprendizado e a produção diária era de cinco a dez queijos.
Essa
história mostra como é difícil iniciar uma nova atividade e que o futuro pode
ser promissor, mesmo que o presente seja difícil. É preciso luta, pois nada cai
do céu. Nesse momento a união de todos é de fundamental importância,
principalmente a união da família em torno do mesmo objetivo.
Vou
falar agora de uma outra história, que veio para marcar uma época e iniciar uma
nova atividade. Sem pensar, sem planejar, tudo aconteceu espontaneamente.
Quando trouxemos os animais e começamos a fazer mais queijos, as visitas
aumentaram, eram vizinhos e amigos. Depois vinham as perguntas sobre a
transformação do leite: como se faz queijo que ficava tão liso e sem aqueles
furinhos. Queriam saber tintim por tintim.
A
parte mais importante da tempestade de perguntas era: você vende? Gostaria de
levar esse produto que acabei de ver todo o processo produção e
industrialização. Algumas dessas pessoas já estavam nos visitando há horas. Foi
aí que começamos a analisar o comportamento dos visitantes e a entender que o
negócio rendia e que poderia ser uma boa fonte de renda. E que fonte. Diferente
daquela que provinha da venda anual do café, porque passamos a ter renda quase
todos os dias.
Percebemos
que as visitas aconteciam principalmente nos finais de semana. Daí a pergunta:
quem nos visitava? Começamos a estudá-las e vimos que estávamos hospedadas em
hotéis da região ou em casa de amigos.essas observações foram
superficiais.novas e de futuro desconhecido. Passaram-se quatro anos. O bom era
que todo o queijo produzido tinha comprador e a venda acontecia na nossa casa.
O PROJETO
A
partir do ano de 1992 nasce o agroturismo. Um grupo de pessoas a estudar o
comportamento dos visitantes de forma técnica e objetiva. Vamos falar da pessoa
que teve o papel mais importante nessa história, Ronald Mansur, jornalista e
editor do Jornal do Campo da TV Gazeta. Ele sempre esteve do lado do pequeno
para oferecer a sua ajuda. Sua teoria sempre esteve voltada no sentido de que a
comunidade saber fazer e transformar um projeto, simples e humilde, mas com
base sólida, pois o saber do povo resolve. Dizia que não precisávamos de
projetos vindos de cima ou mesmo de políticos interessados.
Aqui
abro um espaço para Ronald Mansur falar sobre o início do Agroturismo.
-
Tudo começa como João Baptista Martins falou na apresentação deste livro sobre
o Congresso Internacional da Escola Família Agrícola na Espanha e depois em
Padova, na região do Veneto, norte da Itália, onde fomos recebidos pela
Associação dos Amigos do Estado do Espírito Santo (AES) e por uma infinidade de
agricultores ao Mepes. Na casa da família de Roberto e TinaTessari, a Azienda
Agroturistica Mondragon, sonhamos com o agraturismo.
No
dia 15 de julho de 1992, uma quarta feira, passando por Venda Nova do
Imigrante, numa viagem pelo Jornal do Campo, fui ao Alpes Hotel que estava para
ser inaugurado. Imaginei uma parceria do hotel com os agricultores. Promovi um
encontro e uma conversa entre eles. Na realidade uma conciliação de interesses.
As propriedades receberiam os hóspedes do hotel, que poderiam ter momentos de
lazer e também de compras de produtos rurais. Ainda em 1992, no mês de setembro
ocorreu uma reunião no Alpes Hotel onde foi debatido o modelo e a forma
integração.
Antes
de devolver a palavra ao Leandro, quero registrar a carta que juntamente com
minha família enviamos no dia 22 de maio de 1993 à família Zorzal Carnielli e
que está na lojinha da Fazenda Providência.
Nesta casa o
Agroturismo capixaba deu o primeiro passo.
A família Zorzal Carnielli
é a grande mestra: no trato com a terra, no trabalho com as plantas, na lida
com os animais e no dia a dia com as pessoas.
Aqui o convívio nos
fez voltar à nossa família e à nossa casa.
Todos os dias eles
registram a marca da competência, da qualidade e da alegria de viver.
Quando viemos pela
primeira vez, sentimos terra firme.
Terra de gente
franca, aberta para a vida e para o Mundo.
Um banco de madeira
nos espera, tem anos de vida e de história.
Um convite...
Acomodar e deixar o tempo passar com conversas que não terminam nunca,
embaladas no sabor de um cafezinho com queijo.
Atestamos e damos fé,
a garra da família Zorzal Carnielli e aos que aqui deixam o seu suor em forma
de trabalho.
Vila Velha, 22 de
maio de 1993.
Ronald, Eliane,
Augusto, Vinícius e Helena Mansur.
O
resto da conversa é com Leandro, que com o sentimento que tem na alma, nos
deixará grandes lições. Siga e confira...
Na
volta, Mansur, entusiasmado espalhou a idéia entre nós. Começa a fase
importante: projetar o agroturismo.
Outra
pessoa incansável foi o engenheiro Luiz Perin, parece que nasceu para pensar de
forma objetiva, sabendo bater na porta certa, sempre com dedicação.
Éramos
tidos como malucos e até ouvíamos dizer que era mais uma maluquice para Venda
Nova do Imigrante. No decorrer de três anos nós não tínhamos hora nem para
nossas famílias. Todo tempo vago era para nos encontrar e falar do nosso
projeto.
Diante
de propostas viáveis à nossa realidade, entendemos estar no momento certo para
iniciar a estruturação das atividades que já desenvolvíamos. O Jornal do
Campo/TV Gazeta fez uma matéria sobre a fabricação de queijos na propriedade e
foi um sucesso. Após a exibição do programa o telefone tocou o dia todo.
Queriam saber mais sobre os queijos e como adquiri-los. A novidade foi o fato
de que um produtor rural pudesse fazer um bom produto. Este programa nos deu
crédito e ampliamos nosso espaço na sociedade.
A
novidade despertou outras pessoas da comunidade, que viram que poderiam entrar
no negócio. Aparece Tia Cila Altoé com seus biscoitos e doces que fazia ha
muitos anos, principalmente para festas de casamento. Quem não gosta de
biscoitos e doces feitos com tanto amos.
Surge
Josepha Mullers Trakofler, uma alemã que tem um jeito especialem organizar
pessoas. Sabe tudo sobre geléias doces, com experiência internacional.
Outra
pessoa, a rainha de coração e o abraço maior de todos, a simpatia do receber,
tia Cacilda Caliman Lourenção com seus socol (salaminho) e verduras sem
agrotóxicos.
Todas
estas famílias tiveram seus produtos mostrados na TV Gazeta. Ronald Mansur, que
sempre acompanhou nossos passos, encontrando mercado para os nossos produtos e
nos ensinando a entender o comércio. A cada instante aprendíamos observando os fatos, o comportamento,
valorizando tudo.
A
pedido de Adelson Salvador, Secretário da Agricultura, montamos um projeto
regional com apoio de Maria Angélica Fonseca, Rute Paste e pessoas da
comunidade. Selecionados sete municípios: Conceição do Castelo, Domingos Martins,
Viana, Afonso Claudio, Castelo, Vargem Alta e Venda Nova do Imigrante. Com o
projeto nasce a associação AGROTUR (Centro de Desenvolvimento do Agroturismo),
com representação jurídica. Uma forma de agrupar pessoas interessadas em
participar do grupo.
O
lançamento do AGROTUR ocorreu na Casa da Cultura de Venda Nova do Imigrante no
dia 05 de março de 1993. Assumi a presidência e Luis Perin a superintendência.
Uma
fase importante foi a parceria com o Sebrae, que indicou Vera Perin para
coordenar o projeto de capacitação, treinamento e cursos aos associados dos
municípios envolvidos, chegando a mais de duas mil horas, sempre de acordo como
interesse dos associados.
Outra
vitória, a abertura da loja do agroturismo no Alpes Hotel, em outubro de 1993,
por ocasião da Festa da Polenta. Éramos quatro produtores. A proposta: fazer
uma experiência de quatro meses, cada um pagaria o funcionário por um mês, se
não desse certo tomaríamos outra decisão. Tudo deu certo. A loja funciona até
hoje, também como posto de informação e divulgação.
Promovemos um
seminário em janeiro de 1994 que foi um marco, em especial a palestra do
italiano Roberto Tessari. O que ele disse era o que nós fazíamos e não sabíamos
se estava certo ou não. O conceito sobre como receber turista e crescimento
para o futuro veio da experiência dele
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