Análises microbotânicas realizadas em sítios arqueológicos na região de Urubici, em Santa Catarina, revelam que as populações Jê Meridional produziam alimentos como o milho, a mandioca e a abóbora mais de cem anos antes da chegada dos portugueses, acontecida no século 16. A descoberta feita em pesquisa do Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE) da USP modifica a ideia de que os habitantes das terras altas do sul do Brasil eram semi-nômades e viviam principalmente da caça e da coleta. As análises permitiram interpretar as paisagens e compreender a história das populações, antepassadas dos atuais índios Kaingang ou Xoleng, além do padrão de assentamento humano dentro da tradição arqueológica Taquara-Itararé.
Júlio Bernardes
Júlio Bernardes
Fragmentos de potes cerâmicos contêm resíduos de plantas cultivadas
Área em que estão localizados vestígios de habitações subterrâneas dentro do sítio arqueológico Urubici 20
PresençaA presenca Jê no alto vale do Rio Canoas, na região de Urubici, se inicia em um periodo ecológico marcado pela predominância da vegetação de campos em relação a floresta de araucária, há mais de 1.500 anos. “Ele é seguido por uma fase de grande expansão das araucárias, por volta de 1.000 anos atrás, com aumento do número e dos tipos de sítios arqueológicos, indicando grandes mudanças sociais”, descreve o arqueólogo. “Também há vestígios de uma fase anterior a presença dos europeus, 600 anos atrás, no Sítio Bonin, e de uma fase em que a implantação de fazendas portuguesas no interior do continente, há 300 anos, desestabilizou a estrutura social e econômica desses povos”.
Local das estruturas de cocção (fogões) onde foram encontrados os potes
O arqueólogo observa que a partir dos resultados das escavações é possível dizer que, mais de um século antes da conquista da América, as populações Jê no sul do Brasil desenvolviam aquilo que chama de “economia mista”, onde a agricultura exerce um papel importante de complementaridade a caça, a coleta e a pesca. “Pode-se inferir que a economia dos moradores do Sítio Bonin, em condições ideais, possibilitava a sua permanência durante todo o ano no planalto”, ressalta. “As variedades modernas de mandioca, milho, feijão e abóbora tem épocas de plantio e colheita que permitem dizer isso, já que esses cultivos acontecem exatamente na primavera e verão”.
O “Projeto Arqueológico Alto Canoas (Paraca), Um Estudo da Presença Jê no Planalto Catarinense”, é um desdobramento do “Projeto Arqueológico Sambaquis e Paisagem: modelando a inter-relação entre processos formativos culturais e naturais no Litoral Sul de Santa Catarina”, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). O Paraca foi desenvolvido na área do município catarinense de Urubici, obedecendo a todos os trâmites legais exigidos para a pesquisa arqueológica. O aporte financeiro para a realização do projeto partiu do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
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