terça-feira, 15 Março, 2016 - 17:30
A força com que os fenômenos meteorológicos têm se manifestado, nos últimos anos, tem surpreendido e afetado a vida de quem tira do campo o seu sustento. A agricultura é a atividade econômica mais sensível a essas alterações climáticas bruscas, sendo os produtores familiares os mais vulneráveis aos revezes do tempo. Para alertar a população para sobre essas descompensações atmosféricas, celebra-se, na data de 16 de março, o Dia Nacional da Conscientização sobre as Mudanças Climáticas. O objetivo é atentar para a necessidade de ações que reduzam o impacto dessas alterações no meio ambiente.
Conforme o meteorologista do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), Fabrício Silva, fenômenos extremos, como seca severa e chuvas intensas, são acontecimentos normais na natureza. No entanto, ele destaca que nos últimos anos as mudanças bruscas no tempo estão mais frequentes.
Muitos são os fatores que têm colaborado para que isso ocorra. Na região Amazônica, o desmatamento é o que mais contribui negativamente para as condições climáticas. De 2005 para cá, segundo Silva, a região intercalou três grandes eventos de seca, seguidos de períodos de muita chuva. “A série histórica do clima aponta que esses fenômenos estão se alternando em um espaço menor de tempo”, explica.
São Paulo é outro exemplo. Entre os anos de 2013 e 2014, o estado passou por uma grande seca, o que levou a uma crise hídrica. Em 2001, o mesmo fenômeno já havia ocorrido, porém com impacto menor para a população, porque não faltou água. De acordo com o meteorologista, estudos apontam que, na década de 60, já tinham ocorrido períodos de seca bem semelhantes no estado. “Tivemos períodos de seca normais em outros momentos, mas não tão intensos como nesses dois últimos episódios, 2001 e 2014. Então, realmente parece que eventos dessa magnitude estão acontecendo em períodos cada vez menores de tempo”, analisa.
Agricultura Familiar
No Nordeste sabe-se que a falta de chuva é comum. Mas o que chama a atenção, segundo Silva, é que a seca severa na região já vai para o seu quinto ano consecutivo. E, justamente no semiárido nordestino estão muitos dos agricultores familiares, os mais vulneráveis às mudanças do clima. São produtores de baixa renda, e muitas vezes a agricultura praticada por eles é de subsistência. Se as chuvas e as temperaturas forem favoráveis, eles conseguem produzir para estocar, se alimentar, comercializar e ter sementes para lavoura do próximo ano. Mas a regra, na região, é a quebra de safra.
“Esses produtores dependem fortemente do clima. Com condições meteorológicas desfavoráveis, eles não conseguem crescer por si, ter uma renda ou recursos para adquirir máquinas modernas. Analisando esses fatores, pode-se dizer que essas alterações climáticas poderão causar ainda mais desigualdade social”, avalia.
Seca castiga o Nordeste
O quinto ano de seca no Nordeste fez com que a plantação de milho do produtor familiar Raimundo Antônio de Oliveira, 57 anos, fosse mais uma vez perdida em 2015. Nos sete hectares de lavoura, ele conseguiu colher apenas 23 sacas de milho, o que deu apenas para alimentar os animais da sua propriedade, localizada no município de Jardim, no Ceará. Em condições normais, Oliveira diz que a perspectiva é colher entre 60 e 80 sacas do grão por hectare. “Retirar apenas 23 sacas, considero perda total da lavoura”, explica.
Oliveira também tem a plantação assegurada pelo Seguro da Agricultura Familiar (Seaf). Recebeu em 2014 e já solicitou o benefício referente ao ano passado. “Ter uma roça assegurada ajuda muito. Se o tempo é bom, tenho como pagar o empréstimo no banco e dá até para plantar mais”, fala.
Por causa do longo período de seca, Oliveira conta que muitos vizinhos foram trabalhar em outros estados, para terem como sustentar a família que ficou na propriedade. E, a previsão do tempo, para 2016, continua adversa para a agricultura. “A perspectiva é de outro ano de tempo muito seco. Choveu em janeiro, o que surpreendeu a todos. Em fevereiro, caiu uma chuvinha. Até agora, em março, não caiu uma gota. Já começamos a perder as lavouras, o que começou a germinar já está secando”, comenta.
Granizo prejudica lavouras no Sul
Mas o excesso e água também é um problema. Um temporal de granizo e ventos fortes foi suficiente para acabar com os 12 hectares de soja plantadas pelo agricultor familiar Elias Daniel de Oliveira Ferreira, 29 anos, do município gaúcho de Giruá. Ele lembra que o fenômeno, intenso e atípico, arrancou árvores do chão.
A soja leva cinco meses entre ser semeada e colhida. A lavoura de Ferreira já tinha dois meses de cuidados quando foi atingida pelo temporal. Esse tipo de cultura representa 50% da sua renda, o restante vem da produção de leite. Preocupado com as perdas, o agricultor, que também planta milho para alimentação animal, acessou o Seguro da Agricultura Familiar (Seaf) para amenizar os prejuízos.
Ferreira conta que o custo de uma lavoura de soja é elevado. “Tenho amigos que perderam tudo por causa das condições climáticas. Perderam a produção e tiveram que vender suas propriedades para pagar os empréstimos no banco”, comenta.
Futuro
Para o futuro, o meteorologista usa como referência o relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) - principal organismo internacional para a avaliação da mudança climática, que aponta que esses fenômenos atmosféricos extremos continuarão e serão cada vez mais intensos e frequentes. Com chuvas muito fortes em uma região e períodos de seca prolongados em outras.
Conforme Silva, pesquisas da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) mostram que, caso essas projeções se confirmem, a produtividade de muitas culturas no país poderá ser atingida. As regiões mais vulneráveis seriam o Norte, Nordeste e parte do Centro-Oeste, por apresentarem uma distribuição irregular, parcial e temporal da chuva, que é normal para essas áreas, mas que impactaria, principalmente, nas culturas de milho e feijão. “Estima-se que o milho poderia ter uma redução média de 16% na sua produtividade no Brasil. Já o trigo, uma cultura muito praticada no Sul, sofreria uma redução de 30% devido ao aumento das temperaturas”, observa.
Ele cita ainda outra questão, as doenças e pragas das lavouras. Assim como as mudanças climáticas poderão favorecer determinadas culturas, algumas pragas poderão ganhar força ou surgirem nesse novo cenário. “Não é apenas uma questão de mais chuvas ou elevação das temperaturas, teremos que lidar também com esse outro problema nas lavouras”, adverte.
Flávia Dias
Ascom/MDA
Ascom/MDA
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