quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Cameron rejeita relatório que propõe nova regulação na mídia britânica


Cameron rejeita relatório que propõe nova regulação na mídia britânica

O primeiro ministro rechaçou a promulgação de uma nova lei para a criação de um organismo supervisor da imprensa que ponha fim às escutas telefônicas e outros abusos cometidos pelos meios de comunicação britânicos. O informe do juiz Brian Leveson, após 16 meses de investigação, propôs reforçar o sistema de autoregulação da imprensa na Inglaterra. O artigo é de Marcelo Justo, direto de Londres.

Londres - O primeiro ministro David Cameron rechaçou a promulgação de uma nova lei para a criação de um organismo supervisor da imprensa que ponha fim às escutas telefônicas e outros abusos cometidos pelos meios de comunicação britânicos. O informe de mais de 2 mil páginas do juiz Brian Leveson, após 16 meses de investigação, propôs reforçar o sistema de autoregulação da imprensa e recomendou pela primeira vez desde o século 17 que o parlamento legislasse sobre o tema, abrindo no futuro a possibilidade de um sistema regulatório totalmente independente.

Esta recomendação do juiz Leveson foi suficiente para que Cameron tentasse uma pirueta circense em seu pronunciamento na Câmara dos Comuns que contava com quórum quase total dos deputados. Cameron assegurou que apoiava plenamente os princípios do informe, mas propôs que a imprensa apresentasse suas próprias propostas de autoregulação e promoveu um diálogo entre os partidos para chegar a uma resolução do tema. “Devemos ter muito cuidado com uma legislação que pode limitar a liberdade de expressão e de imprensa. O perigo é que isso criaria um instrumento para que os políticos, hoje ou no futuro, pudessem impor regulações e limitações à imprensa”, disse o primeiro ministro.

Cameron contou com o apoio de uma parte de seu partido, o Conservador, mas ficou isolado em relação ao resto do espectro político e da opinião pública. O próprio vice-primeiro ministro da coalizão, o liberal democrata Nick Clegg, disse que apoiava o informe Levenson sem reservas. O líder da oposição trabalhista, Ed Miliband, armou uma astuta armadilha ao aceitar o diálogo interpartidário proposto por Cameron. “Nos próximos dias tentarei convencer o primeiro ministro a apoiar plenamente as recomendações do juiz Leveson. O primeiro ministro não está totalmente convencido, assim espero poder ajudá-lo a entender que isso é o que precisa ser feito. É uma oportunidade histórica. Nos últimos 70 anos, houve sete informes sobre a imprensa. No último, há 20 anos, se declarava que era a última oportunidade da imprensa para colocar sua casa em ordem”, assinalou Miliband.

Uma pesquisa publica ontem no jornal “The Guardian”, antes da publicação do informe, mostrava que 80% dos britânicos pensava que era hora de adotar uma regulação independente da imprensa. Sem chegar tão longe, o juiz Levenson introduziu uma cunha significativa ao exigir uma lei que dê suporte ao sistema autoregulatório o qual fortaleceu com novos poderes. 

Segundo o informe, a comissão encarregada de supervisionar a imprensa deve estar “livre de qualquer tipo de influências da indústria jornalística e do governo”, podendo aplicar multas de até um milhão de libras (mais de um milhão e meio de dólares) por violações do código de conduta e deve publicar a cada três meses todas as reuniões que ocorrem entre jornalistas, diretores e proprietários dos meios de comunicação, assim como as realizadas entre os meios e a polícia.

A organização Hacked Off, formada por vítimas das escutas telefônicas, apoiou essas recomendações e qualificou de “traição” a reação do primeiro ministro. “Nos parece que as recomendações do juiz Leveson são razoáveis e equilibradas. Não se entende para que o primeiro ministro formou uma comissão investigadora se não ia aceitar suas sugestões”, disse um porta-voz da organização.

O primeiro ministro formou a comissão em julho do ano passado, após a revelação de que o “News of the World” havia interceptado o celular de uma adolescente desaparecida e o surgimento de uma onda de denúncias similares não já de celebridades, mas sim de vítimas de violações, de familiares de mortos no Afeganistão e Iraque, entre outras pessoas. 

Naquele momento pareceu uma maneira de acalmar a tempestade, mas logo se percebeu que o tiro havia saído pela culatra. O desfile de políticos, artistas, jornalistas, diretores de meios de comunicação (entre eles o magnata midiático Ruppert Murdoch) e vítimas das escutas revelou entre outras coisas a íntima relação de David Cameron com a News International, o braço britânico do império Murdoch. Sua reação ante a publicação do informe deixa claro que esses vínculos seguem sendo muito importantes para o primeiro ministro.

Tradução: Marco Aurélio Weissheimer

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