sexta-feira, 30 de novembro de 2012

O direto à liberdade dos palestinos


Segregar pessoas e tratá-las como se elas não pertencessem ao seu próprio país é errado. É errado na África do Sul. Também é errado em Israel, enfatiza Marc H. Ellis

Thamiris Magalhães
“O conflito entre judeus e palestinos em Israel/Palestina é principalmente político”, afirma o ex-professor Universitário de Estudos Judaicos Marc H. Ellis. Em entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line, o professorvisitante sênior de Estudos de Paz e Conflitos da Universidade da Paz, na Costa Rica, frisa que o conflito é sobre a terra, povo, estado e os recursos para mantê-los. “É claro que a religião está presente também. Obviamente, Jerusalém é central para as três religiões monoteístas e este patrimônio religioso compartilhado aumenta o drama político”, continua. Para ele, como em outras partes do globo, a religião tende a seguir o teor da situação política. “Na medida em que Jerusalém e Israel/Palestina são, em geral, militarizados, o judaísmo e o islamismo também o são”. E completa: “Se a situação política é desmilitarizada, o judaísmo e o islamismo também o serão. Devido às características demográficas e a outros fatores, o cristianismo tem um papel limitado na equação política Israel/Palestina”.
Marc H. Ellis recentemente se aposentou como professor universitário de Estudos Judaicos. Foi diretor do Centro de Estudos Judaicos e professor de História na Universidade de Baylor, do Texas, Estados Unidos. Foi ainda bolsista sênior do Centro para o Estudo das Religiões do Mundo e do Centro de Estudos do Oriente Médio da Universidade de Harvard. Atualmente é professor visitante sênior de Estudos de Paz e Conflitos da Universidade da Paz, na Costa Rica. Professor Ellis é autor de mais de 20 livros, incluindo o inovador Toward a Jewish Theology of Liberation (Para uma teologia judaica da Libertação. Nova Iorque: Orbis Books, 1986). Ellis mantém um blog atualizado diariamente, chamado Exile and the Prophetic, que pode ser acessado em www.mondoweiss.net.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Como você analisa o papel da religião no conflito entre israelenses e palestinos?

Marc H. Ellis –
 O conflito entre judeus e palestinos em Israel/Palestina é principalmente político. O conflito é sobre a terra, povo, estado e os recursos para mantê-los. É claro que a religião está presente também. Obviamente, Jerusalém é central para as três religiões monoteístas e este patrimônio religioso compartilhado aumenta o drama político. Como em outras partes do globo, a religião tende a seguir o teor da situação política. Na medida em que Jerusalém e Israel/Palestina são, em geral, militarizados, o judaísmo e o islamismo também o são. Se a situação política é desmilitarizada, o judaísmo e o islamismo também o serão. Devido às características demográficas e a outros fatores, o cristianismo tem um papel limitado na equação política na região.
IHU On-Line – Em sua opinião, a analogia feita entre o que acontece entre israelenses e palestinos na região com o apartheid sul-africano é significativa? Por quê?

Marc H. Ellis –
 Na história, analogias nos desviam do caminho. Eu vejo o mundo através das lentes da história judaica. Segregar pessoas e tratá-las como se elas não pertencessem ao seu próprio país é errado. É errado na África do Sul. Também é errado em Israel. Os palestinos têm o direito de serem livres em sua própria pátria.
IHU On-Line – O conflito tem uma motivação política e geopolítica na sua origem, qual seja, a organização do movimento sionista moderno. Hoje, existem aspectos teológicos usados para apoiar as ações tomadas por Israel?

Marc H. Ellis –
 Desde o início, o sionismo foi principalmente secular, mas sempre houve uma ala religiosa do sionismo. Tal como acontece com o sionismo secular, a ala religiosa foi diversificada. Isso incluía sionistas terra pátria espirituais, como Martin Buber , segundo o qual judeus e palestinos deveriam partilhar a Palestina. Hoje, a maioria dos sionistas religiosos usa o Estado [de Israel] para promover suas reivindicações messiânicas exclusivistas para os judeus. Dito isso, a religiosidade judaica é mais difícil de caracterizar do que a religiosidade cristã. A divisão na vida judaica entre o religioso e o sagrado é diferenciada, uma vez que você vai além das categorias simples de crença e não crença. Assim, eu diria que tanto religiosos como seculares, sionistas-estatais e sionistas-terra pátria, possuem aspectos histórico-religiosos. A dissidência dentro da vida judaica, especialmente em relação ao sionismo e ao Estado de Israel, traz em si esse mesmo aspecto histórico-religioso. Na maior parte do tempo, os judeus simplesmente argumentam como judeus. No entanto, a argumentação judaica é sempre colorida por um sentido de povo e de destino. Eu chamaria as bases deste encontro profundo com o judaísmo de histórico-religioso.
IHU On-Line – Qual é a relação entre sionismo religioso e sionismo político? Hoje, eles são diferentes? Em que momentos eles se misturam?

Marc H. Ellis –
 Os sionismos religioso e político são essencialmente separados. Eles também trabalham juntos para determinados objetivos. Um objetivo comum é a dominação da terra e da política no Estado expansionista de Israel. Outro objetivo comum é que a terra de Israel seja somente para os judeus. Sionistas religiosos e políticos acreditam que os judeus têm de ser privilegiado em Israel e que palestinos são uma ameaça à soberania judaica. Claro, há gradações e divisões. Na maior parte do tempo, sionistas religiosos e sionistas de estado divergem sobre questões fundamentais do destino judaico e concordam sobre os elementos práticos da ascendência judaica.
IHU On-Line – Qual é a posição das várias correntes do judaísmo contemporâneo em relação ao conflito? Em geral, a comunidade judaica internacional tem uma posição clara diante das ações israelenses no Oriente Médio?

Marc H. Ellis –
 Em geral, sim, a comunidade judaica segue o que eu chamo de uma linha de Constantino . Nas últimas décadas, se formou um judaísmo constantino que apoia Israel, sem dúvida. Quando há dúvidas, elas são silenciadas a fim de manter a solidariedade judaica. Ao lado dos judeus constantinos, estão os judeus de consciência. Judeus constantinos diferem dos judeus de consciência, pois eles veem aliança da comunidade judaica com o império como uma traição ao próprio conceito do que significa ser judeu. Existe uma guerra civil na comunidade judaica entre estes dois grupos. Desta guerra civil, não há fim à vista.
IHU On-Line – Qual é o significado de “uma Paz Justa” e qual a sua relação com o conflito israelense-palestino?

Marc H. Ellis –
 A questão das questões! O consenso internacional é de dois Estados para dois povos, Israel ao lado da Palestina. A realidade é que Israel tomou tanto de Jerusalém e da Cisjordânia que poucos acreditam que uma solução de dois Estados seja possível ainda. Alguns defendem uma solução de um Estado onde judeus e palestinos vivam lado a lado em um Estado com igual cidadania, independentemente da origem étnica ou religiosa. Nenhum dos cenários é provável em um futuro próximo. Hoje, temos um Estado, Israel, que domina as terras de Tel Aviv até o Rio Jordão. Há milhões de palestinos sob o controle de Israel, pois eles vivem sem os fundamentos da cidadania e da igualdade.
IHU On-Line – Em sua opinião, um diálogo direto entre a Autoridade Nacional Palestina – ANP e o Estado de Israel é o caminho mais curto para alcançar a paz na região? Ou pode a ONU, como uma instituição representativa e intervencionista, ser a forma mais eficaz? Por quê? 

Marc H. Ellis –
 Nenhuma [das duas soluções] vai funcionar. É uma questão de poder, que Israel tem e palestinos não. Não há qualquer poder capaz ou disposto a pressionar Israel a retroceder às fronteiras de 1967. A ONU é impotente.
IHU On-Line – Como você explicaria teologicamente o conflito no Oriente Médio? Em sua opinião, é possível fazer uma interpretação dos textos sagrados, à luz do que está acontecendo na região? 

Marc H. Ellis –
 Duvido que textos sagrados façam muito bem no Oriente Médio ou em qualquer outro lugar. Viver o profético é o que podemos fazer. Embora o profético esteja fadado ao fracasso, falhas proféticas abrem a possibilidade de mudança no futuro. Cada plano de paz conhecido pela humanidade foi tentado no conflito Israel/Palestina. O que precisamos agora é a verdade. Deixem as profecias acontecerem indiferentemente das consequências e do que venha a acontecer.
Tradução: Silvia Ferabolli

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