domingo, 10 de fevereiro de 2013

Cansei de ser honesto



Nota de Rodapé
Começou em 2005 como uma página pessoal do jornalista Thiago Domenici, 30 anos, que trabalhou na Revista Caros Amigos, Revista do Brasil; atualmente na Retrato do Brasil. A partir de 2008, no entanto, a proposta se tornou colaborativa.
Adital
Cansei de ser honesto. Daqui por diante roubarei, passarei a perna nos outros, seguirei à risca nossa famosa lei de Gérson, "levar vantagem em tudo”. Para me livrar de toda e qualquer acusação, direi apenas: sou jornalista.
Claro, isto é uma grande bobagem – a primeira parte, apenas. Infelizmente. Foi o que pensei ao assistir a retirada dos nomes de Policarpo Júnior, redator-chefe e diretor de Veja em Brasília, e de mais quatro jornalistas da CPI do Cachoeira, no final do ano passado. Policarpo relaciona-se com Cachoeira, segundo o relatório, desde 2004, atuando em favor do grupo do contraventor. Servir também "aos desideratos valorativos e às visões de mundo que movimentavam uma determinada linha editorial”, como explica reportagem de Carta Capital. A CPI pedia o indiciamento de PJr por formação de quadrilha.
Em suma, no mínimo uma séria investigação deveria ser feita, e foi, por parte da comissão. Entretanto seu resultado será nulo.
Em seu site, no texto que relata a retirada dos nomes, Veja trata o relatório como "ataques à imprensa”, "tentativa de atingir sua credibilidade”. No entanto, as dezenas de capas publicadas com denúncias infundadas, falta de provas e textos tendenciosos são plenamente aceitos em sua redação. Suposições transformam-se em fatos, e ninguém se importa com provas. As gravações com conversas entre Policarpo e Cachoeira, bastante contundentes, parecem entretanto não convencer seus editores.
O jornalista Luis Nassif, autor de ampla análise sobre o semanário, resume o "método Veja de fazer jornalismo”: Veja se especializaria em "construir” matérias que assumiam vida quase independente dos fatos que deveriam respaldá-las. Definia-se previamente como "seria” a matéria. Cabia aos repórteres apenas buscar declarações que ajudassem a colocar aquele monte de suposições em pé.
A liberdade de imprensa é, sim, direito assegurado a todo jornalista. Da mesma forma, está escrito no Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, muito próximo ao direito à informação: "a divulgação da informação precisa e correta é dever dos meios de comunicação e deve ser cumprida independentemente da linha política de seus proprietários e/ou diretores ou da natureza econômica de suas empresas”. Porém, estranhamente esta parte nunca é citada pela grande mídia que adora reclamar qualquer questionamento como "censura”.
Tal liberdade também precisa ser analisada com critério, levando-se em conta quem comanda a telecomunicação no Brasil. Basicamente, podemos dizer que seis grupos pautam o noticiário em nosso país – aí incluídos jornais, TVs e rádios: Globo, Abril, Folha, Estado, Bandeirantes e Record. Apenas a Abril, dona da Veja, detém 74 veículos, conforme o site Donos da Mídia. Toda a proposta de regulamentação é tratada como tentativa de censura, ainda que emissoras sejam concessões públicas. Enquanto isto, no Reino Unido, o juiz Brian Leveson recomenda a existência de uma lei de imprensa, após os escândalos com o magnata das comunicações Rupert Murdoch.
A grande mídia age defendendo claros interesses políticos e econômicos – todavia travestidos na carapuça da "imparcialidade e objetividade”.
Quando um prédio desaba, o engenheiro responsável é procurado. Se esquecer um bisturi na barriga de alguém, o médico sofrerá consequências. Então por que jornalistas não devem ter responsabilidades, ou pior, não podem ser investigados quando agem com má-fé? A imprensa não está acima do bem e do mal, embora goste de pensar assim, e deve obedecer às mesmas leis que qualquer cidadão. Ao escrever, o jornalista tem o dever de informar sem distorcer informações, como diz o juramento que fazemos todos os egressos desta academia. Torçamos para que assim seja.
Pedro Mox, jornalista e fotógrafo, especial para o NR

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