Apelidado de Açougueiro de Treblinka, nazista que trabalhou em S. Bernardo chefiou programa de eutanásia
Renan Fonseca
Renan Fonseca
Stangl (ao centro) com companheiros nazistas
Chefe da ala de produção 4 da Volkswagen nos anos 1960, Franz era do tipo que só conversava o essencial e não aceitava bem os erros dos subordinados. De meia idade e corpulento, tinha aparência jovial e fortes traços europeus. Para os funcionários da montadora, apenas mais um dos alemães que trabalhavam ali na época.
Chefe da ala de produção 4 da Volkswagen nos anos 1960, Franz era do tipo que só conversava o essencial e não aceitava bem os erros dos subordinados. De meia idade e corpulento, tinha aparência jovial e fortes traços europeus. Para os funcionários da montadora, apenas mais um dos alemães que trabalhavam ali na época.
O que não era notado por muitos não passou despercebido para João de Deus, que não era chefe, mas atuava na ala 3 de produção. João não tinha o domínio da engenharia ou da língua alemã, mas através dos livros aprendeu mais que o necessário. Agarrado a publicações jornalísticas, o metalúrgico tinha uma certeza interior de que aquele "alemão" escondia algo.
O homem que usava cabelos arrepiados com gel era na verdade o austríaco Franz Paul Stangl, comandante dos campos de extermínio de Treblinka e Sobibór, na Polônia. Pelo comando do nazista, mais de 900 mil judeus foram brutalmente mortos por fuzilamento ou em câmaras de gás e cremados para ocultar o assassinato em massa.
Franz também foi superintendente da Aktion T4, Programa de Eutanásia mantido pelo nazismo. Mudou-se para o Brasil em 1951, após percorrer alguns países fugindo com a família no pós-Segunda Guerra. Foi preso pela Polícia Federal na fábrica da Volkswagen, em São Bernardo, em 1967.
Para a Aktion T4 eram mandadas pessoas com deficiências físicas e problemas mentais. A deficiência era o passaporte para uma morte fria. Do programa de eutanásia, Franz tirou a retórica para julgar todas as pessoas ao redor. "Quando ele percebia que alguém cometia algum erro, logo falava com sotaque carregado: ‘A eutanásia esqueceu de você'", lembra o aposentado Edir Sotero dos Santos, 68 anos, que na época trabalhava no setor de têmpera da Volks. A fama de Franz lhe rendeu o apelido de Açougueiro de Treblinka pelos jornais daquela década.
Prisão - João de Deus intuía sobre a história do alemão de cabelos diferentes. Disse que até chegou a comentar com um colega sobre a desconfiança a respeito de Franz. "Falei com um amigo apelidado de Bola que aquele alemão era nazista. A maioria do pessoal não sabia o que era isso. Era uma confusão na cabeça das pessoas, que ainda não tinham muito conhecimento sobre o que havia ocorrido na Alemanha", lembrou João.
"Na época era costume usar cabelo liso escorrido, por isso o Franz destoava das outras pessoas", descreveu o ex-metalúrgico. Ao contrário de outros nazistas que passaram pelo Brasil, Franz Stangl não alterou o nome, e nem mesmo adotou um apelido como disfarce. Assim como Josef Mengele, que morou nas proximidades de Diadema e era conhecido como seu Pedro Mengue, o comandante austríaco aprendeu rápido o idioma português. "Ele costumava falar muito o português. Acho que era para mostrar que estava há muito tempo morando no Brasil", disse João de Deus.
"Ele disse uma vez que gostava de trabalhar com brasileiros, mas que alguns tinham problemas, e quando falava isso apontava para a cabeça", relembra Edir Santos. Franz nasceu em maio de 1908, em Altmünster, Áustria. Depois de preso pela Policia Federal em 1967, foi extraditado para a prisão de Düsseldorf, na Alemanha, para cumprir prisão perpétua. Morreu em 28 de junho de 1971.
Josef Mengele, Herbert Cukurs e Franz Stangl foram nazistas que participaram ativamente do extermínio de judeus durante o governo de Adolf Hitler (1933-1945) e tiveram passagem pelo ABCD após a Segunda Guerra Mundial. O Mossad (Instituto Hebraico para Inteligência e Operações Especiais) caçou esses e outros nazistas foragidos no Brasil e em outros países.
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