Liberdade já tem bolivianos, e até mesmo todo um circuito religioso
Ana Carla Bermúdez
Ana Carla Bermúdez
Ide relata que a escolha pelo bairro da Liberdade como tema de sua pesquisa coincidiu com as comemorações do centenário da imigração japonesa no Brasil, em 2008. “Até então eu nunca tinha procurado muito sobre as minhas referências japonesas, e nessa época comecei a ler algumas coisas sobre a história dos imigrantes aqui no Brasil”, afirma o pesquisador, que acrescenta: “Eu via muitas histórias da Rua Conde de Sarzedas, que na minha cabeça não era uma referência da Liberdade dos japoneses. Então, resolvi passear por lá para ver o que tinha hoje, se havia alguma relação.”
Foco visual
Ide reuniu um total de sete moradores voluntários: uma brasileira, três japoneses e três chineses. A filmagem foi escolhida por ser uma boa maneira de representar o foco visual que o pesquisador buscava, e acabou sendo, também, “legal conciliar meu gosto pelo cinema com a pesquisa”, explicou. Para um melhor estudo da relação do ser humano com seu entorno, foram os próprios participantes que, quando se sentiram confortáveis com a câmera, filmaram o bairro. Eventualmente, Ide realizou algumas filmagens. Analisando os vídeos, o pesquisador constatou algumas semelhanças entre eles, como o teor das conversas, que não era de demasiada profundidade. Falava-se dos estabelecimentos locais, como restaurantes e mercearias, e o que se comentava deles era apenas se eram conhecidos ou não, baratos ou caros, com comida boa ou ruim.
O pesquisador relata que, até então, sua preocupação maior era em ver o bairro da Liberdade. “A Liberdade, para mim, sempre teve ligações com a comunidade japonesa”, afirma. No entanto, conforme a realização da pesquisa, Ide diz ter mudado seu conceito sobre o local: “Comecei a ver que não é só essa imagem japonesa do bairro, agora a Liberdade tem até os bolivianos, e até mesmo todo um circuito religioso… não só igrejas como também centros de umbanda e candomblé”.
Além disso, analisando os vídeos, ele percebeu que os participantes davam muito mais importância ao sabor dos pratos dos restaurantes do que ao apelo visual do bairro. “O contato com eles realmente foi surpreendente, porque eu estava só pensando na questão da visualidade do bairro, a paisagem, a decoração oriental, e esse contato com os moradores me fez perceber que a Liberdade não se resume a isso”, afirma. O pesquisador acrescenta, ainda, que “esse contato com os moradores foi bastante rico para eu poder sair mesmo da compreensão mais habitual do bairro”.
Assim, ele aponta uma pequena diferença entre o turista e o morador do local: enquanto o primeiro o trata com a distância da visão, o segundo o aprecia com a intimidade do paladar. No entanto, isso não pode ser visto como uma segmentação ou uma dicotomia, pois o turista eventualmente tem relações com a comida que se encontra no bairro. Além disso, Ide conclui que da mesma maneira que a imigração japonesa modificou a Liberdade ― que antes abrigava italianos, o fluxo boliviano atual no bairro possivelmente chegue a alterá-lo no futuro. Portanto, é necessário compreender a paisagem ainda em processo de formação, ou seja: é preciso considerá-la viva.
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